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Sem chance para a paz: adeus a um 2024 cheio de guerras e morte

Em 2024, o mundo atingiu um número recorde anual de conflitos armados desde a Segunda Guerra Mundial, com impacto devastador sobre as crianças

Álvaro Verzi Rangel
Tropas quenianas da Missão da União Africana na Somália (AMISOM) na cidade de Kismayo, em 2012. (Foto: AMISOM Public Information / Flickr)

2024 foi um ano difícil, marcado por guerras na Ucrânia e no Oriente Médio, pelo genocídio dos palestinos, mas também por conflitos no Sahel ou no Sudão, entre outras guerras que ficam nas sombras da imprensa internacional. O mundo está em chamas por todos os lados em um ano de conflitos que abalaram a vida de milhões de pessoas em todo o planeta.

2024 se despede deixando para trás um cenário turbulento e histórias cheias de sofrimento, bem como novas estratégias geopolíticas e, possivelmente, uma nova ordem mundial que desmantelará a ordem mundial pós-Segunda Guerra Mundial. Mas 2025 não parece promissor, com a chegada de Donald Trump à Casa Branca e a escalada dos conflitos. Muitas dessas guerras e conflitos, apesar da morte e da destruição que provocam, não recebem a atenção devida mundialmente.

A guerra em Gaza se estendeu para o Líbano, a Síria e o Iêmen, criando um medo constante de uma conflagração regional que continuará mantendo milhões de pessoas em estado de alerta por mais um ano, graças às contribuições bélicas e financeiras da OTAN e dos Estados Unidos. Ao entrarmos em um novo ano, todos os olhos estão voltados para o apoio direto dos EUA à Ucrânia, com Donald Trump assumindo o cargo em três semanas, o que os analistas dos EUA acreditam que será um ponto de virada na guerra.

Em 2024, o mundo atingiu um número recorde anual de conflitos armados desde a Segunda Guerra Mundial. É o que revela o Índice Global de Paz (GPI) do Instituto Internacional de Economia e Paz (IEP), um think tank global com sede em Sydney (Austrália), que revela que o mundo se encontra em uma encruzilhada.

O índice, publicado em junho deste ano, observou que atualmente existem 56 conflitos, o maior número desde a Segunda Guerra Mundial, e enfatizou que tais conflitos têm se internacionalizado, com 92 países envolvidos em guerras fora de suas fronteiras. O relatório também alertou que, sem esforços conjuntos, há o risco de conflitos ainda mais graves.

As guerras têm se refletido em milhares de mortes, bombardeios, recrutamentos em massa, milhões de deslocados de suas terras, destruição de casas e infraestrutura nos países em conflito.

Outro relatório, este da Armed Conflict Location and Eccent Data (ACLED), estima que mais de 233 mil pessoas morreram em 2024 em conflitos armados, uma estimativa considerada “conservadora”. Ele observa que, nos últimos cinco anos, os níveis de conflito quase dobraram. “Em 2020, registramos 104.371 eventos de conflito; este ano, esses números se devem em grande parte ao início ou retomada de três grandes conflitos, como Ucrânia, Gaza e Mianmar, mas também porque a violência continua em muitos outros países com altas taxas de conflito, como Sudão, México, Iêmen ou os países do Sahel.”

O ACLED adverte que “a exposição de civis à violência, a incidência de conflitos e o número de grupos armados envolvidos em violência estão se proliferando”.

As crianças da guerra

O impacto dos conflitos armados sobre as crianças em todo o mundo alcançou níveis devastadores – e provavelmente sem precedentes – em 2024, de acordo com uma análise do UNICEF dos últimos dados disponíveis e das tendências globais predominantes. Mais de 473 milhões de crianças – uma em cada seis no mundo todo – vivem atualmente em áreas afetadas por conflitos ou são deslocadas à força pela guerra e pela violência.

A porcentagem de crianças que vivem nessas regiões dobrou de cerca de 10% na década de 1990 para quase 19% atualmente, devido à intensificação dos conflitos, principalmente na Palestina, Haiti, Líbano, Mianmar e Sudão.

Os direitos das crianças são sistematicamente violados nessas situações, e um número recorde de crianças afetadas por conflitos foram mortas ou feridas, forçadas a abandonar a escola, não receberam vacinas essenciais ou sofrem de níveis graves de desnutrição.

E a expectativa é que os números continuem aumentando. Os conflitos geram aproximadamente 80% de todas as necessidades humanitárias em todo o mundo, causando a interrupção de serviços essenciais, como água potável, alimentos e atendimento médico.

As crianças representam 30% da população mundial, mas, em média, são cerca de 40% dos refugiados e 49% das pessoas deslocadas internamente. Nos países afetados por conflitos, uma média de mais de um terço da população é pobre (34,8%), em comparação com uma taxa de pouco mais de 10% em países sem conflitos.

Conflitos armados, como os do Sudão, Iêmen, Líbia ou Mianmar, foram colocados em segundo plano, mas estão longe de serem resolvidos e afetam milhões de pessoas. Algumas das guerras e conflitos que estão ocorrendo no mundo são:

O conflito palestino-israelense, o conflito entre a Rússia e a Ucrânia, o conflito em Mali e na região do Lago Chade (Boko Haram), no Sahel Ocidental, na República Democrática do Congo, na Somália, no Sudão do Sul, em Mianmar, no Paquistão, no Iraque, na Síria, são conflitos que perduram.

Desde 1960, John Lennon e Yoko Ono vinham insistido na necessidade de dar uma chance à paz. Hoje, apenas os idosos nostálgicos se lembram deles, enquanto por 64 anos as guerras se multiplicam em todo o mundo. A paz ainda não tem sua chance, embora os causadores das guerras recebam prêmios de Nobel da Paz.

(*) Tradução de Raul Chiliani

CLAE O Centro Latinoamericano de Análisis Estratégico é um portal de notícias promovido pela Fundación para Integración Latinoamericana (FILA)

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