Pesquisar

Frei Betto: quem será o novo papa?

Apesar de pressão dos EUA, é previsível que o papado volte às mãos dos italianos, inconformados por terem perdido a preferência desde a eleição de João Paulo II

Frei Betto
Cardeais deixam a Missa Pro Engleindo, logo antes de iniciarem a votação para eleger o novo papa, em março de 2013. (Foto: Jeffrey Bruno / Flickr)
Cardeais deixam a Missa Pro Engleindo, logo antes de iniciarem a votação para eleger o novo papa, em março de 2013. (Foto: Jeffrey Bruno / Flickr)

Não participo de apostas e conheço bem os bastidores da Igreja Católica. Este é o sexto conclave que acompanho. Quase nunca as previsões predominantes sobre as eleições de papas são confirmadas. Exceto a eleição de Bento XVI, em 2005, pois o cardeal Ratzinger era o teólogo preferido de João Paulo II e ocupava altas funções no Vaticano. Bergoglio, cardeal de Buenos Aires, foi o segundo mais votado em 2005, me confidenciou um cardeal. Embora sua eleição a papa, em 2013, após a renúncia de Bento XVI, tenha surpreendido o mundo, era prevista pelo colégio cardinalício. 

O que conheço dos bastidores de conclaves me foi contado por um cardeal que participou de dois. Como ocorre desde a eleição de Paulo VI, em 1963, os cardeais dos EUA tentarão, mais uma vez, emplacar um de seus pares. Em vão. Por serem os mais ricos e arrogantes, há muita rejeição a eles entre os eleitores.

Nas bolsas de apostas muitos investem na eleição de um africano, já que a África é, hoje, o continente onde o catolicismo mais se expande. O último pontífice africano data do século V, papa Gelásio (492-496). Ora, se a preferência dos eleitores for por alguém que dê continuidade à linha pastoral de Francisco será difícil encontrar um africano, embora ele tenha nomeado 15 entre os 18 cardeais daquele continente. Com exceção do cardeal Peter Turkson, de Gana, os demais são moderados ou conservadores. Nem sempre Francisco promoveu arcebispos progressistas, já que levava em conta o consenso entre os bispos do país. 

Minha previsão é de que o papado voltará às mãos dos italianos, inconformados por terem perdido a preferência desde a eleição de Wojtyla. Entre os seis cardeais italianos nomeados por Francisco, cinco abraçam a mesma linha pastoral: Zuppi (Bolonha); Betori (Florença); Montenegro (Sicília); Lojudice (Montalcino); e Gambetti (vigário geral do Vaticano). 

Encaro também como azarões os cardeais Tagle, das Filipinas, 67 anos, e o inglês Timothy Radcliffe, 79 anos, meu confrade na Ordem Dominicana. Era o teólogo preferido de Francisco e assessor de vários sínodos. A alegação de ter idade avançada já não procede como outrora, porque atualmente um pontificado de 12 anos, como o de Francisco, é considerado longo, e as comunicações e meios de locomoção são bem mais rápidos. 

 Leia também – Frei Betto: sobre conclaves 

Os cardeais brasileiros teriam alguma chance? Acredito que não. São também prelados “do fim do mundo” como Bergoglio, mas nenhum dos oito se destaca como “papabile”. Aliás, quase tivemos um papa brasileiro. No conclave que elegeu Wojtyla, em 1978, o primeiro a obter 2/3 dos votos foi o cardeal de Fortaleza, Aloísio Lorscheider. Ao ser consultado se aceitava o pontificado, declinou alegando ter oito pontes de safena e a Igreja, que havia perdido João Paulo I, ocupante da Sé de Pedro por apenas 33 dias, não suportaria outro conclave em pouco tempo. Detalhe: o eleito, João Paulo II, faleceu em 2005; Lorscheider, em 2007. 

(*) Frei Betto é escritor e educador popular e autor de “Jesus rebelde – Mateus, o Evangelho da ruptura”, “Jesus Militante – Evangelho e projeto político do Reino de Deus”, “Jesus revolucionário: contradição de classes no Evangelho de Lucas”, “Espiritualidade, amor e êxtase”, “Parábolas de Jesus – Ética e valores universais” (Vozes), entre outros livros disponíveis em freibetto.org.

Revista Opera A Revista Opera é um veículo popular, contra-hegemônico e independente fundado em abril de 2012.

Continue lendo

Cerimônia de celebração dos 80 anos do Dia da Vitória na Segunda Guerra Mundial sobre o fascismo. Praça Vermelha, Rússia - Moscou. (Foto: Ricardo Stuckert / PR)
80 anos depois: lembrando a derrota do fascismo ou testemunhando seu retorno?
Robert Francis Prevost, o papa Leão XIV, se dirige aos fiéis no Vaticano durante sua posse. (Foto: Mazur / cbcew.org.uk / Catholic Church England and Wales / Flickr)
Frei Betto: o legado de Francisco e os desafios do papa Leão XIV
A cantora e agricultora americana Kelis é a mais recente celebridade a se aventurar na África Oriental, supostamente sob o pretexto da sustentabilidade. (Foto: Kelis / Instagram / Reprodução)
O pan-africanismo sob o domínio das elites

Leia também

São Paulo (SP), 11/09/2024 - 27ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo no Anhembi. (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)
Ser pobre e leitor no Brasil: um manual prático para o livro barato
Brasília (DF), 12/02/2025 - O ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, durante cerimônia que celebra um ano do programa Nova Indústria Brasil e do lançamento da Missão 6: Tecnologias de Interesse para a Soberania e Defesa Nacionais, no Palácio do Planalto. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
O bestiário de José Múcio
O CEO da SpaceX, Elon Musk, durante reunião sobre exploração especial com oficiais da Força Aérea do Canadá, em 2019. (Foto: Defense Visual Information Distribution Service)
Fascista, futurista ou vigarista? As origens de Elon Musk
Três crianças empregadas como coolies em regime de escravidão moderna em Hong Kong, no final dos anos 1880. (Foto: Lai Afong / Wikimedia Commons)
Ratzel e o embrião da geopolítica: a “verdadeira China” e o futuro do mundo
Robert F. Williams recebe uma cópia do Livro Vermelho autografada por Mao Zedong, em 1 de outubro de 1966. (Foto: Meng Zhaorui / People's Literature Publishing House)
Ao centenário de Robert F. Williams, o negro armado
trump
O Brasil no labirinto de Trump
O presidente dos EUA, Donald Trump, com o ex-Conselheiro de Segurança Nacional e Secretário de Estado Henry Kissinger, em maio de 2017. (Foto: White House / Shealah Craighead)
Donald Trump e a inversão da estratégia de Kissinger
pera-5
O fantástico mundo de Jessé Souza: notas sobre uma caricatura do marxismo
Uma mulher rema no lago Erhai, na cidade de Dali, província de Yunnan, China, em novembro de 2004. (Foto: Greg / Flickr)
O lago Erhai: uma história da transformação ecológica da China
palestina_al_aqsa
Guerra e religião: a influência das profecias judaicas e islâmicas no conflito Israel-Palestina