Pesquisar
, ,

Entrevista: Os Imperialistas usam as mesmas táticas da Ucrânia na Venezuela

Para Alexey Albu, do Borotba, “em caso de convulsão social, os neonazistas da Ucrânia podem rapidamente armar seus associados da Europa.”
Por Greg Butterfield | Struggle – La Lucha – Tradução de Matheus G. Ferreira Silva para a Revista Opera
(Protesto em massa em Odessa no dia 10/04/14. Na frente com o megafone está o coordenador do Borotba, Alexey Albu; logo atrás dele, à direita, estão Andrei Brazhevsky (segurando a bandeira) e Vlad Wojciechowski (de suéter cinza). Foto: Borotba)

O que segue é a segunda parte de uma entrevista especial de Greg Butterfield para o  Struggle-La Lucha, organização comunista dos Estados Unidos, com Alexey Albu, do partido comunista ucraniano Borotba. Para ler a primeira parte, clique aqui.

Em fevereiro de 2014, um golpe apoiado pelos EUA derrubou o governo eleito da Ucrânia e instalou um regime de extrema direita representando os interesses imperialistas ocidentais, oligarcas locais e neonazistas. O novo governo lançou uma guerra contra a rebelde região mineira de Donbass, que custou pelo menos 13.000 vidas até agora.

“Struggle – La Lucha” falou com Alexey Albu, um ex-deputado do Conselho Regional de Odessa e um líder da organização revolucionária marxista Borotba (Luta), que é ilegal na Ucrânia atualmente. Albu sobreviveu ao massacre fascista na Casa dos Sindicatos de Odessa em 2 de maio de 2014 e foi forçado a deixar a Ucrânia. Longe das áreas controladas pelo atual governo em Kiev, ele tem trabalhado para a libertação do país desde então.

Struggle la Lucha: Tem havido uma enorme repressão dentro da Ucrânia contra os opositores do regime. Até mesmo jornalistas e ativistas que ficaram do lado do Euromaidan em 2014 foram alvo em alguns casos. Quantos prisioneiros políticos Kiev possui atualmente e qual é a sua situação? Qual é o status da resistência subterrânea dentro da Ucrânia hoje?

Alexey Albu: Infelizmente, não temos números concretos sobre quantos opositores estão na prisão hoje. Mas em 2015 o seu número era de cerca de 1.500, dos quais cerca de 700 eram membros das milícias no Donbass. Ou seja, na verdade, cerca de 700 eram prisioneiros de guerra e 800 eram presos políticos.

Mas hoje os números são muito menores. Alguns fazem um acordo com os promotores e saem. Alguns são liberados porque o governo não pode provar sua culpa, porque não há provas concretas. Alguns são trocados (por tropas ucranianas capturadas nas repúblicas de Donbass). Então, hoje, infelizmente, não temos uma imagem objetiva.

Tentamos ajudar prisioneiros políticos comunistas, assim como outros antifascistas, que conhecemos. Coletamos dinheiro, transferimos para organizações de direitos humanos e grupos que compram bens não-proibidos e os enviam para os prisioneiros.

A resistência armada que nossos camaradas do Exército Vermelho Ucraniano (URA) começaram e que foi captada por outros grupos autônomos foi um fiasco. Todos os ataques contra os nazistas, contra os escritórios dos voluntários de extrema-direita e seus patrocinadores não infligiram danos sérios.

Nossos camaradas da URA concluíram que tais ataques devem ser apoiados por trabalho político. Por exemplo, se conseguirmos criar uma autoridade alternativa, devemos protegê-la. Mas não importa o quanto ataquemos os prédios da Junta de Kiev, nada mudará até que possamos oferecer à sociedade uma alternativa. Por essa razão, nossos camaradas dos grupos militantes da URA decidiram suspender tais atividades.

É importante notar também que é muito caro, e os resultados foram negativos: não só não houve força suficiente para derrubar o regime, mas os camaradas foram presos. É bom termos conseguido retirar nossos heróis, como Vlad Wojciechowski e outros cujos nomes não posso mencionar agora. Mas alguns de nossos camaradas ainda estão na prisão.

SLL: As forças militares da OTAN e as agências de inteligência ocidentais têm estado ativas na formação e aconselhamento dos militares ucranianos, incluindo batalhões neonazistas, na guerra contra a República Popular de Donetsk (DPR) e a República Popular de Lugansk (LPR). Vê a OTAN oferecendo adesão à Ucrânia?

AA: Esta opção está sendo trabalhada pela alta liderança da OTAN. Mas existem algumas razões pelas quais, na minha opinião, isso não acontecerá no futuro próximo.

Tentarei explicar como enxergamos esta situação: todo mês, a crise capitalista que começou em 2008 exacerba cada vez mais as contradições entre o centro imperialista e os vários subsistemas ou blocos econômicos secundários – europeu, russo, pan-árabe, chinês, indiano. – e também a chamada “periferia econômica”.

É óbvio para todos que o conflito na Ucrânia é o resultado de um “ataque” econômico contra o bloco econômico russo, do qual a Ucrânia faz parte há séculos. Historicamente, eram as cadeias econômicas e estaduais que iam das fábricas de turbinas da Ucrânia às fábricas de aeronaves russas, dos produtores de amônia russos às fábricas de fertilizantes ucranianas e assim por diante.

Ou seja, a ruptura de todas as relações econômicas com a Ucrânia é um duro golpe para a economia da Rússia e, portanto, para as economias da Bielorrússia, Cazaquistão, Armênia, Quirguistão e outros países intimamente conectados, com um único centro localizado em Moscou.

Assim, voltando à questão da Ucrânia ingressar na OTAN; o principal objetivo dos imperialistas no início da guerra civil na Ucrânia foi cumprido com sucesso: os laços econômicos foram quebrados. Os nazistas bloquearam as ferrovias, bloquearam postos de controle na fronteira com a Rússia, explodiram linhas de energia e assim por diante.

Se considerarmos um potencial conflito militar entre a Rússia e seus aliados e o bloco da OTAN, então, naturalmente, a OTAN precisa da Ucrânia. Mas por que começar um novo conflito militar se você puder apenas incitar a Ucrânia contra a Rússia? Se você pode apenas provocar esse conflito e fornecer armas à Ucrânia?

Eu entendo perfeitamente bem que Vladimir Putin é um político burguês, mas, felizmente, ele tem sabedoria suficiente para não sucumbir a todas as provocações que o lado ucraniano está tentando organizar.

SLL: No ano passado houveram algumas grandes mudanças na liderança das repúblicas de Donbass. As negociações de Minsk estão paralisadas há muito tempo. Houve grandes montes de armamentos da Ucrânia na zona de guerra, mas até agora nenhuma nova ofensiva militar. Como você vê a situação dentro das repúblicas hoje? Qual é a situação dos trabalhadores e do movimento de esquerda?

AA: Os novos líderes do República Popular de Donetsk e da República Popular de Lugansk, Denis Pushilin e Leonid Pasechnik, são pessoas do mesmo grupo que os ex-líderes Igor Plotnitsky e Alexander Zakharchenko. Portanto, nada mudou.

Em relação às negociações de Minsk, sim, muitos itens nos acordos não foram implementados. A Ucrânia não libertou os presos políticos, não implementou as reformas constitucionais e assim por diante. Mas eles são parcialmente implementados: afinal, as partes não entram na ofensiva, não usam artilharia pesada, não ocupam assentamentos habitados controlados por seus oponentes.

O resultado dos acordos de Minsk é uma diminuição na quantidade de sangue derramado. E isso é definitivamente bom. As forças armadas das repúblicas populares se tornaram mais sérias e organizadas. Mas, claro, as pessoas estão cansadas de ficarem presas entre a Ucrânia e a Rússia. As pessoas querem que o conflito termine o quanto antes.

A situação dentro das repúblicas é bastante difícil. Mas, de certa forma, é muito melhor do que na Ucrânia. Serviços públicos, habitação, alimentação e vestuário são mais baratos do que na Ucrânia. No entanto, devido ao bloqueio econômico, muitas empresas foram fechadas e é muito difícil encontrar um emprego decente. Muitas pessoas têm que viver de poupança e muitas servem nas forças armadas. Portanto, a posição dos trabalhadores é bem complicada. Mas estas são razões objetivas relacionadas à guerra.

Falando do movimento de esquerda, vale a pena notar que os grupos de esquerda que existiram em 2014-2015 quase deixaram de existir. A vida política é esmagada pelo fardo da guerra. As iniciativas públicas não contam com o apoio das jovens repúblicas, uma vez que os novos governos têm medo do surgimento de grupos de oposição dentro da República Popular de Donetsk e do República Popular de Lugansk.

No entanto, falando no Borotba, posso dizer que em quatro anos não encontramos nenhum obstáculo em nossas atividades. Nós organizamos livremente nossas reuniões, colocamos flores no monumento a Lênin, realizamos ações comemorativas dedicadas ao massacre dos antifascistas de Odessa em 2 de maio e outros eventos.

SLL: Quais semelhanças você vê entre o que aconteceu na Ucrânia há cinco anos e a situação atual na Venezuela e em outros países da América Latina visados ​​pelos EUA?

AA: Analisando a situação na Venezuela, vemos que os mesmos financiadores que trabalharam na Ucrânia pagaram pelo desenvolvimento da crise: Freedom House, USAID [Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional], o Instituto Republicano Internacional, o National Endowment for Democracy e outras.

Vemos que os imperialistas usam as mesmas táticas: eles criam organizações para influenciar o processo eleitoral, o mesmo que na Ucrânia. Na Ucrânia, foi o Comitê de Eleitores da Ucrânia e na Venezuela o Foro Penal Venezolano. Para tumultos nas ruas e ataques a “indesejáveis”, são criadas unidades móveis de combate, consistindo dos chamados ativistas da sociedade civil. Na Ucrânia, esta era a organização de direita AutoMaidan, na Venezuela, os Guarimberos. E assim por diante.

Claro, existem diferenças devido a especificidades locais. Na Ucrânia, a oposição liberal de direita em 2013 foi unida e, na Venezuela, a oposição está fortemente dividida. Na Ucrânia, não havia um líder nacional forte – o presidente Viktor Yanukovich acabou sendo um trapo molhado. Na Venezuela, há um líder forte – Nicolás Maduro. Portanto, há uma chance de que as forças imperialistas quebrem suas presas.

SLL: A atividade de grupos neonazistas na Europa e nos EUA aumentou nos anos desde o golpe ucraniano. Como você vê a relação entre o que aconteceu na Ucrânia e a disseminação de movimentos neofascistas no Ocidente?

AA: A Internacional da Direita tem sido um fato consumado. A extrema direita coordena muito bem as questões de anti-comunismo e outras questões políticas.

Hoje, o ultradireitista na Ucrânia está profundamente integrado nas agências oficiais de segurança: a polícia, os Serviços de Segurança da Ucrânia (SBU), o exército, o Ministério Público. As quadrilhas de bandidos controlam o comércio ilegal de armas. Além disso, grupos neonazistas controlam parte da fronteira entre a Ucrânia e a União Européia nos Cárpatos.

Portanto, há uma ameaça muito séria, que eu sempre digo aos nossos amigos europeus, que em caso de convulsão social, os neonazistas da Ucrânia podem rapidamente armar seus associados da Europa com a ajuda do contrabando. É muito perigoso.

SLL: Quais são as perspectivas de um renascimento antifascista na Ucrânia e nos antigos países soviéticos?

AA: As perspectivas são excelentes. O principal é trazer nossas ideias para as massas e organizar bem.

SLL: Como os trabalhadores e a esquerda nos EUA podem ajudar a luta das pessoas na Ucrânia e no Donbass?

AA: Estamos muito gratos a vocês por sua ajuda em nossa luta. Para nós, a disseminação de informações sobre os crimes dos neonazistas e sobre nossa luta para um público de língua inglesa é inestimável.

Suas traduções conseguiram abrir os olhos de milhares de pessoas nos EUA e na Europa. Lembramos bem como você cumprimentou (o presidente ucraniano Petro) Poroshenko com as bandeiras de Borotba nos EUA, e como vocês ajudaram os parentes de nosso camarada Andrey Brazhevsky que foi morto em 2 de maio. Eu gostaria de aproveitar esta oportunidade para agradecer novamente a todos vocês!

Em conclusão, quero dizer que o mundo e todos nós estamos à beira de grandes mudanças, e é muito importante que tenhamos a oportunidade de influenciá-los.

Eu quero lhes desejar sucesso em sua luta. Quanto mais forte vocês forem, mais forte seremos. E vice-versa: quanto mais fortes formos, mais fortes vocês serão.

Viva a solidariedade proletária! Viva um novo mundo sem exploração! Rumo ao socialismo!

Continue lendo

libano
O que uma guerra com o Líbano e o Irã significa para Gaza?
O candidato Pablo Marçal gesticula e olha diretamente para a câmera durante debate Folha/UOL. No seu paletó, há um adesivo com seu número: 28.
Marçal deve ir ao segundo turno, e debate na Globo é central para definir quem irá com ele
nasrallah hezbollah israel
Hassan Nasrallah: o homem que derrotou Israel

Leia também

sao paulo
Eleições em São Paulo: o xadrez e o carteado
rsz_pablo-marcal
Pablo Marçal: não se deve subestimar o candidato coach
1-CAPA
Dando de comer: como a China venceu a miséria e eleva o padrão de vida dos pobres
rsz_escrita
No papel: o futuro da escrita à mão na educação
bolivia
Bolívia e o golpismo como espetáculo
rsz_1jodi_dean
Jodi Dean: “a Palestina é o cerne da luta contra o imperialismo em todo o mundo”
forcas armadas
As Forças Armadas contra o Brasil negro [parte 1]
PT
O esforço de Lula é inútil: o sonho das classes dominantes é destruir o PT
ratzel_geopolitica
Ratzel e o embrião da geopolítica: os anos iniciais
almir guineto
78 anos de Almir Guineto, rei e herói do pagode popular