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O esporte como arma política: o caso da Venezuela

Rússia, Bielorrússia e Venezuela são alguns dos países boicotados em eventos esportivos internacionais enquanto Israel ruma incólume às Olimpíadas de Paris
Misión Verdad
Jogos Olímpicos em 2024 serão realizados em Paris, em julho. Apesar de pressão para que Israel sofra sanções no evento por sua guerra contra Gaza, até o momento participação do país está assegurada. (Foto: nicolas michaud / Flickr)

É um mito que o esporte seja um espaço neutro onde os conflitos geopolíticos não têm lugar e as potências imperiais não impõem sua lógica de dominação e subjugação. A prova disso é o assédio constante a que são submetidos os atletas venezuelanos toda vez que precisam representar o seu país em competições internacionais.

Atrasos na entrega de vistos (e inclusive a negação deles) e a imposição de condicionantes são alguns dos obstáculos colocados aos atletas venezuelanos, que, sem dúvida, tem tido um impacto em seu desempenho, pois a incerteza gerada pela burocracia esportiva incide psicológica e fisicamente em seu desenvolvimento.

Recentemente, o governo venezuelano denunciou que o Departamento de Estado dos Estados Unidos, aproveitando-se do fato de seu país ser o presidente pro tempore da XXIV Assembleia Geral do Conselho Americano de Esportes (CADE), e do fato de Washington ser o anfitrião da reunião, negou de forma injustificada o credenciamento e o acesso ao representante designado pela República Bolivariana para esse evento.

Em um comunicado emitido pelo Ministério das Relações Exteriores em 25 de abril, foi declarado que essa ação “representa uma violação flagrante dos regulamentos internos e dos princípios fundamentais do espírito olímpico”. 

O assédio contra o país também ocorreu por outra via e, uma semana depois, outro comunicado foi emitido. Desta vez, seria em rejeição ao método implementado pelo Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) na escolha da Equipe Olímpica de Refugiados, “no qual incluiu indevidamente um cidadão venezuelano na modalidade de Tiro Esportivo que não atende aos critérios internacionais para ser classificado como refugiado”.

A Venezuela critica a falta de transparência na seleção dessa pessoa, que não tem as qualidades necessárias para praticar um esporte de alto desempenho. Basicamente, o objetivo é politizar a “participação” no evento esportivo para projetar a ideia de que existem pessoas no país que foram deslocadas por motivos de perseguição e guerra.

Além disso, a crítica é feita com o objetivo de evitar que isso tenha um impacto negativo no moral das equipes nacionais que ainda estão em processo de qualificação para os Jogos Olímpicos de Paris 2024 e no esporte em escala global.

A participação de cidadãos nacionais na equipe de refugiados da ACNUR fixaria a imagem de um Estado falido que vem se construindo nos últimos anos. Portanto, não é descabido imaginar cenários em que o Comitê Olímpico Internacional (COI) poderia deixar a Venezuela de fora das competições internacionais, como fez com a Rússia e a Bielorrússia em 2022, após o início da Operação Militar Especial na Ucrânia.

Paradoxalmente, o presidente do COI, Thomas Bach, argumentou que a Federação Russa foi excluída como uma “medida de proteção para salvaguardar a integridade das competições internacionais” à luz dos “profundos sentimentos anti-russos e anti-bielorrussos em muitos países após a invasão”.

No entanto, está claro que o esporte internacional continua sendo um assunto predominantemente ocidental, como argumenta Leo Goretti, por isso é fácil excluir um país que não esteja alinhado com seus interesses. A Rússia teve seus méritos esportivos apagados com o toque de uma caneta, foi proibida de exibir seus símbolos nacionais em competições, entre outras decisões semelhantes. 

Os dois pesos e duas medidas do COI ficam evidentes quando Israel não foi excluído de nenhuma competição até o momento, depois de perpretar o genocídio contra o povo palestino na Faixa de Gaza. Parece que, para a FIFA e o COI, o esporte e a política só estão separados quando se trata de um aliado. A demanda para censurar Israel das competições internacionais cresce a cada dia, mas parece que nada acontecerá.

O uso do esporte como arma política não é novo, assim como a perseguição sistemática aos atletas venezuelanos. Nos últimos anos, a participação da Venezuela em competições internacionais tem sido boicotada.

Em 2022, o governo venezuelano denunciou o Canadá por não emitir os vistos que, por direito, correspondiam à equipe masculina de basquete venezuelana. Nesse mesmo ano, em setembro, o Chile negou vistos à equipe masculina de vôlei para sua participação na jornada classificatória para os Jogos Pan-Americanos. A lista dessas ações que buscam condicionar e abater o ânimo de nossos atletas é longa e inclui equipes de diferentes categorias e idades.

(*) Tradução de Raul Chiliani

Misión Verdad O Misión Verdad é um grupo de investigação e análise venezuelano.

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