Djalma Sabiá, morto no dia 9 deste mês de novembro, aos 95 anos de idade, partiu sem alarde. “Como um passarinho”, diriam os antigos, fazendo jus ao apelido que o consagrou no meio do samba. Ele era o presidente de honra e último fundador vivo da Acadêmicos do Salgueiro, uma das mais tradicionais agremiações carnavalescas do Rio de Janeiro, campeã de nove carnavais. Pode parecer pouco para quem não está familiarizado com o universo das escolas de samba, mas com Djalma Sabiá foi-se embora grande parte da memória ancestral da “Academia”, que é como ficou conhecida a escola do morro do Salgueiro, pródiga em compositores importantes, como ele próprio.
A parca repercussão midiática de sua morte, acompanhada do pouco conhecimento que se tem de sua obra, diz muito sobre a forma como o Brasil tem tratado, ao longo da história, os artistas do povo que ajudaram a construir o que se convencionou chamar de “identidade brasileira”. Se tivesse nascido na zona rural dos Estados Unidos e fizesse blues ao invés de samba, Djalma Sabiá talvez fosse considerado um gênio pelos críticos musicais. Acontece que nasceu na Rua Uruguai, entre o Andaraí e a Tijuca, e nem mesmo as câmeras da Rede Globo tiveram a dignidade de identificá-lo nas transmissões dos desfiles do Carnaval carioca.
Não foram poucas as vezes em que os comentaristas globais ignoraram a passagem do baluarte maior da agremiação salgueirense para mostrar um artista estrangeiro ou uma subcelebridade qualquer. Esbanjando toda a sua mentalidade colonizada, os funcionários da família Marinho perderam inúmeras oportunidades de entrevistar Djalma Sabiá ou de informar os telespectadores sobre a importância daquele homem na construção do “maior espetáculo da Terra”. Ano após ano, Djalma Sabiá passou despercebido. Agora é tarde.
Se, no entanto, o sambista não foi ninguém para este “Brasil oficial”, mercantilizado e ignorante de si próprio, para a comunidade que o gerou no ventre do “Brasil real” (aquele que “revela os melhores instintos”, nas palavras de Machado de Assis), ele foi e continuará sendo um dos pilares mais sólidos de nossa brasilidade. A nova relação entre Sabiá e sua escola, iniciada logo após seu funeral, foi descrita assim pelo historiador e escritor Luiz Antonio Simas: “Na minha percepção, todo dia é histórico e toda pessoa é constituída de historicidade. No dia histórico de hoje, o Salgueiro se despede de Djalma Sabiá e ao mesmo tempo se prepara para perpetuá-lo como lembrança. Enquanto Seo Djalma for lembrado, quem morre é a morte. Ele vive!”
Não por isso, mas também por ser salgueirense, sempre tive profundo respeito e admiração pela figura de Djalma Sabiá. Quando morei no Rio, entre 2011 e 2012, dei um jeito de ser apresentado a ele, com a desculpa de fazer uma entrevista. Encontrei-o na vila onde vivia, em seu quartinho na Rua Conde de Bonfim, próximo à praça Saens Pena, no bairro da Tijuca. As paredes do pequeno cômodo de 30 m², forradas com fotografias e recortes de jornais e revistas, deixavam claro que ali morava um memorialista. Percebi que aquele magro senhor de boina branca à minha frente não era apenas alguém cuja vida se confundia com a biografia do Salgueiro, mas um homem que fazia questão de preservar e divulgar essa história.
Conversamos por cerca de duas horas. Dono de memória afiadíssima para datas, nomes e fatos, falou da juventude como se a tivesse vivido ontem. Teve a certeza de que queria ser sambista ainda garoto. “Dizem que a pessoa nasce sambista; no meu caso, foi uma escolha”, disse. Era o ano de 1936 e sua avó, vizinha de uma sapataria, achou que o neto, perto de completar onze anos, deveria aprender um ofício. “Ela morria de medo que eu virasse sambista porque, para ela, todo sambista era vagabundo ou maconheiro, feito os malandros que passavam o dia subindo e descendo o morro do Salgueiro atrás de um trocado”, contou Djalma.
Para evitar que o menino se deixasse seduzir pela “vadiagem”, a velha arrumou-lhe um estágio na sapataria de dois irmãos italianos, ali mesmo na Tijuca. O que ela não sabia é que muitos dos tipos que ela deplorava batiam ponto naquela oficina, que era uma espécie de central de informações para quem estava procurando algum bico. “Os biscateiros do morro paravam ali para ver se arrumavam um trabalho temporário e acabavam tomando um biricotico com os italianos. O Pindonga não saía de lá. O Antenor Gargalhada também aparecia muito, sempre na estica. Ele encostava num canto e começava a batucar e a cantar os sambas dele. Juntava gente para ouvir. Eu me encantei com aquele cara. Ele era tudo o que eu queria ser”, confessou.
Antenor Gargalhada, mestre de Djalma Sabiá, foi o fundador da escola de samba Azul e Branco, uma das três agremiações que se fundiriam para dar origem ao Acadêmicos do Salgueiro, em 1953. Nascido possivelmente em 1909 (faleceu aos 31 anos, vítima da tuberculose, em 1941), muito cedo se tornou exímio batuqueiro e versador. Foi também líder comunitário e impediu que os moradores do morro do Salgueiro fossem despejados por uma ação judicial em 1934. Gargalhada é considerado ainda um dos primeiros compositores de samba-enredo da história, com Asas do Brasil, em homenagem a Santos Dumont.
Apesar de dizer que “escolheu” ser sambista depois de conhecer Antenor Gargalhada, Djalma Sabiá descende da nobre linhagem de Alzira de Oliveira Costa, porta-bandeira da Unidos da Tijuca, que acabou sendo a sua primeira agremiação. Pelas mãos da mãe foi apresentado, na infância, ao universo dos batuqueiros, compositores, artesãos e costureiras. Logo aprendeu a consertar e afinar instrumentos de percussão e assumiu a tarefa de cuidar para que a bateria da escola saísse bem. Na juventude, envolveu-se com Diva da Silva, porta-bandeira da Depois Eu Digo, e com ela se casou em 1946. Tiveram cinco filhos.
No entanto, em que pese sua experiência anterior como afinador de instrumentos de várias escolas, o desabrochar do sambista se dá com a fundação da Acadêmicos do Salgueiro, em 5 de março de 1953. Ao lado de Geraldo Babão, Sabiá teve participação importante nas negociações que originaram a fusão de duas escolas que coexistiam no morro: a Azul e Branco e a Depois Eu Digo (posteriormente a Unidos do Salgueiro, do bamba Casemiro Calça Larga, também viria somar forças ao movimento). Cada qual tinha a sua característica e o seu valor, mas individualmente não tinham estrutura para ameaçar o domínio da Mangueira, da Portela e do Império Serrano. Fundidas e unificadas em torno da mesma bandeira, as pequenas escolas tijucanas tornaram-se uma fortaleza: em seu primeiro desfile, em 1954, o Salgueiro já mostrou a que veio e obteve o 3º lugar.
Djalma Sabiá me mostrou o primeiro estatuto da Acadêmicos do Salgueiro, com as assinaturas originais de seus fundadores — nomes que povoavam o meu imaginário desde que comecei a me interessar por escola de samba. Emocionado com o documento histórico que tinha em mãos, perguntei ao sambista se havia alguma passagem ocorrida nos primórdios da escola que mereceria ser contada em livro. Foi então que Sabiá me falou de um episódio até então pouco conhecido — e fogos de artifício explodiram em meu peito.
Em 1959, logo após a Revolução vitoriosa, o governo de Cuba entrou em contato com o Departamento de Turismo da Prefeitura do Rio de Janeiro. O telegrama (imagino que tenha sido um telegrama), assinado por Fidel Castro, convidava uma escola de samba carioca para se apresentar em Havana, num evento que tinha como objetivo celebrar a cultura dos povos irmãos da América Latina. A Portela era a primeira da lista, por ter sido a campeã daquele ano, mas declinou do convite por não aceitar viajar com um número reduzido de componentes. Coube então ao Salgueiro, o vice-campeão, embarcar para a capital cubana no dia 30 de abril.
A comitiva salgueirense incluía o presidente Nelson de Andrade, a passista Paula do Salgueiro e mais 23 integrantes, entre eles os compositores Noel Rosa de Oliveira e Djalma Sabiá. Segundo Sabiá, Ernesto Che Guevara em pessoa recepcionou o grupo no aeroporto de Havana no dia 1º de maio. A estadia durou menos de uma semana, mas a “Academia” teve tempo de se apresentar para uma pequena multidão na Avenida El Malecon e depois na Boate Tropicana, com participação do cantor Blecaute. Antes de se despedir da ilha, o Salgueiro tocou para autoridades locais no jardim da embaixada brasileira.
Sabiá disse ter se sentido em casa durante a visita a Cuba. Na rua era chamado de “negrito”, mas não via nenhuma conotação racista neste tratamento. “Os cubanos se chamam dessa forma. É um jeito carinhoso. ‘Baila, negrito’, diziam pra mim ao me ver com o fardamento do Salgueiro. E eu ria.” Dentre as lembranças mais marcantes está o “vexame” dado pela comitiva logo no primeiro dia. “Tomamos um porre desgraçado de leite-de-onça. Teve um dos nossos que vomitou na recepção do hotel.”
Leite-de-onça é um aperitivo muito popular no Rio de Janeiro, inventado pelo próprio Djalma Sabiá. Consiste na mistura de leite condensado, leite de coco e cachaça. Ele conta que criou a bebida logo que passou a frequentar a quadra do Salgueiro. Para complementar a renda mensal, Sabiá produzia a batida em grandes quantidades e vendia durante os ensaios da escola. Pouco tempo depois, o leite-de-onça passou a ser reproduzido e comercializado nas quadras de outras agremiações e nos botequins da cidade. Viralizou, na linguagem de hoje.
Em 2017, em entrevista ao pesquisador Alexandre Teixeira, o compositor retoma a história dessa viagem e aborda a questão do socialismo cubano: “Não sou inteligente em política, mas observo muita coisa. O que fazem contra Cuba é uma covardia. A indústria de automóveis não existe por lá, é verdade; mas também não existe tráfico de drogas e analfabetismo. O capitalismo não tem coração. Morra quem morrer, os capitalistas só querem vender armas, eles mesmo provocam as guerras para vender seus produtos. Em Cuba não há nada disso.”
1959 foi um ano importante para o Salgueiro. Não só pela viagem a Cuba, que fez dele a primeira escola de samba a se apresentar num país estrangeiro, mas principalmente porque o vice-campeonato no Carnaval chamou a atenção do jurado Fernando Pamplona. No ano seguinte, Pamplona seria incorporado à escola como carnavalesco e daria início à “revolução salgueirense”. Foi a partir da chegada de Pamplona que a “Academia” passou a levar para a avenida enredos com temas relacionados a aspectos da vida dos negros e da diáspora africana. O que hoje é visto como regra, naquela época era exceção.
Antes de Fernando Pamplona e do belo samba Quilombo dos Palmares, assinado por Anescarzinho e Noel Rosa de Oliveira, que ajudou o Salgueiro a conquistar o seu primeiro título em 1960, Djalma Sabiá e Amado Régis haviam apresentado no Carnaval de 1957 o pioneiro Navio Negreiro — e este até então era o único samba-enredo relevante a trazer uma temática afrobrasileira. Ao longo das décadas de 1960 e 1970, o Salgueiro deu verdadeiras aulas de História em seus desfiles. Alguns deles, inclusive, tiveram problemas com a censura durante a Ditadura Militar.
Em depoimento ao professor Roberto M. Moura no livro Carnaval – Da Redentora à Praça do Apocalipse, Fernando Pamplona comenta a respeito dos muitos problemas que o engajamento do Salgueiro trouxe à escola nos Anos de Chumbo, mesmo quando o enredo nada tinha de engajado. Há uma passagem hilária: “Depois de Palmares, Chica da Silva, Chico Rei e a História da Liberdade, o Sal ficou manjado e a censura aporrinhou paca. Uma vez, três dias antes do desfile de 1970, chegou o pessoal ‘amigo’ da censura. O enredo era Praça XI e todos os nossos carros eram absolutamente realistas. Havia um boteco, com mesa de boteco, cadeira de boteco, balcão de mármore de boteco e com chope de verdade, manequim com roupa natural e, é óbvio, o mictório em meio a um amontoado de engradados de garrafas e barris. Havia um manequim de terno branco com uma das mãos pregadas na parede ao alto e a outra no invisível ‘assunto’. Disse o censor: ‘Mijando naõ pode! Tira’. Respondi: “Tá mijando não, tá vomitando. É que a outra mão caiu’. Chamei um carpinteiro e pedi que pregasse a mão do ‘assunto’ também no alto (as duas para cima, apoiando-se na parede sobre o vaso sanitário). O censor ficou satisfeito e disse: ‘Agora, sim. Vomitando, pode!’ E o vômito ainda está caindo em cima deles.”
Djalma Sabiá presenciou tudo isso e se lembra de um ensaio geral em que a luz da quadra da escola foi cortada por ordem dos generais, que não gostaram do enredo A História da Liberdade no Brasil. Isso em 1967. O ensaio seguiu na penumbra, aproveitando o gerador de uma produtora de cinema italiana que, por coincidência, estava no local registrando a batucada para um documentário.
Três anos antes, em 1964, o Salgueiro desfilava com Chico Rei, samba antológico com letra de Djalma Sabiá. Ele acredita que se o Carnaval daquele ano fosse realizado logo após o golpe militar e não no mês que o antecedeu, a escola possivelmente teria sofrido algum tipo de reprimenda. “Falar de escravo dócil, podia; mas do escravo que lutava por liberdade, não”, disse.
Chico Rei é a obra-prima de Djalma Sabiá (em parceria com Binha e Geraldo Babão). O samba conta a saga de Chico Rei, um monarca nascido no Reino do Congo, que originalmente se chamava Galanga, foi escravizado no Brasil e comprou a própria alforria escondendo ouro nos cabelos. A história faz parte da tradição oral de Minas Gerais e não se tem certeza se o personagem existiu de fato ou não passa de uma lenda.
Martinho da Vila, quando ouviu Chico Rei pela primeira vez, declarou que era “o mais belo samba-enredo de todos os tempos” e desejou gravá-lo imediatamente. O registro mais famoso do épico salgueirense pode ser encontrado no elepê intitulado Samba Enredo, de 1980, que Martinho gravou pela RCA Victor.
Djalma Sabiá revelou que Martinho da Vila esbarrou em dois termos desconhecidos para ele durante o processo de gravação: “Me ligaram do estúdio para que eu fosse até lá, porque Martinho queria falar com o compositor de Chico Rei. Disseram que ele não estava entendendo umas palavras do samba. Fiquei meio assim, achando que ele me pediria para mudar a letra, mas acabei indo”, disse.
Em quimbundo, “bengo” é um rio que corre em Angola e “baobá” uma árvore nativa frondosa, símbolo do continente africano. Martinho da Vila ainda não havia aprofundado sua relação com a africanidade e, talvez por isso, não tenha compreendido o significado das palavras. Pode ser que o samba-enredo de Djalma Sabiá tenha tido alguma influência na decisão de Martinho de estreitar laços com a África portuguesa. “Ele ficou muito satisfeito quando eu expliquei pra ele o que significavam aquelas palavras. Me disse que agora tudo fazia mais sentido. Depois da gravação fomos beber cerveja”, recordou o compositor.
No ano 2000, Djalma estava no Theatro Municipal para prestigiar o amigo Martinho da Vila, que estreava o espetáculo Concerto Negro. Ao vê-lo sentado na plateia, o cantor declamou a letra de Chico Rei e anunciou em tom comovido: “Este, para mim, é o samba-enredo mais bonito que ouvi na vida. E um dos autores está aqui, Djalma Sabiá!” O teatro então se levantou e aplaudiu durante longos minutos o sambista salgueirense, que não conteve as lágrimas.
A importância desta composição em sua carreira pode ser medida por um detalhe: de todas as relíquias que Sabiá guardava em seu acervo, como jóia preciosa, a que ele mais gostava era uma pedrinha retirada da mina onde Chico Rei teria supostamente trabalhado.
“Vivia no litoral africano
Uma régia tribo ordeira
Cujo rei era símbolo
De uma terra laboriosa e hospitaleira
Um dia essa tranqüilidade sucumbiu
Quando os portugueses invadiram
Capturando homens
Para fazê-los escravos no Brasil
Na viagem agonizante
Houve gritos alucinantes
Lamentos de dor
Ô, ô, ô adeus, baobá, ô, ô, ô
Ô, ô, ô adeus, meu bengo, eu já vou
Ao longe, Minas jamais ouvia
Quando o rei mais confiante
Jurou à sua gente que um dia os libertaria
Chegando ao Rio de Janeiro
No mercado de escravos
Um rico fidalgo os comprou
E para Vila Rica os levou
A ideia do rei foi genial:
Esconder o pó de ouro entre os cabelos
Assim fez seu pessoal
Todas as noites quando das minas regressavam
Iam à igreja e suas cabeças banhavam
Era o ouro depositado na pia
E guardado em outro lugar com garantia
Até completar a importância
Para comprar suas alforrias
Foram libertos cada um por sua vez
E assim foi que o rei
Sob o sol da liberdade trabalhou
E um pouco de terra ele comprou
Descobrindo ouro enriqueceu
Escolheu o nome de Francisco
E ao catolicismo se converteu
No ponto mais alto da cidade, Chico Rei
Com seu espírito de luz
Mandou construir uma igreja
E a denominou
Santa Efigênia do Alto da Cruz.”
Djalma Sabiá, que nasceu Djalma de Oliveira Costa no dia 13 de maio de 1925, foi um compositor revolucionário, na medida em que ajudou a consolidar, por meio do samba-enredo, a África no imaginário popular. Muitos foram os sambas que escreveu sob a égide dos orixás e dos heróis do povo negro que civilizaram o Brasil. O último de sua lavra a ser cantado na avenida foi Valongo, com o qual o Salgueiro desfilou em 1976. Nesta ocasião a escola ficou apenas em 5° lugar, mas o samba é citado até hoje como uma das grandes obras da história do Carnaval.
O apelido Sabiá adquiriu jogando futebol. Não era craque, mas se garantia na defesa. De sua boca ouvi o seguinte relato: “Eu era beque central, certo? Apesar de ser magrinho e ter as pernas finas, ninguém passava por mim. Aí o técnico deles, pê da vida comigo, gritou na beira do campo: ‘Mas não é possível que ninguém consiga passar por esse sabiá! Dá uma porrada nesse perna de sabiá!” Djalma nunca mais se livrou do apelido e acabou incorporando-o ao nome.
Como compositor do Salgueiro, emplacou seis sambas na avenida. Uns ficaram mais famosos e outros menos, mas todos se tornaram clássicos do gênero. Era essencialmente letrista, deixando a melodia para os parceiros. Gostava de compor com o flautista Geraldo Babão, com quem tinha mais afinidade. “Na melodia ele era o maior. Só não gostava dele quando vinha dar palpite na minha letra. Não sou melodista e nem sou de cantar. Meu negócio mesmo sempre foi pesquisar e escrever”, comentou.
Em 2018, com a saúde já debilitada, Djalma Sabiá tomou posse como Presidente de Honra do Salgueiro. Baluartes de outras agremiações, como Nelson Sargento, Aloísio Machado e Rubem Confete, compareceram à cerimônia em sinal de deferência. Naquele mesmo ano, o compositor de Chico Rei faria sua última passagem pela Marquês de Sapucaí: desfilou vestido de Xangô, o Príncipe de Oyó.
O Grêmio Recreativo Escola de Samba Acadêmicos do Salgueiro lamentou assim a morte de seu fundador: “(…) Embora não tenha nascido no Morro do Salgueiro, foi ali que fincou suas raízes e onde encontrou amigos, amores e inspiração para compor sambas que foram eternizados na história dos Acadêmicos, escola que ajudou a fundar e onde deixou sua assinatura em cada segmento. Afinou instrumentos, foi intérprete, compositor, diretor de carnaval e era considerado por muitos uma verdadeira enciclopédia da história do Salgueiro. (…) Sabiá revolucionou em verso e prosa o desfile, ajudando a levantar com altivez a bandeira de luta pela valorização e reconhecimento dos personagens pretos de nossa história. (…) Nosso baluarte, mestre e referência histórico-cultural segue para um novo plano onde estão Aldir Blanc, Elizabeth Nunes e tantos salgueirenses que escolheram 2020 para sua despedida, marcando para sempre sua história em nossos corações. Descanse em paz. Salve Djalma Sabiá, nosso rei negro!”