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Caminhoneiros: exército na jogada, Temer na encruzilhada

Mais uma vez Temer vai passar uma grande responsabilidade para as Forças Armadas. Se elas não ganharem poderes especiais para isso, ainda assim terão aumentando sua participação política e seu capital frente o executivo.
Brasília – O presidente Michel Temer participa da assinatura de contratos do Programa Saneamento para Todos (Sanepar) (Antônio Cruz/Agência Brasil)

Vamos lá, rápido exercício de pensamento estratégico nessa questão dos caminhoneiros – tão logo os acontecimentos se movimentarão mais rápido do que nossas reflexões.

Temer quis rebaixar o movimento dos caminhoneiros ignorando-os, tratando o movimento de maneira trivial, sem gravidade ou sem dar um caráter decisivo.

O problema é o movimento nos levou a uma situação de paralisação nacional e crise de abastecimento. Michel Temer evitou fazer um grande teatro, não foi a televisão como muitos reclamaram pelo fato de ser o esperto suficiente para não aprofundar a politização colocando a sua cara de presidente mais rejeitado da história em rede nacional: as pessoas iriam personalizar mais claramente a culpa e canalizar mais ainda suas frustrações nesse movimento.

Decidiu “negociar” com “lideranças do movimento”, pelo menos uma parte delas compreendida não só por interesses empresariais um pouco distantes de quem está no chão da rodovia, mas por elementos cuja própria vida político-sindical é questionável (lembrem-se do termo “peleguismo”).

Para todos os efeitos, as “lideranças” parecem não ter muito reconhecimento na categoria.

E como foi a “negociação”? Temer não demonstrou força e quer negociar como se estivesse lidando com intrigas do blocão parlamentar. Não exigiu liberação de rodovias antes de negociar e não fez nenhuma demonstração de força anterior (talvez contando risco político).

O que ele fez foi receber lideranças um tanto aleatórias do Palácio do Planalto, mostrou uma lista de concessões (mais o que aconteceu no congresso) e pediu, com essas palavras, “uma trégua”.

No campo da política de petróleo, é óbvio que ele não quis recuar para a política que ele ajudou a liquidar (comprometida com o controle de preços), porém tomou meias medidas que de toda maneira desagradam o mercado de acionistas e financistas que ele quer servir, afetando a posição do presidente tucano da Petrobras, Pedro Parente – o preço foi congelado temporariamente.

Demitir Pedro Parente, fazer um expurgo para caminhoneiro ver, mostrar algum serviço? Nada disso, Temer tenta conciliar e usar métodos que parecem não responder tão bem a uma situação de “caos social” que beira ao desabastecimento.

Ofereceu medidas de redução de taxas, subsídio, buscou agradar patrões (incluindo retirada de imposto que alimenta a previdência) e ofereceu algo para os autônomos (a exemplo das taxas de pedágio). A temática girou entorno do diesel, não da gasolina que afeta camadas mais amplas de consumidores.

A demonstração de fraqueza e pedido de trégua não serviram. Os caminhoneiros não só continuam fechando rodovias apesar de certas “lideranças”, como parece que o movimento aumentou.

E qual é a resposta de Temer agora?

Apelar para a força e chamar o exército.

Tudo faz parte do jogo do poder, tudo está sujeito a física do poder.

Mais uma vez Temer vai passar uma grande responsabilidade para as Forças Armadas. Se elas não ganharem poderes especiais para isso, ainda assim terão aumentando sua participação política e seu capital frente o executivo.

Ao mesmo tempo, podem perder alguma credibilidade com o povo: mas o que vai acontecer?

Já receberam o pepino de cuidar de uma intervenção federal no Rio, a despeito de suas posições e para atender os desígnios de propaganda do presidente.

Os comandantes e soldados vão atender a ordem do executivo? Vilas Boas já chamou a mobilização geral das forças armadas – já existem jornalistas e polemistas de direita defendendo a repressão (valendo o grande exemplo de Silas Malafaia).

Não parece impossível, mas tão pouco parece fácil chegarmos em uma situação de desobediência militar generalizada contra o Presidente da República (o que culminaria em uma renúncia).

Fala-se de um decreto que permitirá que os soldados retirem os caminhões das vias. Isso já responde uma pergunta. Mas vão prender os caminhoneiros? Vão interditar os caminhões? E quem vai assumir o transporte de toda maneira?

Isso não vai ampliar a greve? Quem vai transportar o combustível?

Qual será efetivo? Serão caminhões e mais caminhões com soldados? Tanques?

Temer continua com a mesma falta de inteligência política que demonstrou na negociação – falar de repressão total agora não é “correr atrás do prejuízo”, é uma aposta perigosa de um presidente fraco e encurralado, que foi pego de surpresa.

Usar força física aqui está longe de ser uma solução. Temer não ficou forte de repente: é um presidente fraco apelando para o exército. Sempre há perigo quando um presidente fraco quer ser salvo pelo exército em uma situação de comoção social.

Uma resposta possível para “quem vai transportar?” é: o exército. O exército vai assumir uma infraestrutura excepcional de emergência para recuperar em parte o abastecimento. Isso significa assumir poderes excepcionais para garantir uma eficiência logística.

Por mais custoso que isso seja, além de crítico do ponto de vista político, parece até mais provável do que a repressão assumir uma postura completamente terrorista contra os manifestantes caminhoneiros.

A situação não está boa para o governo Temer. Logo depois das semanas de propaganda do governo com slogans de transformação e recuperação, o castelo de cartas desaba e a administração se vê obrigada a se mexer contra sua vontade.

Tudo isso custa dinheiro. Mover o exército custa dinheiro. Tentar pagar gente para desmobilizar a greve ou recuperar uma parte dos transportes também custará. Fazer concessões fiscais (concessões que outros setores empresariais tentaram exigir também no início do movimento) é sangrar a União, é sabotar todo o projeto desse governo até então e tornar ainda mais impossível o cumprimento da PEC do limite dos gastos no ano de 2019.

Mais uma vez o exército cumpre uma função eminentemente política e aumenta o seu papel no cenário nacional, como a Revista Opera vem descrevendo já faz pelo menos três anos.

Realmente, nada sai de graça – tudo tem uma contrapartida.

Temer tem dificuldade em ser raposa e mal consegue se afirmar como leão. Temer é fraco e a aliança de grupos sociais que os sustentava está mais rasgada do que nunca.

Precisamos de clareza e de decisão, não de ratos oportunistas rastejando pela própria sobrevivência.

Nota: até agora nada de excepcional, só caminhões transportando combustível recebendo escolta.

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