No dia 3 de setembro, a presidente de Honduras, Xiomara Castro, denunciou uma tentativa de golpe de Estado contra seu governo. A tentativa golpista, supostamente envolvendo comandantes militares de alto escalão e pessoal do Comando Sul do Exército dos EUA, teria sido planejada após o anúncio do governo hondurenho sobre o cancelamento do tratado de extradição com o governo dos EUA.
De acordo com o governo hondurenho, a razão para encerrar o acordo de extradição foi cortar pela raiz a tentativa de usar essa ferramenta judicial contra militares leais. “Ratifico que a paz e a segurança interna da República estão em risco […] devido a um novo golpe de Estado que o povo deve impedir”, disse a presidente em seu discurso de 3 de setembro.
A tentativa de golpe coincide com o recrudescimento, nas frentes midiática e judicial,contra Xiomara Castro e seu entorno. A própria Castro explicou o modus operandi do levante, que segue o padrão repetido nos últimos anos contra governos progressistas na América Latina:
1 – Acusações de corrupção por órgãos judiciais, tanto internos quanto externos.
2 – Ampliação e bombardeio midiático sobre o assunto.
3 – Culminação do golpe com a desqualificação judicial de candidaturas progressistas (Lula da Silva, Rafael Correa, Cristina Fernández de Kirchner) ou com a intervenção do poder legislativo (Paraguai, 2012; Brasil, 2016).
Por ora, Xiomara Castro impediu o golpe em sua fase mais incipiente e convocou seus seguidores para um comício em massa em Tegucigalpa em 14 de setembro, no qual enfatizou que as eleições são o único caminho democrático para o poder. Nesse sentido, ela pediu mais apoio para as próximas eleições, programadas para novembro de 2025.
Desde que chegou ao poder em 2022, Xiomara Castro tem enfrentado a oposição não somente de partidos políticos de direita, mas também das estruturas empresariais oligárquicas. A tentativa de golpe também evidenciou a existência de setores desestabilizadores dentro do aparato militar e policial, bem como de atores externos. “Temos visto toda uma série de ações de pressão dos Estados Unidos que têm se intensificado contra as decisões da presidente Xiomara Castro”, disse o vice-ministro das Relações Exteriores, Gerardo Torres.
Nesse sentido, vale a pena destacar o apoio dos setores mais reacionários da política norte-americana à direita hondurenha. Um grupo de congressistas norte-americanos pediu ao governo de Joe Biden que interviesse para proteger os interesses dos EUA diante das supostas “expropriações”, levantando o espectro do “comunismo expropriador”, um dos mantras do conservadorismo hondurenho.
Outro foco de pressão é o Congresso, onde a direita vem bloqueando medidas governamentais e a renovação de instituições importantes, como a Procuradoria Geral da República. O transfuguismo de um grupo de deputados castristas rompeu o equilíbrio na Câmara e permitiu o surgimento do que é conhecido como Bloque de Oposición Ciudadana (Bloco de Oposição Cidadã). Entretanto, os avanços sociais postos em marcha pelo Executivo conseguiram expor as táticas obstrucionistas do conglomerado de direita, que inclui o histórico Partido Nacional, o Partido Salvador de Honduras e o oportunista Partido Liberal.
Até agora, em sua administração, Castro reduziu a dívida externa, promoveu programas de apoio ao setor agrário e isentou 850 mil famílias de baixa renda do pagamento de tarifas das eletricidade. Da mesma forma, este ano o governo anunciou a construção do Trem Interoceânico, um projeto estratégico para o desenvolvimento e a logística do país. Também houve avanços significativos contra a impunidade e eventos simbólicos nessa área, como a condenação do ex-presidente Juan Orlando Hernández a 45 anos de prisão nos Estados Unidos por tráfico de drogas.
Honduras tem sido um ponto nevrálgico de tensões políticas, especialmente após a derrubada de Manuel Zelaya em 2009. Esse primeiro golpe deu início a uma série de processos de desestabilização na América Latina e marcou um ponto de virada na política hondurenha. A remoção de Zelaya, cônjuge de Castro e um presidente que promoveu políticas progressistas e redistributivas, deu lugar a um governo de facto que estabeleceu um clima de repressão e violência, marcado pela criminalização da oposição política e pela violação sistemática dos direitos humanos.