No dia 25 de março a Câmara dos Deputados votou o Orçamento de 2021, que agora segue para vetos ou sanção presidencial. Diga-se de antemão, a descoordenação é tamanha que o orçamento deveria ter sido votado ainda no fim de 2020, logo após a votação das diretrizes mais gerais expressas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
O desenho do Orçamento vai, ano a ano, entrando em contradição com o emaranhado de regras fiscais brasileiras. Desde a aprovação do Teto de Gastos, as despesas primárias do governo – aquelas que excluem as despesas financeiras – precisam caber em um minguado nível de receitas. Como se não bastasse o conjunto de regras fiscais precedentes – teto de gastos, regra de ouro, Lei de Responsabilidade Fiscal e meta de Resultado Primário – o Governo Federal ainda colocou, de contrabando, em nome da necessidade de uma nova rodada de auxílio emergencial – a chamada PEC Emergencial –, o acionar de gatilhos automáticos para cortar gastos quando as despesas obrigatórias atingirem 95% das despesas totais.
A PEC Emergencial entra necessariamente em contradição com o Teto de Gastos porque, em função dessa regra, o conjunto da despesa obrigatória cresce, principalmente a despesa com Previdência Social. Assim, o total obrigatório vai espremendo a despesa discricionária, levando, necessariamente, a uma situação em que a despesa obrigatória, logo mais, chegará aos 95% da despesa total, em função do pequeno espaço fiscal existente em função do Teto.
Como se não bastasse seguir operando sob essas regras fiscais em meio à maior pandemia do século – algo que os países desenvolvidos abriram mão – o orçamento ainda veio com total inversão de prioridades, a começar pelo gasto com saúde, que terá redução em relação ao orçamento executado em 2020, justamente no momento mais grave da pandemia. Além disso, a suplementação ao Ministério da Saúde é apenas metade da suplementação aprovada para o Ministério do Desenvolvimento Regional, movimento em completa dissonância com relação a necessidade de ampliação dos gastos com saúde pública.
O salário mínimo, no ano de 2021, não irá nem repor a inflação. Isso é particularmente deletério à população brasileira em dois sentidos: o primeiro deles é o aumento expressivo do custo da Cesta Básica em função da concentrada inflação dos alimentos. Para que se tenha uma ideia, em 2014 o salário mínimo correspondia a 44% do custo da Cesta Básica; em fevereiro de 2021 esse mesmo salário corresponde a 60%. Ou seja, em termos reais, o poder de compra da população está caindo e comprometendo um direito humano básico que é o da alimentação. Em segundo lugar, o salário mínimo é um “farol” que atua como referência para o salário médio de pelo menos 50 milhões de trabalhadores. A sua correção com R$12 de defasagem com relação à inflação reduz um monte substantivo na massa salarial total. Gente com menos renda consome menos e isso significa mais obstáculos à recuperação econômica.
E não para por aí: a boiada está passando, e isso fica expresso no fato de que o Ministério do Meio Ambiente teve cortes orçamentários na ordem dos R$ 560 milhões. Caso a comparação seja com o valor total outrora recebido em 2013, o montante que consta em 2021 é três vezes menor. O IBAMA, a título de exemplo, terá uma redução de 25% nas suas receitas, justamente em um período em que avançam as queimadas e investida contra o meio ambiente.
A educação teve um leve aumento de recursos no Orçamento proposto em relação ao ano de 2020. No entanto, o montante é insuficiente para repor as perdas do setor. O orçamento para a educação em 2021 é apenas 70% do que foi gasto em 2015. O ensino superior é o mais atingido. A CAPES teve corte de 14% e gastará três vezes menos do que o montante gasto no ano de 2015. Falando nisso, a tesourada foi de 34% no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, justamente em um momento em que fica a necessidade de desenvolvimento de tecnologia e capacidade de inovação nacional ficou tão explícita.
Enquanto a destinação orçamentária para o reforço de recursos no combate à pandemia foi de apenas R$ 1 bilhão, a moeda de troca de Bolsonaro com o “centrão” fisiológico do Congresso Nacional – as emendas parlamentares – serão do montante de R$ 26 bilhões.