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Cúpula CELAC 2021: compromisso renovado com a integração latino-americana

Em um contexto de questionamento sobre a OEA, a CELAC se apresenta como uma das alternativas para atender os numerosos desafios da região.
Em um contexto de questionamento sobre a OEA, a CELAC se apresenta como uma das alternativas para atender os numerosos desafios da região. Por Silvina Romano e Tamara Lajtman | CELAG – Tradução de Leonardo Laurindo para a Revista Opera
IV Cúpula da CELAC. de 2016, no Equador. (Foto: Presidencia de la República Mexicana)

O México foi o ponto de encontro da América Latina e do Caribe na VI Cúpula da CELAC, com a participação de 17 líderes, dois vice-presidentes, nove chanceleres e outras autoridades de primeiro nível. Também estiveram presentes representantes da CEPAL e o presidente do Conselho Europeu.

A CELAC, organismo criado em 2010 ao calor das conquistas do progressismo na região, renovou forças a partir da presidência pro tempore do México. Em um contexto de forte questionamento sobre a Organização dos Estados Americanos (OEA) e refluxo de outros mecanismos de integração, se apresenta como uma das alternativas mais sólidas para atender os numerosos desafios da região, promovendo a convergência por cima das diferenças. A expectativa é grande quanto ao papel que este organismo poderá assumir a curto e médio prazo.

Aspectos-chave antes e durante a Cúpula

  1. O tema chave desse encontro foi a discussão em torno do papel da OEA na região.

– Andrés Manuel López Obrador já havia expressado há alguns meses a necessidade de substituir a OEA por uma instituição que represente os interesses de todos os países do continente, e que não esteja organizada em torno da hegemonia dos Estados Unidos.

– O chanceler mexicano, Marcelo Ebrard, advertiu que essa cúpula decidiria sobre uma possível reforma da OEA ou mesmo a criação de uma entidade para substituí-la.

– A próxima Assembleia Geral da OEA será realizada entre os dias 10 e 12 de novembro na Cidade da Guatemala. Deve-se lembrar que o embaixador da Bolívia na OEA, Héctor Arce, manifestou sua intenção de aproveitar a ocasião para solicitar a remoção do secretário-geral Luis Almagro, devido à vinculação da OEA ao golpe de Estado na Bolívia em 2019.

– A crítica à OEA é importante porque no próximo ano os governos latino-americanos apresentarão aos EUA e ao Canadá – os dois membros da OEA que não são membros da CELAC – uma proposta formal sobre o futuro do organismo continental.

– Durante a cúpula, a Venezuela propôs construir uma nova institucionalidade da CELAC, com o objetivo de criar uma Secretaria-Geral da CELAC. No entanto, nenhum consenso foi alcançado em relação à reforma ou substituição da OEA.

2. Foram instituídos a Agência Latino-americana e Caribenha do Espaço (ALCE), cujo tratado constitutivo foi firmado em julho de 2021, e o Fundo de Resposta Integral a Desastres para enfrentar o impacto do câmbio climático.

3. Foi aprovado o plano de autossuficiência sanitária apresentado pela CEPAL e ONU, para diminuir a dependência de medicamentos que a região enfrenta. O plano tem sete linhas de ação, entre elas, a plataforma regional de ensaios clínicos, consórcios para o desenvolvimento e produção de vacinas, um mecanismo regional de compra de vacinas e flexibilidade de acesso à propriedade intelectual.

  1. Também se manifestou:

– A necessidade de se concentrar em objetivos comuns e deixar de lado as diferenças;

– A condenação à agressividade dos EUA contra Cuba e a condenação ao bloqueio;

– A proposta de produzir o que a região consome, aproveitar recursos humanos, naturais e estratégicos, por meio de políticas redistributivas com foco em justiça social;

– O apelo ao FMI para flexibilizar a dívida e as condições de financiamento, além de  perdoar e reduzir as dívidas face à crise econômica aprofundada pela pandemia de Covid-19;

– O repúdio à intervenção nos assuntos políticos e econômicos dos Estados, apelando para a solução de conflitos por meio do diálogo e instando as organizações neutras, em particular as da ONU;

– O repúdio a medidas coercitivas unilaterais;

– A adesão ao Acordo de Paris e seus compromissos de redução de emissões para combater as mudanças climáticas;

– A urgente organização de projetos e ações conjuntas para mitigar o câmbio climático;

– O apelo a projetos conjuntos para combater o crime organizado;

– A elaboração de um plano regional para a segurança alimentar com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO)

Uma CELAC reforçada

O crescimento do endividamento, somado à crise provocada pela pandemia de Covid-19, coloca em alerta a região e levanta vozes sobre a imperatividade de acordos regionais para enfrentar os desafios.

Nesse cenário complexo, fomos testemunhas de um refluxo e enfraquecimento de vários processos de integração regional, à medida que outros foram sendo criados. Em pouco tempo, o NAFTA foi modificado na América do Norte para se tornar o TMEC, em meio a declarações e tensão máxima entre o governo Trump e o México. O Mercosul vem se enfraquecendo e perdendo a visão compartilhada, devido ao conflito alimentado pelo governo brasileiro de Jair Bolsonaro (a economia mais importante do bloco) e às assimetrias que o acordo arrasta desde sua criação. A recente decisão do Uruguai de negociar de modo unilateral com partes terceiras, em particular com a China, é outro indício desse trajeto. Outros organismos como a Comunidade Andina (CAN) e o CARICOM permaneceram mais ativos, mas são afetados por cenários políticos e sociais convulsivos. Acordos de natureza mais política, como a UNASUL, têm sofrido ataques de governos de direita e criaram outras alianças, como o Grupo de Lima ou PROSUR, como “alternativas”. O certo é que a UNASUL foi se debilitando e se desarticulando, enquanto o Grupo de Lima e o PROSUL não encontram mais motivos para atuação além de sua guerra contra a Venezuela. Por sua vez, a ALBA-TCP, em um contexto econômico de deficiências máximas geradas por sanções e bloqueios, conseguiu articular algumas medidas para aliviar o avanço da pandemia Covid-19.

Diante desse panorama complexo, a CELAC foi relançada com a presidência pro-tempore do México, ganhando força tanto nas esferas econômica e política, como em relação à saúde. Alguns avanços concretos da Presidência pro-tempore (PPT)  mexicana:

– Um dos principais marcos foi a produção e o envase de vacinas da AstraZeneca com o acordo México-Argentina, com apoio da Fundação Slim;

– A CEPAL elaborou o Plano Integral de Autossuficiência Sanitária a pedido da CELAC. Trata-se de uma rota programática para fortalecer a produção e distribuição de medicamentos – em especial vacinas – nos países da região e reduzir a dependência externa. Os avanços do plano foram apresentados por Alicia Bárcena, secretária-executiva da CEPAL, durante a reunião de chanceleres da CELAC em julho; 

– Em abril, aconteceu o encontro “Desenvolvimento Tecnológico de vacinas CELAC contra a Covid-19”, que reuniu pela primeira vez os oito centros de pesquisa que desenvolvem as vacinas mais avançadas da região, provenientes da Argentina, Brasil, Chile, Cuba e México. A aposta é reduzir a dependência de vacinas do exterior e impulsionar o desenvolvimento das produzidas na região;

– Também se concretizaram dois encontros de Especialistas CELAC para o Monitoramento do Coronavírus, onde os virologistas compartilharam experiências e ações implementadas nos países para abordar o tema da pandemia;

– Foi realizada a Reunião de Ministros da CELAC sobre o acesso latino-americano e caribenho à vacina da Universidade de Oxford e AstraZeneca contra a Covid-19;

– Tem se empenhado em manter vínculos e laços com parceiros extrarregionais, em particular para o Fórum CELAC-China, com foco em aspectos econômicos e de cooperação. Em 31 de agosto, foi realizado o Primeiro Fórum CELAC-China sobre Redução da Pobreza e Promoção do Desenvolvimento e em 2 de fevereiro o fórum teve como foco a tecnologia digital para o combate à Covid-19

– Na 75ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas (2020), a CELAC apoiou a Argentina em sua reivindicação ao Reino Unido pelos direitos legítimos da República Argentina na disputa pela soberania sobre as Ilhas Malvinas, Geórgia do Sul e Sandwich do Sul, assim como os espaços marítimos no entorno.

Os desafios

– Em virtude da liderança positiva assumida pelo México e dos avanços e conquistas obtidos sob sua presidência pro tempore, foi acordado que o país mantenha essa condição por mais um ano, a fim de dar continuidade aos projetos iniciados durante a emergência sanitária. No entanto, é necessário avançar na mudança de mandato;

– Algumas discórdias e confrontos dentro do bloco ganharam visibilidade: Paraguai vs. Venezuela, que foi replicado pelo presidente Nicolás Maduro convocando um debate sobre democracia; Nicarágua vs. Argentina, por causa da votação da Argentina a favor do informe que reprova a conduta do governo nicaraguense em matéria de direitos humanos; Uruguai vs. Cuba, que foi replicada pelo presidente Miguel Díaz-Canel convocando o diálogo e apontando os aspectos estruturais vinculados ao bloqueio contra Cuba. Essas diferenças devem ser resolvidas para que a CELAC assuma maior liderança e protagonismo, e até mesmo possa substituir ou ofuscar a OEA;

– É necessário seguir trabalhando em projetos comuns. Aprofundar o que vem sendo feito, por exemplo, em relação à Covid-19. A exposição da secretária-executiva da CEPAL, Alicia Bárcena, foi clara nesse sentido, destacando a urgência de trabalhar em conjunto para conquistar o amplo acesso a vacinas e, a médio prazo, avançar na produção de remédios e na promoção da medicina primária a nível regional, como medidas para reduzir a vulnerabilidade e a dependência diante dos países centrais.

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