Foi anunciada hoje a morte de Luis Posada Carriles, terrorista confesso que trabalhou para a Agência Central de Inteligência (CIA) dos Estados Unidos contra a Revolução Cubana. Posada morreu livre em Miami, Flórida, aos 90 anos de idade. O cubano vivia em uma casa para veteranos de guerra dos Estados Unidos.
O Departamento de Justiça dos Estados Unidos fez uma declaração oficial em 2007 chamando-o de “mentor assumido de complôs e ataques terroristas”. O diretor do National Security Archive também descreveu Posada como “um dos terroristas mais perigosos da história recente”. O cubano foi condenado por crimes relacionados a terrorismo em Cuba, Venezuela e Panamá. É responsável por dezenas de atentados a bomba e tentativas contra a vida de Fidel Castro.
É um dos militantes contrarrevolucionários mais famosos e infame pelo atentado contra o voo 455 da companhia Cubana de Aviación, em 6 de Outubro de 1976, que matou todos os 73 passageiros a bordo. Dentre as vitimas estavam todos os 15 membros da equipe olímpica de esgrima de Cuba, que haviam acabado de ganhar medalhas de ouro no campeonato caribenho e centro-americano.
O cubano vivia em Caracas, Venezuela, onde dirigia uma agência privada de detetives e liderava círculos contrarrevolucionários. Investigadores de Cuba, da Venezuela e dos Estados Unidos identificar os executores que eram dois empregados venezuelanos de Posada Carriles. O cubano, envolvido em uma declaração de exilados de Miami que anunciava uma nova campanha terrorista contra o governo revolucionário, foi considerado culpado nas cortes civis venezuelanas. Posteriormente, arquivos desclassificados da CIA e do FBI mostrava que ambas agências dos Estados Unidos reconheciam Posada Carriles como o responsável pelos atentados, mantendo agentes no círculo dos terroristas e que participaram da reunião pertinente ao atentado.
Apesar da carreira documentada do terrorista cubano, a mídia brasileira (a exemplo do portal de notícias G1, vide “Morre ex-agente cubano da CIA Luis Posada Carriles”, 23/05/2018), se refere a Posada como “militante anti-castrista” e relativiza as acusações de terrorismo, atribuindo-as quase exclusivamente ao governo cubano e usando o termo “terrorista” entre aspas. Toda a linguagem é de relativização e atenuamento – outro portal usa o termo “apontado por Havana”.
Posada Carriles assumiu a direção de uma série de atentados destinados a prejudicar o turismo em Cuba no ano de 1997. Em um dos atentados, 11 pessoas ficaram feridas e foi morto um turista italiano-canadense, Fabio Di Celmo. Em entrevista gravada para a repórter Ann Louise Bardache, em 1998, Posada disse que “o italiano estava no lugar errado, na hora errada, mas eu durmo como um bebê”. Seu envolvimento também foi acusado no julgamento de Raúl Ernesto Cruz León, terrorista salvadorenho capturado em Cuba.
Nos anos 60, Posada estabeleceu seus vínculos com o governo norte-americano ao participar da operação de ataque contra a Baía dos Porcos (Playa Girón), invasão fracassada de exilados cubanos contra a revolução e que por fim consolidaram a posição de Fidel Castro.
Entre março de 1963 e março de 1964, o cubano recebeu treinamento em sabotagem e explosivos no Forte Benning, formado na famosa “Escola das Américas”. Após isso, se tornou um operativo da CIA em Miami e pivô na Operação 40. Na mesma época, foi responsável pelo treinamento do grupo terrorista de infiltrações “JURE” (Junta Revolucionaria Cubana). Entre 64 e 68, Posada Carriles foi responsável por uma série de atentados a bomba em Cuba, feitos em associação com seu companheiro Jorge Mas Canosa.
Em 1968 se mudou para a Venezuela onde foi diretor de operações do serviço de inteligência DISIP até 1974, participando da repressão de comunistas venezuelanos. Nesse mesmo período arquivos da CIA revelam um possível envolvimento do cubano com o tráfico de cocaína.
Na Venezuela formou com Orlando Bosch, outro chefe terrorista, a Coordenação das Organizações Revolucionárias Unidas (CORU), grupo dedicado a ações terroristas (segundo o próprio FBI dos EUA) e que está por trás do atentado contra o voo 455.
Para além do terrorismo contra Cuba, Posada também é acusado de ter planejado um atentado contra Henry Kissinger (por conta de sua política de detente) e um cinema dos Estados Unidos. Informava a CIA sobre os exilados cubanos e possivelmente praticava intimidação contra seus “companheiros”. Também participou de planos contra o Panamá, Colômbia e México, por posições pontuais desses país que julgou como “favoráveis a Cuba”. Dentre diversos planos de ataques contra pessoal diplomático, Posada tem envolvimento claro na tentativa de sequestro ao embaixador cubano no México e no assassinato de seu segurança. Tinha planos de atacar funcionários e políticos chilenos na época da Unidad Popular, se valendo da sua posição na polícia venezuelana para conduzir as operações (passaportes falsos, infra-estrutura, etc). Posteriormente, formou um grupo especial de “militantes” para ajudar a repressão brutal promovida pelo Departamento de Inteligência Nacional (DINA) de Augusto Pinochet.
Posada também se relaciona com o assassinato e desaparecimento de funcionários da embaixada cubana na Argentina em agosto de 1976.
Na América Central, nos anos 80, participou e dirigiu a campanha paramilitar dos “Contras” que sabotavam a revolução sandinista na Nicarágua. Esteve envolvido nas outras guerras sujas nos países da região (Guatemala, El Salvador) – foi conselheiro do governo guatemalco. . Nessa época ele havia “voltado” como operativo da CIA, sendo braço-direito de Félix Rodríguez, o agente famoso pelo seu envolvimento na captura de Ernesto ‘Che’ Guevara. Seu salário era por conta do comando militar norte-americano, 3 mil dólares por mês. Nessa época, o FBI acredita que Posada é responsável por pelo menos 41 atentados a bomba.
Foi considerado um operativo perigoso pela CIA e foi um nome problemático na investigação parlamentar que o Senado dos EUA conduziu sobre a agência em 75, os “Church Comittee Hearings”. Apesar da CIA tentar desviar a questão do tráfico de drogas para figuras como o cubano, é fato que a Operação 40, iniciada contra Cuba em 1960 por Einsenhower e dirigida pelo seu vice Nixon, só acabou em 1970 pelo envolvimento da unidade com tráfico de cocaína e heroína. Posada foi para a Venezuela repleto de dólares e armas fornecidas pela agência, com a operação ainda no ar.
Foi condenado e preso na Venezuela pelo atentado contra o avião, fugiu em 77 para o Chile porém as autoridades o extraditaram. Fugiu novamente em 85 em um plano arquitetado por Jorge Mas Canosa, bem situado na administração Reagan.
Também foi condenado no Panamá nos anos 2000 depois de um processo que começou ao ser encontrado com 90 quilogramas de explosivo. Na conspiração existiam funcionários da Cuban American National Foundation (CANF). Foi libertado com um perdão presidente graças a influência de cubanos exilados ricos, para depois ser enviado aos Estados Unidos.
Nos Estados foi processado por fraude na imigração e defendido com o apoio de uma grande mobilização na comunidade de exilados cubanos. Foi considerado inocente, para depois ser processado em 2010 por perjúrio, porém foi inocentado em 2011, o que gerou a lamentação do Departamento de Justiça que chamou-o de terrorista confesso.
É considerado herói dentre os mais radicais do exílio cubano, pois teria feito “o necessário”. A família do turista morto em 1997 passou as últimas duas décadas indo a público manifestar indignação.
Na sua carreira terrorista, Posada contou muitas vezes com o apoio de uma fundação criada no governo Reagan para desestabilizar Cuba, porém com objetivos declarados como “humanitários”. Jorge Mas Canosa foi camarada de pelotão do famoso terrorista na operação de Playa Girón, mais tarde se tornaria diretor da Cuban American National Foundation, instituição nascida da política de confrontação do Presidente Reagan e que diversas vezes socorreu Posada Carriles, além de financiá-lo. A CANF está implicada na campanha terrorista de 1997, conforme exposto em diversas fontes, incluindo investigações do New York Times e o depoimento de um ex-diretor, Posada também fez declarações que implicavam a CANF e seu amigo Jorge Mas.
O envolvimento da CANF foi exposto em uma matéria do Miami Nuevo Herald, jornal anti-castrista e em uma matéria de um jornalista cubano anticomunista, Wilfredo Cancio Isla, que desertou em 1994 graças a um programa da Fundação MacArthur na Universidade de Havana.
A CANF também deixou claro em declarações oficiais que não considerava os ataques como “terroristas” e que os apoiavam “incondicionalmente” (declaração do Presidente da CANF, Francisco Hernadez, publicado 13 de Agosto de 1997 no “El Nuevo Herald”).
Nota sobre fontes
As atividades de Posada Carriles já são amplamente documentadas, em livros, documentos e reportagens, tudo de fácil acesso na rede. Documentos desclassificados nos Estados Unidos são esclarecedores mas de toda maneira boa parte dos crimes foram confessados pelo próprio terrorista, que se apresentava como um lutador de uma causa liberal e anticomunista.
Como exemplo de referências, podemos citar o site do arquivo de segurança nacional dos Estados Unidos:
https://nsarchive2.gwu.edu/NSAEBB/NSAEBB157/index.htm
Podemos citar também diversas matérias do Miami Herald, com diversos artigos de exilados cubanos e anticomunistas que expõem tudo isto que falamos aqui, como este:
http://www.miamiherald.com/news/local/community/miami-dade/article184844308.html
No intuito de ter uma lista mais específica dos crimes e dos atentados contra hotéis, bares e pontos turísticos em Cuba, recomendo uma olhada neste sítio cubano, de função enciclopédica:
https://www.ecured.cu/Luis_Posada_Carriles