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Southcom aumenta presença militar dos EUA na América Latina, citando China e Rússia como “ameaças”

O Brasil tem função basilar na virada estratégica dos Estados Unidos para a América Latina, considerada pelo Departamento de Defesa como área estratégica.
(Foto: Juan Chiari, U.S. Army Garrison-Miami)

O governo Donald Trump aumentou o intervencionismo norte-americano na América Latina, supervisionando um golpe militar de extrema-direita na Bolívia e apoiando tentativas de golpe contra os governos de esquerda da Venezuela e Nicarágua.

No contexto das operações de mudança de regime, o Comando Sul dos Estados Unidos anunciou uma expansão maciça de sua presença militar na região.

O Brasil desempenhará uma função basilar nesse novo arranjo, abraçando seu novo papel de extensão da Pax Americana sob o governo de extrema-direita de Jair Bolsonaro. Nos últimos meses, o Brasil foi designado como um “grande aliado extra-OTAN” e assinou um acordo histórico incorporando sua indústria de Defesa doméstica a um programa de financiamento e pesquisa do Pentágono.

Em depoimento perante a Comissão de Serviços Armados da Câmara no dia 11 de março, o comandante do Comando Sul, almirante Craig S. Faller, anunciou: “Haverá um aumento na presença militar dos EUA no hemisfério ainda este ano”.

 

Essa audiência foi realizada antes do governo norte-americano tomar medidas de lockdown contra a pandemia de coronavírus. Porém, muitas atividades militares dos EUA continuaram, apesar da propagação do mortal vírus Covid-19 – assim como as sufocantes sanções de Washington impostas à Venezuela e ao Irã.

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Nova retórica da Guerra Fria demonizando a China e a Rússia

A retórica belicosa de Faller, exibida em seu testemunho oral e sua declaração por escrito ao Congresso, reflete o tom agressivo, típico da Guerra Fria, oficialmente adotado pelo Departamento de Defesa dos EUA (DoD).

Em 2018, o DoD publicou sua primeira nova estratégia de Defesa nacional em uma década. O documento histórico marcou uma mudança da chamada “Guerra ao Terror” para um novo paradigma militar baseado em combater e conter a China e a Rússia. Nas palavras do ex-secretário de Defesa, James Mattis, “a competição entre grandes poderes – não o terrorismo – será agora o principal objetivo da segurança nacional americana”.

O testemunho de Faller ao Congresso refletiu a nova estrutura. O comandante do Southcom apresentou frases como “os caras maus” ao se referir aos supostos inimigos do governo dos EUA e descreveu China, Rússia, Irã, Cuba e Venezuela como “atores estatais malignos” que fazem parte de “um círculo vicioso de ameaças. “

Ao caracterizar o Hemisfério Ocidental como “nosso hemisfério”, Faller lamentou que “a Rússia mais uma vez tenha projetado seu poder na nossa vizinhança”. Ele acrescentou: “Para mim, o momento ‘eureka’ nesse ano que passou é o alcance até onde a China tem perseguido agressivamente seus interesses bem aqui na nossa vizinhança”.

O objetivo é “manter o equilíbrio regional de poder em favor dos EUA”, declarou sem rodeios Faller, promovendo uma perspectiva de choque de civilizações na qual China e Rússia “não compartilham nossos valores”.

O testemunho do comandante do Southcom focou na China, pintando-a como a “ameaça” suprema. Faller se referiu aos empréstimos chineses a países da região como “financiamento predatório” e afirmou que “o governo chinês absorveu mais três países latino-americanos em sua Iniciativa Um Cinturão, Uma Estrada”, temendo a tentativa de Pequim de construir uma Nova Rota da Seda marítima e terrestre.

 

Como sempre, o Kremlin foi apontado como um criminoso global. “A Rússia continua desempenhando o papel ‘corruptor’, buscando semear a desunião e desacreditar os EUA em nosso próprio hemisfério”, disse Faller.

O comandante do Southcom elogiou os governos de direita do Brasil, Equador e Bolívia, onde um golpe militar instalou um regime não eleito extremista cristão. Faller ficou especialmente agradecido por esses governos “agora reconhecerem a ameaça de Cuba à liberdade, expulsando milhares de oficiais cubanos”.

Ressoando a linha de Washington, Faller atacou o governo sandinista democraticamente eleito da Nicarágua como “autoritário” e se referiu ao governo eleito da Venezuela como “o ex-regime de Maduro”.

Sem apresentar qualquer evidência concreta, ele afirmou que “atores malignos – Maduro e seus companheiros na Venezuela – representam uma das mais diretas ameaças à paz e à segurança no Hemisfério Ocidental”.

Expansão da presença militar na América Latina

Em seu testemunho no Congresso, o almirante Faller revelou que há “rodízios recorrentes de pequenas equipes de forças de operações especiais, soldados, marinheiros, aviadores, fuzileiros navais, guardas costeiras e funcionários da Guarda Nacional” na América Latina.

“Não há outra região da qual dependemos mais para nossa prosperidade e segurança”, afirmou Faller, “do que a América Latina e o Caribe”.

O comandante do Southcom prometeu “grandes exercícios para dar suporte mais direto à competição global com a República Popular da China e a Rússia”.

A Guarda Nacional dispõe de um Programa de Parceria Estatal (SPP), observou ele, que colabora com as Forças Armadas dos países da região governados pela direita.

O comandante do Southcom enfatizou que o Brasil é o mais novo membro do SPP. Ele acrescentou que os militares dos EUA estão “fortalecendo parcerias” com esses governos latino-americanos conservadores, especialmente o Brasil.

EUA assinam acordo militar histórico que coloca o Brasil em sua órbita imperial

Craig Faller deu seu testemunho no Congresso apenas três dias após ter recebido o presidente Jair Bolsonaro no Comando Sul dos EUA.

Bolsonaro viajou para a Flórida para se encontrar com Donald Trump em seu resort em Mar-a-Lago para discutir a escalada da guerra híbrida contra a Venezuela. O líder da extrema-direita brasileira visitou a sede do Southcom, onde assinou um grande acordo militar.

O Southcom anunciou em um comunicado à imprensa que “a visita histórica de Bolsonaro marca a primeira vez que um presidente brasileiro visita o Comando Sul dos EUA”.

A viagem de Bolsonaro ocorreu somente alguns dias após ele ter endossado no Brasil uma série de protestos extremistas e explicitamente antidemocráticos, pedindo a restauração da ditadura militar.

Sob o novo acordo com os EUA, o Ministério da Defesa do Brasil aderiu ao Acordo de Pesquisa, Desenvolvimento, Teste e Avaliação (RDT&E) do Pentágono. O acordo seguiu a designação de Trump de colocar o Brasil como “grande aliado extra-OTAN“, conferindo status militar especial ao país.

A Folha de S. Paulo descreveu o tratado assinado no Southcom como “um acordo militar inédito que, se explorado integralmente, poderá ajudar a abrir o maior mercado de Defesa do mundo à indústria nacional”.

As negociações de RDT&E se iniciaram em 2017 sob o governo de Michel Temer, o presidente instalado após um golpe parlamentar contra a presidente democraticamente eleita Dilma Rousseff.

O jornal conservador argentino Clarín resumiu o acordo com a seguinte manchete: “Brasil se incorpora ao complexo industrial militar dos EUA“.

O Clarín observou que o acordo mostra que “o Brasil mudou seu status internacional e deixou a estrutura regional da América do Sul”, integrando-se essencialmente ao sistema imperial dos EUA. Isso é especialmente significativo, já que o Brasil é o maior país da América Latina, com a sexta maior população da Terra e a quinta maior economia. Clarín chamou o acordo de RDT&E “um ponto de inflexão na história das relações do Brasil e da América Latina com os EUA”.

O governo Bolsonaro agora propôs um acordo de livre comércio com os EUA, acrescentou o jornal, condicionado à implementação de quatro reformas neoliberais: cortes no sistema de seguridade social, medidas protecionistas liberalizantes, a privatização de 140 empresas estatais e a abertura da economia brasileira ao capital estrangeiro.

“A partir deste momento, o Brasil se tornou o principal aliado da estratégia dos EUA na América do Sul”, afirmou o Clarín.

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