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Um México ainda distante de Deus

Como o jornal guatemalteco El Siglo o definiu; o novo presidente do México "está mais perto de Lula, e menos de Hugo Chávez."

por Pedro Marin | Revista Opera
(Foto: ProtoplasmaKid)

Andrés Manuel López Obrador venceu as eleições mexicanas deste domingo (1) com cerca de 53% dos votos.

Criador do partido Movimento de Regeneração Nacional (MORENA), López Obrador foi eleito pela coalizão “Juntos Faremos História”, fruto de uma aliança com o Partido do Trabalho (PT), de esquerda, e o Partido Encontro Social (PES), de centro-direita e com forte ligação com os evangélicos. Prometendo “governar para os pobres e indígenas” e “acabar com a máfia do poder”, o presidente focou o tema da corrupção em sua campanha, mote central em um México que se afunda há décadas em relações suspeitas entre o narcotráfico e políticos, tendo em escala federal um forte aliado: a alternância de poder entre o Partido Revolucionário Institucional (PRI) e o Partido da Ação Nacional (PAN), que já dura ao menos sete décadas.

Com as últimas eleições, a alternância chega a seu fim – mas terá López Obrador condições de cumprir a responsabilidade histórica da qual se disse “muito consciente” em seu discurso de vitória?

Tudo indica que não – e como se não bastasse tudo, o candidato também o indica. No mesmo discurso de vitória, o novo presidente mexicano prometeu “manter a disciplina financeira e fiscal” no país, assegurando a autonomia do Banco do México e dizendo que “serão reconhecidos os compromissos firmados com empresas nacionais e estrangeiras.” É verdade que o candidato prometeu também rever as concessões do setor energético, em especial os da Pemex (Petróleos Mexicanos – estatal de petróleo mexicano que perdeu o monopólio de exploração durante o último governo), mas sua promessa de analisar “contrato por contrato” tem o fim de “prevenir práticas de corrupção e irregularidade”, não necessariamente de retomar a produção para o Estado. Como o jornal guatemalteco El Siglo o definiu; “está mais perto de Lula, e menos de Hugo Chávez.”

Guardadas as devidas proporções (Obrador deve ser menos Lula que Lula), a comparação parece acertada. Já há a promessa de uma “Carta ao Povo Mexicano”, dirigida ao mercado financeiro – e de acordo com fontes do Morena, até mesmo conferências entre assessores do partido e investidores de Wall Street estão em pauta para acalmar os ânimos dos empresários.

As promessas referentes à gratuidade da educação, diminuição de salários no governo e concessão de bolsas a estudantes de fato podem sair do papel – mas terão pouco efeito real na economia, e portanto efeitos políticos fugazes. Por outro lado, a proposta de convocar um plebiscito referente à anistia para os cartéis do narcotráfico, se concretizada, terá um impacto profundo no país, independente de seu resultado: o respaldo à anistia catapultará os cartéis para a negociação, a rejeição à anistia abrirá caminho para uma política dura de combate. De qualquer maneira, insisto: sem mudanças econômicas, os avanços serão fugazes. Sob López Obrador o México, tão perto dos Estados Unidos, deve seguir distante de Deus.

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