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Os planos da China para um crescimento verde

O progresso feito pela China no combate à poluição nos últimos anos também é considerado internacionalmente como impressionante.
por John Ross | Learning from China – Tradução de Gabriel Deslandes para a Revista Opera

“O desenvolvimento centrado nas pessoas”, incluindo ênfase especial no “crescimento verde”, é um tema central deste ano do Congresso Nacional do Povo (CNP) – órgão legislativo da China. O foco do CNP, juntamente com a Conferência Consultiva Política do Povo Chinês (CCPPC) – realizados simultaneamente – é sempre primordialmente doméstico. Entretanto, a agenda doméstica da China necessariamente impacta suas relações internacionais. Esse impacto internacional, por sua vez, afeta reciprocamente a própria China – é importante para os chineses que os demais países não sejam protecionistas, que sigam políticas congruentes com a China em problemas que somente podem ser resolvidos internacionalmente, etc.

As políticas-chave das “duas sessões” deste ano terão particularmente um grande impacto devido à atual conjuntura internacional – que vê uma desaceleração nas economias ocidentais, aumento da preocupação em países ocidentais quanto à pobreza e desigualdade social e aumento da ansiedade internacional e agitação pública com relação às mudanças climáticas. O crescimento econômico chinês, suas políticas sobre a pobreza e sobre o meio ambiente em geral e as mudanças climáticas em particular terão, portanto, impacto mundial. Isso corresponde a uma realidade em que a China, em correlação com sua meta de crescimento e sua redução da pobreza, tem estabelecido propostas de destaque internacional para lidar com tais questões ambientais. Nesse contexto, este artigo analisa essa inter-relação entre as prioridades internas da China e as tendências globais.

Para evitar a sugestão de usar fontes excessivamente favoráveis ao Estado chinês, todos os dados econômicos usados ​​aqui, salvo indicação em contrário, não foram retirados da China, mas do FMI. Os dados para 2019 são projeções e, caso fossem pequenas as diferenças que eles mostram entre a China e os outros países, tais números não poderiam inspirar confiança. Todavia, como se verá, as diferenças não são pequenas, e a superioridade do desempenho chinês em relação ao das economias ocidentais é extremamente elevado – portanto, durante 2019, pequenas variações do desempenho econômico das projeções do FMI não afetarão a situação fundamental.

Por razões analisadas em meu livro Não entenda mal a economia chinesa (tradução livre), enquanto no passado as projeções do FMI para as economias ocidentais eram bastante otimistas, as atuais são, em geral, realistas – com uma exceção importante mencionada abaixo.

Taxa de crescimento da China

A China estabeleceu sua meta de crescimento econômico para 2019 em 6,0% a 6,5%. Para entender o impacto global disso, é necessário fazer uma comparação internacional entre as três maiores economias do mundo – os EUA, a China e a União Europeia. Espera-se que a China cresça este ano aproximadamente 2,5 vezes mais rápido que os EUA e mais de três vezes mais rápido que a União Europeia.

A performance da China é de particular importância, pois será definida no contexto de uma desaceleração geral das economias ocidentais. O FMI, em sua última previsão em janeiro, projeta que o crescimento dessas economias avançadas como um todo cairá de 2,3% em 2018 para 2,0% em 2019. Nos EUA, diminuirá de 2,9% para 2,5% e, na Zona do Euro, será de 1,8% a 1,6%.

Mesmo se a projeção do FMI sobre o crescimento da China de 6,2% estiver correta – número que corresponde à projeção mais baixa da meta do governo chinês –, isso significa que o FMI projeta não só que a China cresça 2,5 vezes mais rápido os EUA, mas também que a desaceleração econômica americana será mais grave em termos relativos do que na China. Em comparação com este ano, a economia dos EUA diminuiria de 2,9% para 2,5%, ou 14% da cifra anterior, enquanto a China diminuiria de 6,6% para 6,2%, ou seja, apenas 6% em relação à cifra anterior.

Meta de crescimento da China

Essas tendências internacionais comparativas podem ser vistas com maior clareza se forem consideradas em termos per capita. O crescimento da população chinesa é mais lento de que de outras grandes economias – a população chinesa cresceu 0,5% em 2018, em comparação com 0,7% nos EUA e 1,3% na Índia. Portanto, uma parte do crescimento do PIB total dos EUA e da Índia, em comparação com a China, deve-se simplesmente ao crescimento populacional mais veloz. Porém, o aumento no bem-estar da população de qualquer país é determinado não pelo PIB total, mas pelo PIB per capita.

Mesmo se aceitarmos os números oficiais de crescimento da Índia – o que muitos especialistas até mesmo indianos não fariam –, então, em termos de PIB per capita, tal qual mostrado na Figura 1, o crescimento da China em 2018 foi o mais rápido entre quaisquer grandes economias – 6,1% comparado a 5,9% da Índia e, considerando as economias ocidentais, muito mais rápido que os 2,4% dos EUA, 1,8% da Alemanha e 1,4% do Japão.

Fazendo uma comparação com as principais economias em 2019, o FMI prevê que o crescimento do PIB per capita da China será de 5,7%, comparado a 1,9% nos EUA e, na União Europeia, 1,8% na Alemanha e 1,3% no Japão. Isso significa que o crescimento do PIB per capita chinês será:

  • Três vezes maior que dos EUA;
  • Três vezes maior que da União Europeia, e mais de três vezes maior que da Alemanha;
  • Mais de quatro vezes maior que do Japão.

Em resumo, as conclusões disso são evidentes:

  • Primeiro, mesmo no nível do crescimento total do PIB, a tentativa de setores da mídia ocidental de afirmar que a economia chinesa está em “crise profunda” é pura bobagem – a economia chinesa crescerá com mais rapidez que a americana e a europeia.
  • Segundo, o contraste em termos per capita é ainda maior – a China crescerá três vezes mais rápido que os EUA ou a União Europeia.
  • Terceiro, como a mídia ocidental está atualmente repleta de falsa propaganda a respeito da “desaceleração severa” e da “crise profunda” da economia chinesa, a desaceleração das economias ocidentais, que já recebe cada vez mais atenção, proporcionará uma oportunidade bastante favorável para demonstrar mais uma vez a falsidade das alegações sobre a China.

Finalmente, para explicar essa situação internacionalmente, é provável que seja bem mais útil e objetivamente correto que a China enfatize suas tendências per capita, bem como as tendências totais do PIB – além do fato de que, por ser significativamente mais lento do que outras grandes economias, o crescimento populacional chinês esconde alguns dos verdadeiros contrastes internacionais em termos de desenvolvimento.

Contribuições para o crescimento mundial

Do ponto de vista do padrão de vida da população chinesa, o desenvolvimento per capita é mais importante. Entretanto, do ponto de vista do comércio e investimento de outros países e, portanto, seu interesse objetivo na interação com a China, é o tamanho total da economia e do crescimento chinês que é decisivo. A fim de avaliar o impacto internacional das decisões da CNP, é necessário analisar a contribuição projetada da China para o crescimento mundial em comparação com outros países.

Calculado em termos de paridade do poder de compra (PPC), que reflete o aumento real no número de vendas de bens e serviços, o FMI projeta que a China representará 27,2% do crescimento mundial em 2019 em comparação com 12,3% dos EUA e 11,8% da União Europeia. Ou seja, a contribuição da China para o crescimento mundial nesses termos será mais que o dobro dos EUA e da UE. Isso é, obviamente, vital para empresas que pretendem vender para o mercado chinês.

Os cálculos nas taxas de câmbio atuais pelo FMI não são claros, pois, por razões que não se justificam, o FMI faz uma suposição extremamente estranha para 2019 de que o renminbi passará por uma desvalorização significativa em relação ao dólar. Para ser preciso, enquanto o PIB da China em termos de preços constantes aumentará 6,2% e nos atuais preços do renminbi aumentará 8,6%, o FMI projeta que em dólares atuais o PIB da China aumentará apenas 5,3% – algo que só poderia ser explicado por uma desvalorização significativa do renminbi. Essa projeção cambial não está alinhada com as tendências atuais nem com os relatórios do acordo de câmbio praticado entre a China e os EUA nas atuais negociações comerciais.

No entanto, isso parece ser uma anomalia para 2019, na qual o FMI estima que, no decorrer do período de cinco anos (2018-2023), a taxa de câmbio chinesa responderá por 26% do crescimento mundial e os EUA e a União Europeia responderão por 17 %. Isso ocorre no próximo período porque a contribuição total da China para o crescimento mundial, com as taxas de câmbio atuais, será mais de 50% maior que a dos EUA ou da UE.

Em resumo, em termos de vendas no próximo período, a economia da China, mesmo sob as taxas de câmbio atuais, crescerá mais de 50% mais rapidamente – fornecendo uma base firme para atrair outros países a aumentarem a interação econômica com os chineses.

Crescimento total do PIB não é o objetivo

Todavia, embora seja significativo observar as taxas de crescimento projetadas, a China enfatizou, com razão, que o crescimento do PIB não pode, por si só, ser o objetivo da política. A meta correta é o “desenvolvimento centrado nas pessoas”, que consiste na melhoria das condições gerais de vida de seu povo – inclusive em relação a problemas que, por sua própria natureza, só podem ser resolvidos internacionalmente.

A China lidera globalmente, em termos de velocidade, a melhora nos padrões de vida de sua população e a redução da pobreza, que, nos últimos 40 anos, tem sido de longe a mais rápida entre as grandes economias – desde 1978, a China respondeu por quase 3/4 da queda do número de pessoas que vivem em condições de pobreza, segundo o Banco Mundial. A promessa da China de eliminar totalmente a pobreza absoluta até 2020, repetida no CNP deste ano, continua sendo uma meta inspiradora para toda a humanidade.

Essas questões também ilustram a ligação entre o desenvolvimento econômico e o bem-estar humano – o crescimento do PIB per capita não é apenas uma questão de “concreto e aço”, ou seja, a produção física. Os economistas sabem que a expectativa média de vida é o melhor indicador das condições gerais de vida humana, pois resume em uma única figura positiva (redução da pobreza, educação, boa saúde, proteção ambiental) e negativa (pobreza, falta de saúde, falta de educação, danos ambientais). Internacionalmente, mais de 70% das diferenças na expectativa de vida entre os países são explicadas por diferenças no PIB per capita.

No que diz respeito à China, sua expectativa de vida continuou a aumentar de forma constante – um indicador da melhoria global das condições sociais, bem como do sucesso na redução da pobreza. Trata-se de uma tendência extremamente preocupante que nos EUA a expectativa de vida esteja caindo há três anos e, no Reino Unido, ela também tenha começado a declinar – tal situação inexistia nesses países há décadas. Isso claramente só pode refletir uma deterioração da situação social que, por sua vez, está subjacente ao elevado conflito social e político existente nesses Estados – a turbulência política continua a cercar o governo Trump, a decisão economicamente irracional do Brexit no Reino Unido etc.

Algumas pessoas no Ocidente argumentam agora que as mudanças na distribuição de renda nas economias avançadas – particularmente nos EUA e no Reino Unido, onde há extrema desigualdade – poderiam garantir o máximo progresso social, mesmo sem crescimento econômico. Todavia, seja qual for a posição tomada no Ocidente, em países em desenvolvimento como a China, isso é impossível. O desenvolvimento contínuo do PIB per capita, no âmbito do “desenvolvimento centrado nas pessoas”, é portanto vital para o bem-estar da população chinesa, e sua meta de crescimento mantém essa posição.

Os métodos chineses de redução da pobreza são diretamente importantes nos países em desenvolvimento, mas mesmo nas economias avançadas, com um PIB per capita mais alto, a diferença de métodos usados ​​pela China em diferentes estágios de desenvolvimento para eliminar a pobreza é interessante – e provavelmente ganhará apoio generalizado.

Para tirar mais de 800 milhões de pessoas das condições de pobreza definidas pelo Banco Mundial, como a China fez a partir de 1978, o país dependia necessariamente do crescimento econômico global – nenhuma medida específica teria sido suficientemente poderosa. Porém, mesmo com o crescimento econômico, as últimas dezenas de milhões de pessoas que vivem em absoluta pobreza na China poderiam ter permanecido lá, pois estão em partes muito inacessíveis do país ou por outras razões. Portanto, para o sucesso final na eliminação da pobreza, a China deve confiar em medidas direcionadas, que exigem uma política de Estado conscientemente dirigida conforme estabelecida pelo CNP.

As realizações da China na redução da pobreza são tão avassaladoras diante do resto do mundo que essa deve ser uma parte central de sua imagem pública e apresentação – no Ocidente até os políticos anti-China são forçados a elogiar a China por seu sucesso sem precedentes nesse quesito.

Civilização ecológica

Acontece que, além das lutas imediatas para elevar os padrões de vida, fornecer proteção social, estender os cuidados de saúde e eliminar a pobreza, o “desenvolvimento centrado nas pessoas” no mundo atual também deve incluir centralmente a luta contra a degradação ambiental e contra a mudança climática. Este último, em particular, é uma ameaça literalmente mortal a todo o futuro da humanidade. Essas metas requerem a construção de uma “civilização ecológica”, como afirmou o presidente Xi Jinping.

Os efeitos da mudança climática global já são claros. O mundo já está vendo temperaturas recordes, ondas de calor extremas, tempestades, inundações e incêndios florestais deixando um rastro de morte e devastação, e essa situação se tornará progressivamente pior à medida que as temperaturas globais sobem. Como disse Antonio Guterres, da ONU, os cientistas alertaram sobre o aquecimento global por décadas, mas “muitos líderes se recusaram a ouvir, e muito poucos agiram com a visão que a ciência exige”.

Essa ameaça extremamente perigosa para toda a humanidade está sendo cada vez mais refletida internacionalmente por uma geração de movimentos sociais e políticos. Nos EUA, o reconhecimento do perigo da mudança climática é extremamente difundido entre os que se preocupam com essa questão, desde multimilionários como o ex-prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, passando por estados inteiros como a Califórnia, até o Green New Deal, apresentado por muitas figuras políticas que apelam a uma ação concertada sobre as alterações climáticas e contam com um apoio popular generalizado.

Os jovens, que enfrentarão as piores consequências da mudança climática durante suas vidas, começaram a se tornar cada vez mais ativos – na Europa, há um movimento internacional de greves escolares contra a mudança climática. Líderes das Ilhas do Pacífico chamaram essa ameaça literalmente de genocídio – seus países desaparecerão fisicamente sob a elevação do nível do mar se uma ação não for tomada.

A luta eficaz contra as alterações climáticas exige políticas corretas e enormes capacidades tecnológicas e industriais, e a situação objetiva é a de que só a China conta com ambas. A ênfase na “civilização ecológica” pelo CNP, por conseguinte, é particularmente importante, dado que o governo Trump continua infelizmente a minar o Acordo Climático de Paris e deixou claro que os EUA vão se retirar quando as regras permitirem ao presidente Trump fazê-lo em 2020.

As decisões do CNP vão exatamente na direção oposta às lamentáveis e profundamente irresponsáveis ​​políticas americanas. São, portanto, do interesse do povo chinês e estão de acordo com a maioria da população do país e uma parcela crescente da opinião pública internacional. Mais especificamente, em um objetivo-chave, o relatório de trabalho prevê que o consumo de energia da China por unidade do PIB continue a cair cerca de 3% em 2019. Em relação às principais formas de poluição ambiental, as emissões de dióxido de enxofre e de óxido de nitrogênio cairão 3%, e a concentração de material particulado fino (PM 2.5) continuará a diminuir em regiões-chave do país. A demanda química de oxigênio e as emissões de nitrogênio amoniacal neste ano cairão 2%.

O progresso feito pela China no combate à poluição nos últimos anos também é considerado internacionalmente como impressionante. Há alguns anos, como foi reconhecido não só na China, mas mundialmente, as principais cidades chinesas tinham sérios problemas com a poluição do ar, sendo Pequim o caso mais comentado. Acontece que, em 2018, como até Ian Bremmer, chefe do Eurasia Group (principal empresa de avaliação de riscos do Ocidente) e um severo crítico da China observou, Pequim não está mais entre as 100 cidades mais poluídas dos países em desenvolvimento – lamentavelmente sete das dez cidades mais poluídas estão agora na Índia.

Isso não é de todo para subestimar o quanto ainda há muito a ser feito na luta contra as mudanças climáticas e no combate à poluição, mas a China está fazendo uma mudança decisiva em direção a políticas ambientalmente favoráveis, enquanto outros países, especialmente os EUA, estão se retirando delas. Além disso, a China está tendo sucesso mensurável, e isso necessariamente impactará a opinião pública internacional.

Convergência com forças internacionais

Na questão da mudança climática, as políticas da China estão objetivamente alinhadas com uma gama extremamente ampla de forças globais, variando de bilionários a crianças em idade escolar, sobre aquilo que um número crescente de pessoas no Ocidente considera a questão mais importante que a humanidade enfrenta. Esse ambiente cria possibilidades importantes para os chineses criarem alianças com grupos bastante amplos – até mesmo alguns que são normalmente hostis à China, mas que consideram essas diferenças menos importantes do que lidar com o que consideram uma ameaça fundamental à humanidade.

O contexto para isso é que os diálogos climáticos internacionais de 2020 devem concordar com novos compromissos nacionais consistentes para limitar a elevação da temperatura média global “bem abaixo de 2ºC”. É dada maior ênfase à recente conclusão do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC) de que a única meta científica para combater a crise climática é restringir o aquecimento global em até 1,5ºC em relação à média do período pré-industrial – embora isso não seja ainda aceito oficialmente como uma meta internacional.

No geral, enquanto a força nacional da China está crescendo, ela ainda não pode desempenhar um papel de liderança em questões globais – visões como a de que a força nacional chinesa já é equivalente à dos EUA são incorretas, e as visões de que o dólar pode ser substituído como principal moeda global em um período de curto/médio prazo também são irrealistas. Porém, à medida que a abrangente força da China aumentar, ela será capaz de assumir um papel internacional importante em determinadas questões. A mudança climática é uma delas – a maioria dos países em desenvolvimento gostaria que os chineses desempenhassem tal papel e talvez seja possível para a China chegar a um acordo com a União Europeia, deixando o atual governo dos EUA relativamente isolado nessa questão.

Especialistas ocidentais observam que a China já está à frente de sua meta de atingir o pico de emissões até 2030 – estimativas ocidentais recentes indicam que isso será alcançado em 2025 ou mesmo um pouco antes. Curiosamente, a data prevista necessária para atingir uma meta global de 1,5ºC é apenas um pouco mais cedo – em 2022.

Para ocupar áreas específicas, a China já é de longe a líder mundial em veículos elétricos para transporte público. Shenzhen é a primeira cidade do mundo a ter uma frota de ônibus 100% elétrica, e isso é extremamente grande – quase 16 mil veículos. As próximas nove cidades do top 10 mundial de ônibus elétricos também estão na China e contam com milhares de veículos. Para mostrar a escala da liderança chinesa, as próximas cidades mais bem posicionadas do mundo no ranking, depois da China, são Londres e Santiago, no Chile, com cerca de 200 veículos cada. A China também é de longe a líder mundial em aluguel de bicicletas urbanas.

Da mesma forma, o Grupo C40 de Grandes Cidades para a Liderança Climática, que reúne 90 cidades líderes internacionais, representando mais de 650 milhões de pessoas e incluindo 1/4 da economia global, pede a todas as suas cidades que se comprometam com que todos os seus novos edifícios sejam de zero uso de carbono até 2030. A China pode tecnicamente alcançar esse objetivo.

Há inúmeras questões “quentes” a serem consideradas nas próximas discussões internacionais sobre mudanças climáticas – sobre as quais um diálogo estritamente objetivo é crucial. Por exemplo, as emissões da própria geração de eletricidade movida a carvão na China não aumentaram – subiram só 1% no ano passado, mas especialistas ocidentais pró-China, que são fortes defensores da Iniciativa Um Cinturão, uma Estrada, estão preocupados com o efeito de novas centrais de carvão que fazem parte da iniciativa.

Por outro lado, há 20 anos atrás, sob Clinton e Al Gore, os EUA forçaram a ONU a adotar um método de medição das emissões climáticas que favorece países ocidentais – medindo as emissões no ponto de produção dentro de um limite estatal (então as emissões de um país são calculadas a partir da adição de poluição de centrais eléctricas, emissões de veículos etc.). Uma medida mais precisa consiste no cálculo baseado no que é consumido dentro de um país e seguindo as emissões de volta na cadeia de suprimentos (observando os materiais que compõem uma máquina de lavar e como eles foram produzidos, o que é usado para alimentar os porcos que são transformados em bacon, o processo de fabricação de roupas e como elas são transportados para o ponto de venda a retalho etc.). Este último é mais preciso ao atribuir responsabilidade real por emissões e mudanças climáticas. As emissões medidas nos EUA aumentariam em, no mínimo, 20%, ou provavelmente mais, se tal metodologia de consumo fosse usada – enquanto as da China cairiam substancialmente. Esta seria, obviamente, uma mudança boa, mas radical.

Negociações sérias, portanto, estão à frente, nas quais fatores econômicos e ambientais devem ser considerados, mas o que está claro é que a China já ocupa a liderança entre os maiores Estados que lidam com a mudança climática, e isso é cada vez mais reconhecido por outros países e organizações ambientais internacionais. Esta questão não é apenas vital para os próprios chineses, mas também vital para o mundo inteiro e para a percepção mundial da China.

O quadro chinês é, naturalmente, seu “rejuvenescimento nacional”. Uma “vanguarda” de pessoas de mente clara em outros países pode entender que o rejuvenescimento nacional da China também é do interesse deles. Contudo, a maioria de pessoas julga as coisas se elas se beneficiam delas – isto é, os acordos devem ser “ganha-ganha”. Essa é uma parte central do conceito de Xi Jinping de um “futuro comum para a humanidade”. As políticas da China sobre seu crescimento econômico e mudanças climáticas criam precisamente soluções “ganha-ganha” para si e para outros países.

Conclusão

A necessidade de “crescimento centrado nas pessoas” adotada no CNP, que inclui centralmente o crescimento econômico com preocupações ambientais, flui das necessidades domésticas da China. Porém, também fornece uma base fundamental para os acordos internacionais que, por sua vez, são significativos para o próprio desenvolvimento chinês. Eles também são uma parte fundamental do “soft power” do país.

Essas políticas foram adotadas para implementação na China para corresponder ao desenvolvimento interno chinês, mas, como mostrado, elas também se encaixam com as tendências globalmente atuais. Espera-se assim que a diplomacia e as relações públicas chinesas projetem de forma hábil essas questões no âmbito internacional.

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