Pesquisar

Frei Betto: revolução das consciências

A democracia precisa ser libertada de seus vícios conservadores e emancipada da apropriação burguesa, o que implica regulação das redes e ampla educação política
Frei Betto
Ato “Ditadura Nunca Mais” em 1 de abril de 2023, em São Paulo. (Foto: Pedro Marin/ Revista Opera)

A Unesco aprovou, em 1976, o Informe MacBride, elaborado por Sean MacBride, Prêmio Nobel da Paz e Prêmio Lênin da Paz, sobre o direito de todos os povos participarem equitativamente dos meios de informação e comunicação. Marshall McLuhan e Gabriel García Márquez o aplaudiram; Ronald Reagan vaiou…

O Informe adverte sobre os perigos da monopolização midiática, o poder de alguns veículos de impor um modo de pensar, agir, consumir e divertir-se. Como alerta Fernando Buen Abad, tais veículos são verdadeiras usinas de políticos e governos. 

“O velho mundo morre. O novo demora a nascer” (Gramsci). Hoje, as plataformas digitais são verdadeiras Hidras, os monstros de sete cabeças. E ainda não apareceu um Hércules que possa matá-la. Em minha opinião, as plataformas só deixarão de disseminar seu veneno no dia em que houver uma regulação internacional sob controle do poder público. Enquanto elas detiverem o monopólio privado de manipular informações, a democracia estará severamente ameaçada pelo surgimento de figuras histriônicas e perversas como Bolsonaro, Milei e Bukele, para ficar apenas em exemplos latino-americanos.

Os governos progressistas raciocinam, em geral, pela lógica do sistema. Centram suas pautas no desenvolvimentismo, como investimentos em infraestrutura, o que amplia os postos de trabalho e melhora as condições de vida da população. Priorizam também o combate à inflação, o aumento dos salários, e o acesso à alimentação, saúde e educação.

Tudo isso é positivo, mas não suficiente. É preciso algo mais: a revolução das consciências. Sem isso não se forma uma cultura democrática, de respeito aos direitos humanos, à diversidade, e de cuidado do meio ambiente.

A democracia precisa ser libertada de seus vícios conservadores e emancipada da apropriação burguesa. Não pode perdurar como mero jogo de aparências, refém, de fato, do capital financeiro, ou seja, da minoria rica e poderosa da sociedade. Faz-se imprescindível um trabalho educativo que forme consciência crítica e desperte a sensibilidade indignada frente à opressão, à discriminação e à violência. 

A comunicação é, hoje, uma questão de saúde pública. Não se pode admitir que os interesses do mercado estejam acima dos direitos da coletividade. E não é com fraseologia de esquerda que vamos politizar o povo. É com método pedagógico e educação crítica. Eis a única forma eficiente de combater as armas de guerra ideológica do neoliberalismo. 

(*) Frei Betto é escritor, autor de “Por uma educação crítica e participativa” (Rocco), entre outros livros. Livraria virtual: freibetto.org

Revista Opera A Revista Opera é um veículo popular, contra-hegemônico e independente fundado em abril de 2012.

Continue lendo

equador
Equador: é possível vencer uma eleição sendo um inútil?
braga netto
Com Braga Netto preso, intervenção do Rio também deveria ser investigada
siria
Israel impõe um 'fait accompli' à Síria para condicionar a transição de acordo com seus interesses

Leia também

sao paulo
Eleições em São Paulo: o xadrez e o carteado
rsz_pablo-marcal
Pablo Marçal: não se deve subestimar o candidato coach
1-CAPA
Dando de comer: como a China venceu a miséria e eleva o padrão de vida dos pobres
rsz_escrita
No papel: o futuro da escrita à mão na educação
bolivia
Bolívia e o golpismo como espetáculo
rsz_1jodi_dean
Jodi Dean: “a Palestina é o cerne da luta contra o imperialismo em todo o mundo”
forcas armadas
As Forças Armadas contra o Brasil negro [parte 1]
PT
O esforço de Lula é inútil: o sonho das classes dominantes é destruir o PT
ratzel_geopolitica
Ratzel e o embrião da geopolítica: os anos iniciais
almir guineto
78 anos de Almir Guineto, rei e herói do pagode popular