Em 12 de novembro de 2019, após o golpe de Estado contra o presidente Evo Morales, a segunda vice-presidente do Senado, Jeanine Áñez, foi proclamada presidente da Bolívia. Para lidar com a política externa, a presidente de facto convocou a advogada e acadêmica Karen Longaric, que assumiu o cargo em 14 de novembro.
Apesar de ter sido proposto como um “governo de transição”, Áñez e Longaric se dedicaram, em poucos meses, a desarticular o papel que a Bolívia havia assumido no plano internacional e, sobretudo, a importância que havia adquirido sob a presidência de Evo Morales, que conduziu uma política externa soberana primeiramente junto a David Choquehuanca, depois com Fernando Huanacuni Mamani e, ao final de seu governo, com Diego Pary.
Em um documento que viria a ser conhecido ao final do mandato, Karen Longaric expôs sua visão acerca do que havia sido a política internacional de Evo Morales. “A política externa estava subordinada a interesses políticos internos, não ao interesse nacional […] o que levou a um certo isolamento internacional, colocando-nos ao lado dos países que promoveram o Socialismo do Século XXI e seus foros internacionais.”
Em seguida, Longaric descreveu em primeira pessoa sua tarefa no governo de facto: “Entendi que uma transição democrática não significava manter o status quo e ser simplesmente uma gestora da continuidade de uma política externa errada e errática. Ao contrário, no processo de transição para a democracia plena, era imperativo promover mudanças e reformas tangíveis que transformassem a Chancelaria para que trabalhe pelos interesses da Bolívia; por isso reposicionei o país no seio das nações democráticas e promovi a institucionalização e a renovação dos quadros diplomáticos ”.
A chanceler destacou que o primeiro pilar fundamental de sua gestão foi a “desideologização” da política externa com sua aproximação aos Estados Unidos, à União Europeia, ao Grupo de Lima e ao Prosul.
Porém, embora a intenção declarativa da ministra de Relações Exteriores de facto fosse “desideologizar” a chancelaria, cabe perguntar por que se afastou de alguns países a ponto de cortar as relações institucionais. Um dia após assumir o cargo, Longaric anunciou o rompimento das relações com a Venezuela, com o argumento de que havia pessoas de origem venezuelana “envolvidas em assuntos internos do Estado”, e chegou a deter quase uma dúzia de pessoas acusando-as de sedição.
Além disso, anunciou a saída da Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América – Tratado de Comércio dos Povos (ALBA-TCP) e afirmou que já analisavam a saída da União de Nações Sul-Americanas (UNASUL), cujo processo de denúncia foi formalmente iniciado em 13 de dezembro de 2019.
Com a chegada de Evo Morales e Álvaro García Linera ao México, além do asilo proporcionado pela embaixada mexicana na Bolívia a funcionários perseguidos pelo governo de facto, Longaric atacou as ações diplomáticas do México: “Expressei nosso desconforto à embaixadora e também o desconforto do povo boliviano. A atitude do México de permitir que Evo Morales faça pronunciamentos desafiadores e ameaçadores, enfim, tudo isso gera muita indignação entre os cidadãos”.
Cuba também foi uma das primeiras vítimas do redirecionamento das relações internacionais. Como resultado da estigmatização, da hostilidade e da perseguição por parte do governo de facto, 725 cubanas e cubanos, que cooperavam sobretudo na área da saúde, tiveram que deixar o país de um dia para o outro. Como no caso dos venezuelanos detidos, o ministro do governo de facto, Arturo Murillo, anunciou a prisão de quatro médicos cubanos acusados de possuir armas e dinheiro.
Ao mesmo tempo que anunciava essa série de medidas drásticas, Longaric despediu 80% dos embaixadores que haviam sido nomeados pelo governo de Evo Morales. “Vamos estreitar as relações com todos os países que estiveram afastados da Bolívia”, afirmou em declarações à imprensa. Estreitar relações com esses países significou “fortalecer” as relações com o Chile após o conflito suscitado pelo acesso ao mar entre os dois países, questão que terminou com uma derrota para Bolívia nos tribunais de Haia.
Em três dias de gestão, a chanceler desmantelou um arcabouço que levou anos para ser construído e começou a construir um novo, feito sob medida pelo governo de facto.
Em 27 de novembro, Longaric nomeou Walter Óscar Serrate Cuéllar como Embaixador Extraordinário em Missão Especial ao Governo dos Estados Unidos. Em setembro de 2008, o governo de Evo Morales expulsou o embaixador Philip Goldberg após acusá-lo de separatismo e rompeu relações diplomáticas com os Estados Unidos em meio a uma tentativa de golpe de Estado iniciada no departamento de Santa Cruz.
No dia 28 do mesmo mês, a chanceler anunciou o restabelecimento das relações diplomáticas com Israel, que haviam sido cortadas em 2009 após uma ofensiva do exército israelense à Faixa de Gaza em dezembro de 2008, considerada “terrorista” por Evo Morales. As relações formais com Israel foram restauradas em 3 de fevereiro de 2020.
Dois acontecimentos marcaram os primeiros dias de dezembro de 2019. Jeanine Áñez convocou o ex-presidente Jorge “Tuto” Quiroga – opositor do governo de Evo Morales – para ser “delegado diante da comunidade internacional”. Sua missão seria “explicar a violação dos direitos humanos que os bolivianos vivenciaram recentemente”, disse a presidente de facto em coletiva de imprensa.
Quiroga, por sua vez, afirmou que “chegou ao fim uma longa noite tirânica de quase 14 anos. Evo Morales tentou cometer uma fraude. O relatório final da Organização dos Estados Americanos (OEA) mostrará ao mundo sua vergonhosa tentativa de fraudar as eleições no país”.
No dia 5 de dezembro, dois dias após a nomeação de “Tuto” Quiroga, Longaric participou da 55ª Cúpula do Mercosul realizada no Brasil. Mario Abdo Benítez, Mauricio Macri, Lucía Topolansky e Jair Bolsonaro participaram da reunião. Lá, o governo de facto recebeu apoio da Argentina, Brasil e Paraguai.
O Uruguai, por meio do então chanceler, Rodolfo Nin Novoa, afirmou que Evo Morales “foi forçado a renunciar ao cargo, causando um colapso institucional que representa uma ruptura da ordem democrática nos termos estabelecidos no artigo 3 do ‘Protocolo de Ushuaia’ sobre compromisso democrático no Mercosul, Bolívia e Chile”.
Para fechar o ano, o governo de facto continuou tensionando as relações com o México. Em 23 de dezembro, Longaric anunciou que a Bolívia não participaria do início da Presidência Pro Tempore da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) que o México assumiu por “desconhecer as atribuições da presidência Pro Tempore ocupada pela Bolívia na CELAC durante 2019, quebrando a institucionalidade e a unidade latino-americana e caribenha”.
O governo de Andrés Manuel López Obrador, por sua vez, expressou “profunda preocupação com a presença excessiva de pessoal dos serviços de inteligência e segurança bolivianos, que monitoram tanto a Residência, quanto a Embaixada do México no Estado Plurinacional da Bolívia, desde 11 de novembro”.
Simultaneamente, Karen Longaric anunciou a adesão da Bolívia ao Grupo de Lima. “O Grupo de Lima é um grupo ad hoc que foi criado para ajudar o povo venezuelano na tarefa de recuperar as instituições democráticas e o estado de direito, além de garantir que sejam respeitados os direitos humanos, tão ultrajados e violados na Venezuela. Nessa ideologia de respeito pelos direitos humanos e respeito pelo estado de direito dos povos, a Bolívia se juntou a esse grupo para trabalhar em conformidade com esses objetivos”.
Dias depois, por meio do subsecretário para a América Latina e o Caribe do Ministério das Relações Exteriores, Maximiliano Reyes Zúñiga, o México solicitou uma reunião urgente para resolver o conflito, já que o cerco aos escritórios diplomáticos mexicanos na Bolívia chegou a contar com 50 civis, policiais e militares, em mais de 10 veículos. O objetivo do governo de facto era prender os ex-ministros asilados na embaixada.
O conflito atingiu tal ponto que Jeanine Áñez declarou a embaixadora mexicana e os diplomatas espanhóis como “personas non gratas” após um confuso episódio com acusações cruzadas entre os chanceleres da Bolívia e do México. O governo do Reino da Espanha emitiu um comunicado no qual rechaçou as acusações do governo de facto: “A Espanha rechaça categoricamente qualquer insinuação sobre uma suposta vontade de interferir nos assuntos políticos internos da Bolívia. Para a Espanha, qualquer afirmação nesse sentido constitui uma calúnia que visa prejudicar nossas relações bilaterais com falsas teorias conspiratórias”.
Até a União Europeia, com a qual o governo de facto se gabava de retomar as relações em contraposição à política externa de Evo Morales, rechaçou a expulsão “extrema e hostil” dos diplomatas espanhóis. No entanto, as declarações dos funcionários do governo de facto foram ainda mais longe. Fernando López, Ministro da Defesa, afirmou em uma entrevista que o segundo vice-presidente da Espanha, Pablo Iglesias, “representa o fio condutor da máfia terrorista sediciosa”.
A Procuradoria-Geral convocou a testemunharem o vice-presidente da Espanha, Pablo Iglesias, o ex-presidente José Luis Rodríguez Zapatero, e os dirigentes políticos e renomados intelectuais Iñigo Errejón e Juan Carlos Monedero “para que possam prestar esclarecimentos sobre os fatos ocorridos em 27 de dezembro na sede da Embaixada do México.”
Já em meados de janeiro de 2020, Jeanine Áñez recebeu a visita de Mauricio Claver-Carone, ex-assessor Presidencial Especial para Assuntos do Hemisfério Ocidental do Governo dos Estados Unidos e atual presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). “Vim a esta viagem em nome do presidente Trump para saudar e reconhecer o trabalho da presidente Áñez neste momento de transição e de otimismo para a Bolívia”.
Um mês antes, Áñez havia falado por telefone com o Secretário de Estado Mike Pompeo. Em 20 de janeiro, Karen Longaric concretizou esse encontro junto a Pompeo na Colômbia. Em território colombiano, a chanceler de facto participou da Terceira Conferência Ministerial de Combate ao Terrorismo, realizada em Bogotá. Até então, as eleições estavam marcadas para 3 de maio.
Ao passo que retomava as relações com os Estados Unidos, que anunciou o envio de um embaixador à Bolívia, o governo de facto suspendia formalmente as relações diplomáticas com Cuba, o que, na prática, havia sido consumado assim que o golpe de Estado se estabeleceu. “O Governo cubano tem comprometido de maneira sistemática as relações bilaterais baseadas no respeito mútuo, nos princípios da não ingerência nos assuntos internos, na autodeterminação dos povos e na igualdade soberana dos Estados”, afirmou o ministério de Relações Exteriores.
Em paralelo, Karen Longaric estreitava vínculos com Luis Almagro e a Organização dos Estados Americanos (OEA), cuja Missão de Observação Eleitoral e seu Secretário-Geral se encarregaram de denunciar uma possível fraude horas após o fim das eleições de 2019. Em sessão do Conselho Permanente no dia 23 de janeiro, Almagro afirmou que “o compromisso da Secretaria-Geral da OEA com a democracia do Estado Plurinacional da Bolívia e de todos os países do hemisfério é absoluto”.
Em troca, o governo de facto retribuiu esse favor apoiando a reeleição de Luis Almagro como Secretário-Geral: “A Organização dos Estados Americanos, como foro político das Américas, requer que se mantenha a liderança de alguém comprometido com os valores da democracia representativa expressos na Carta Democrática Interamericana “
Poucos dias antes da reunião do Conselho Permanente da OEA, mais precisamente em 20 de janeiro, o Ministério das Relações Exteriores anunciou a suspensão dos vínculos com a República Árabe Saaraui Democrática e o “fortalecimento” das relações diplomáticas com o Marrocos. Desse modo, o governo de facto adotou uma “neutralidade construtiva” com base nas explicações fornecidas pelo Reino do Marrocos sobre a questão do Saara Ocidental.
Karen Longaric continuou buscando o caminho da amizade com o Chile no conflito pelo acesso ao mar e pelos direitos sobre as águas do Silala, afirmando que “diante do fracasso da judicialização e mediação da questão marítima, a Bolívia optará pelo caminho da alta diplomacia e da negociação para resolver as diferenças”.
Apesar de ter reconduzido as relações internacionais, o governo de facto tinha uma conta pendente: o vínculo com as organizações financeiras internacionais. Em 17 de abril, Áñez recorreu ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e ao Banco Mundial para um empréstimo de 320 milhões de dólares para enfrentar o avanço da pandemia.
Em 5 de junho, com o argumento de economizar recursos e destiná-los ao combate à Covid-19, Áñez ordenou o fechamento das embaixadas da Bolívia no Irã e na Nicarágua. No entanto, a presidente de facto afirmou que “não temos nada contra esses países e povos nobres e irmãos que respeitamos e são amigos”.
Dias depois, como se não bastasse o crédito de mais de 300 milhões que havia pedido ao FMI e ao Banco Mundial, o governo de facto solicitou um empréstimo de 450 milhões de dólares ao BID e 350 milhões de dólares ao CAF-Banco de Desenvolvimento da América Latina.
No final de agosto, quando o governo de facto estava próximo do fim devido à proximidade das eleições, os Estados Unidos e a Bolívia assinaram o Memorando de Entendimento “América Cresce”, firmado por Karen Longaric e o Encarregado de Negócios dos Estados Unidos, Bruce Williamson, com o objetivo de “fortalecer a Cooperação em matéria de Energia, Infraestrutura, Comércio e Digitalização”.
“Growth in the Americas”, seu nome original, é um instrumento que permite que empresas privadas de capital estadunidense invistam, com condições preferenciais, nos países signatários desta iniciativa, tendo o governo dos Estados Unidos como elo entre as empresas e os países latino-americanos.
Em 26 de agosto, um dia após a assinatura do acordo com os Estados Unidos, Áñez propôs a candidatura de Karen Longaric para a Secretaria-Geral da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi). “Minha candidatura propõe a integração e o comércio como caminho para o desenvolvimento da região”, afirmou a chanceler de facto.
Além disso, diante da preocupação com as pesquisas que davam como vencedor das eleições o candidato do Movimento ao Socialismo (MAS), Luis Arce, Longaric protestou contra a “ingerência” argentina nas eleições de outubro: “o Ministério das Relações Exteriores deve garantir os direitos dos bolivianos no exterior e, entre eles, o direito de que nossos compatriotas possam exercer o voto livre e democraticamente, porém, a interferência de funcionários do governo argentino põe em dúvida a transparência da realização das eleições bolivianas na Argentina”.
Em 2 de setembro, a chanceler de facto anunciou que faria uma apresentação formal à OEA e à ONU porque “houve uma violação ao direito internacional e às cartas das Nações Unidas e da OEA” para denunciar a “grave intromissão das autoridades argentinas em assuntos internos nacionais”.
Já no crepúsculo do governo de facto, com Áñez prestes a retirar sua candidatura, Longaric desistiu do avanço na Aladi com críticas à organização e ao Uruguai. “Existe um acentuado viés ideológico entre alguns Países Membros, o que contraria o próprio Estatuto da ALADI e gera problemas de natureza insolúvel quando surgem situações que lidam com a intransigência. O Governo da Bolívia lamenta que o país sede, aproveitando esta condição, tente voltar a ocupar pela terceira vez a Secretaria-Geral com seu próprio candidato”.
Em 23 de setembro, na Assembleia Geral da ONU, que foi realizada de maneira virtual em razão da pandemia, Jeanine Áñez fez referência a duas questões relacionadas à política internacional. Em primeiro lugar, denunciou “o assédio sistemático e abusivo que o governo kirchnerista da Argentina exerce contra as instituições e contra os valores republicanos na Bolívia […] que o populismo kirchnerista saiba que a nação boliviana não é propriedade privada de nenhuma casta. Somos um povo soberano e respeitável. A Bolívia é respeitada. A democracia boliviana é respeitada. O povo boliviano é respeitado”.
Em segundo lugar, referiu-se à questão marítima: “Apelo à comunidade internacional para que, nestes novos tempos, solucionemos através da negociação e do entendimento fraterno os problemas críticos e pendentes entre os Estados, como a falta de um acesso soberano ao Oceano Pacífico para a Bolívia ”.
No primeiro dia de outubro, Karen Longaric compareceu perante o Parlamento Europeu em Bruxelas, na Bélgica. Lá, a chanceler agradeceu o apoio “transcendental” da União Europeia “no processo inicial de pacificação”. Além disso, seu discurso foi baseado nas ações do governo anterior. Quanto às relações internacionais, afirmou que “Evo Morales alinhou a política externa boliviana à de regimes autoritários como a Venezuela de Maduro”.
Para encerrar seu pronunciamento, Longaric agradeceu e ressaltou os valores europeus: “A Europa, essa ideia de integração e paz, de respeito aos princípios democráticos e ao Estado de direito, já não é um patrimônio apenas dos europeus. Somos muitos em todo o mundo que vemos com admiração e esperança o que se constrói na Europa, um projecto que pode ser aperfeiçoado, mas que se inspira no mais elevado espírito humano: o respeito pela dignidade humana e o desejo inabalável de democracia, paz e liberdade. Mais uma vez, em nome dos meus compatriotas, agradeço”.
Em 20 de outubro, no marco do 50º período de sessões da Assembleia Geral da OEA, a Ministra das Relações Exteriores pediu o “aprofundamento da cooperação regional, fortalecimento de nossos laços comerciais e mecanismos de integração regional, a partir de uma lógica pragmática e desideologizada”.
Após o triunfo consumado da dupla Luis Arce-David Choquehuanca, Karen Longaric participou do Conselho Permanente da OEA em 5 de novembro. Apesar de faltarem três dias para a posse do novo presidente, a ministra de Relações Exteriores atacou Evo Morales e o Grupo de Puebla: “Esperamos que Luis Arce escolha o caminho da conciliação e do respeito ao Estado de direito, ao invés do caminho de ódio e divisão que Evo Morales e seus mentores do Grupo de Puebla promovem”.
A última ação do ministério liderado por Longaric foi negar o convite para a posse do presidente eleito ao presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, e ao próprio Evo Morales. Em despedida, a chanceler se expressou no Twitter na véspera de deixar o cargo: “A difícil situação política e social na Bolívia e os ataques do exterior ao processo democrático marcaram o período em que fui chanceler”.
Já como ex-chanceler, Longaric participou junto a Álvaro Uribe e Luis Almagro na sessão aberta “Os direitos humanos e a justiça em debate”, da Associação Mundial de Juristas. Lá, afirmou que “existem organizações que têm uma visão tendenciosa quanto ao julgamento ou avaliação da violação dos Direitos Humanos”, citando a Corte Interamericana de Direitos Humanos e a Organização das Nações Unidas.
“Para ser sincera, eu não tenho muita confiança no sistema latino-americano de Direitos Humanos. Se o passado nos mostra algo sobre esta comissão, é que ela tem sido profundamente ideologizada, isso é o que pudemos perceber em meu país. No caso atual, em que se inicia um novo governo com antecedentes nada recomendáveis acerca do respeito aos direitos humanos, eu me pergunto como a comunidade internacional e o sistema de direitos humanos reagirão quando este novo governo da Bolívia iniciar perseguições políticas e usar a justiça como instrumento sancionador da política”.
Ao assumir o cargo de ministra das Relações Exteriores, a chanceler de facto pretendia “desideologizar” a política externa boliviana. A rápida ruptura das relações com Cuba e Venezuela, a tensão permanente com os governos de Andrés Manuel López Obrador e Alberto Fernández e o restabelecimento das relações com os Estados Unidos, Israel e Marrocos contradizem a teoria da “desideologização”.
Além disso, o ingresso no Grupo de Lima e Prosul, a aproximação com o Secretário-Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA,) Luis Almagro, e o distanciamento da Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América – Tratado de Comércio dos Povos (ALBA-TCP), da União de Nações Sul-Americanas (UNASUL) e da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), ratificam que o verdadeiro objetivo do governo de facto era estreitar os vínculos com os governos de direita da América Latina e retomar as diretrizes econômicas, políticas e culturais ditadas pelos Estados Unidos.
Embora a chanceler Longaric quisesse negar, todas as ações são ideológicas.
*Comunicador social, docente, redator de Nodal.am, colaborador do Centro Latino-americano de Análisis Estratégico (CLAE)