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Um ano após retirada, Washington continua torturando o Afeganistão

Segundo informes da ONU, ao menos metade da população do Afeganistão sofre de fome aguda. Ainda assim, Biden mantém fundos do país confiscados.
Segundo informes da ONU, ao menos metade da população do Afeganistão sofre de fome aguda. Ainda assim, Biden mantém fundos do país confiscados. Por Scott Scheffer | Struggle La Lucha – Tradução de Pedro Marin para a Revista Opera
(Foto: Jan Chipchase / Institute for Money, Technology and Financial Inclusion)

A ocupação dos EUA no Afeganistão chegou ao fim há um ano. Durante meses antes da retirada estadunidense, o exército nacional do Afeganistão esteve entregando suas armas ao Talibã. O processo foi transacional – o Talibã pagou aos soldados para que se retirassem. Objetivamente, no entanto, esse processo revelou que o regime fantoche dos EUA não contava com a lealdade de seu exército nem tinha o apoio da população afegã. A ocupação, de forma alguma, melhorou a vida do povo.

Mas a punição e tortura imperialista sobre o povo do Afeganistão não acabou após a caótica saída das tropas. O estrangulamento econômico simplesmente tomou o lugar de uma presença militar custosa e sem sentido.

A administração Biden confiscou 7 bilhões de dólares em fundos pertencentes ao banco central do Afeganistão que estavam em bancos britânicos. Seu governo já anunciou que metade dos fundos serão usados para compensar os familiares das vítimas dos ataques de 11 de setembro, e sua administração anunciou que não há planos para que o restante seja devolvido.

Durante os 20 anos de ocupação estadunidense, o Afeganistão dependeu de ajuda humanitária, e a pobreza se aprofundou. Sob a pressão imperialista, mesmo essa ajuda, que mal mantinha o governo funcionando, acabou.

O progresso sabotado pelos EUA

Houve um momento na história em que o Afeganistão avançava. A Revolução de Saur de 1978, que levou os socialistas à liderança do país foi a expressão de um crescente sentimento entre a juventude e os estudantes de Cabul e outras cidades a favor do socialismo.

O Partido Democrático do Povo do Afeganistão (PDPA) tomou o poder com o apoio substancial de parte dos militares afegãos. Imediatamente, eles começaram a trabalhar pela eliminação das dívida humilhante dos trabalhadores agrícolas para com os senhores feudais e pela promoção dos direitos das mulheres e dos trabalhadores, além de outras iniciativas progressistas.

 Leia mais – Afeganistão: o relógio e o tempo 

A Operação Ciclone, da CIA, foi a responsável por barrar essas tentativas de progresso. A agência de inteligência criou o exército mercenário mujahidin com os elementos mais reacionários e fundamentalistas da região, visando derrubar a Revolução de abril. Depois, nos anos 1990, o Talibã emergiu dentre as forças mujahidin que dominaram o Afeganistão.

Desde que a Operação Ciclone foi lançada em 1979, até a saída das tropas mercenárias, dos EUA e da OTAN no ano passado, a guerra direta, a sabotagem e a pressão econômica impediram que qualquer ressurgência dos ideais da Revolução de Saur se efetivasse.

O desespero se impôs sobre a esperança de 1978. As consequências para o povo do Afeganistão foram imensas.

Oficialmente, ao menos 71.334 civis e cerca de 70 mil policiais e militares afegãos foram mortos diretamente pela guerra de 20 anos iniciada após o 11 de setembro. Cerca de 7,5 mil soldados norte-americanos, tropas da OTAN e mercenários morreram. Mais de 50 mil soldados do Talibã foram mortos. Cerca de 500 jornalistas e trabalhadores também pereceram.

Hoje, depois de anos de guerra e ocupação e após o roubo dos fundos governamentais após a saída das tropas, o país está em ruínas. De acordo com um relatório das Nações Unidas publicado em maio, ao menos metade da população afegã sofre de fome aguda, e dezenas de milhares na província de Ghowr, no nordeste do país, estão “enfrentando níveis catastróficos de fome”.

A guerra econômica foi exacerbada por um longo período de seca que destruiu a atividade agrícola existente. Muitas pessoas no Afeganistão recorreram à venda de seus órgãos para sobreviver.

A execução de Al-Zawahiri

A retirada de tropas ordenada pelo governo Biden provocou uivos de condenação de todos os lados. Enquanto as tropas dos EUA faziam uma retirada apressada, milhares de pessoas lotavam o aeroporto. Muitos deles haviam colaborado com a ocupação norte-americano. Alguns tinham sido contratados como mercenários. Mas outros estavam simplesmente tentando encontrar desesperadamente uma oportunidade para escapar da profunda pobreza. Em meio ao caos, um bombardeio suicida matou cerca de 200 pessoas, incluindo 13 tropas estadunidenses.

Oponentes de direita e a grande imprensa burguesa atacaram a administração Biden. Entre as muitas traições às promessas de campanha e uma miríade de falhas, a retirada do Afeganistão contribuiu para aumentar a impopularidade do governo.

A administração Biden usou a presença de Ayman Al-Zawahiri (o suposto líder da Al-Qaeda no Afeganistão) em um esconderijo em Cabul como prova de que o governo Talibã não tinha cumprido os compromissos de não “abrigar terroristas” no país – parte dos acordos de Doha.

Forças da inteligência norte-americana (atualmente realizando regularmente operações militares) executaram Al-Zawahiri no último 31 de julho. A suposta violação dos acordos de Doha é a forma com a qual a administração Biden justifica o anúncio recente de que não liberará os fundos do governo afegão que foram confiscados, apesar do país viver uma situação de fome generalizada.

 Leia mais – Sanções de Biden ao Afeganistão ameaçam matar mais civis que 20 anos de guerra 

A CNN informou, no entanto, que uma avaliação da inteligência norte-americana após a execução concluiu que a Al-Qaeda “não reconstituiu sua presença no Afeganistão” desde que as tropas dos EUA saíram do país em agosto do ano passado.

A Al-Qaeda serviu muitas vezes como uma força proxy do Pentágono na Síria e no oeste da Ásia. A execução de Al-Zawahiri não foi nada mais que uma manobra cínica da administração Biden para justificar a continuada dominação sobre o Afeganistão, para atenuar as críticas sobre a retirada e para tentar estabelecer alguma credibilidade entre os mais vociferantes guerristas e direitistas dentro dos EUA.

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