Em visita ao Brasil para lançar seu novo livro, “Guerra e Revolução – O mundo um Século após Outubro de 1917” (disponível na Livraria da Opera), o professor italiano Domenico Losurdo se dispôs a conceder uma entrevista ao editor-chefe da Revista Opera, Pedro Marin, e ao colunista e ex-correspondente internacional, André Ortega.
O que segue é uma resposta bônus, sobre Hegel, que decidimos publicar à parte das três partes da entrevista. Para ler a entrevista completa, clique aqui.
Revista Opera: Por que Hegel é tão importante hoje? Por que deve-se ler Hegel hoje?
Domenico Losurdo: [risos] Bem, primeiro devemos reconhecer que Lênin, Togliatti, Gramsci, podemos adicionar até Mao Tsé-Tung; todos leram Hegel, diretamente ou indiretamente. Lênin escreveu: “Sem Hegel não podemos entender a obra de Marx”, e ele estava correto. Podemos dizer o mesmo sobre Togliatti, que inclusive traduziu algumas coisas de Hegel. Esse grande líder político; é claro, não tinha tanto tempo à sua disposição, mas encontrou tempo para traduzir Hegel.
Sobre Hegel: Herzen, que foi um democrata revolucionário do século 19 muito apreciado por Lênin, disse que a lógica de Hegel é a álgebra da revolução. Eu não tenho muito tempo, talvez em uma outra entrevista, ou talvez eu tenha um curso sobre Hegel, mas Herzen estava certo: Hegel escreveu a álgebra da revolução.
Por exemplo: podemos pegar o exemplo da Revolução Francesa, que não foi somente a revolução na França, mas também em São Domingos, a revolução dos escravos negros contra os donos de escravos, foi uma grande crise histórica. Como podemos entender essa grande crise histórica? – Se lermos os grandes pensadores liberais; Tocqueville, por exemplo… como explicar uma revolução completamente diferente? Porque na França não tivemos somente a revolução, tivemos também a contra-revolução, nova revolução, etc. Na visão de Tocqueville, tratava-se da “loucura dos jacobinos”, ele fala de “loucura”. E hoje tantas pessoas falam da “loucura dos bolcheviques”, hoje algumas pessoas falam até mesmo da “loucura de Putin” [risos], ou seja, temos esse paradigma psicopatológico, que diz que a crise histórica é explicada pela “loucura”.
Hegel foi um grande autor, que criticou esse paradigma e tratou da contradições objetivas. Somente ele foi capaz de explicar a grande crise histórica, e mesmo a revolução. Eu dei outro exemplo; disse que Hegel, em “Fenomenologia do Espírito”, diz que a verdade é a totalidade. E quando Hegel explica os caminhos diferentes nos EUA e na França, no primeiro a impressão de um “desenvolvimento pacífico” e na França a revolução, contra-revolução e nova revolução… Se lemos Tocqueville, ele diz que os norte-americanos são um povo prático e moral – apesar da escravidão – ao passo que a resposta do Hegel a essa questão é muito moderna e surpreendente; ele fala do Far-West [Extremo Oeste, Faroeste], ele diz que a expansão dos brancos no oeste possibilitou a transformação do proletário no fazendeiro.
Esse fazendeiro, é claro, era o resultado da expropriação, deportação e dizimação dos nativos. Hegel não é um idealista; isso é um conceito errado. Para a história, Hegel não é idealista, pelo contrário. Se você ler, por exemplo, a “Filosofia da História” de Hegel… O livro começa com um capítulo sobre a pressuposição geográfica da história; uma consideração materialista.
Por que na Inglaterra e nos EUA o domínio da lei teve um bom desenvolvimento? Porque até a condição geográfica desses países possibilitava uma situação mais segura. Na Rússia ou na Rússia Soviética a situação geográfica era muito diferente, tinha muito perigos. Os materialistas têm muito a aprender com Hegel.
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