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Cinco razões pelas quais o “crescimento verde” não vai salvar o planeta

Na lógica do "crescimento verde", somos levados a lutar contra as questões ambientais como indivíduos, enquanto os verdadeiros culpados saem impunes.

por Oliver Taherzadeh e Benedict Probst | Brave New Europe – Tradução de Matheus Ferreira para a Revista Opera

O crescimento verde emergiu como a narrativa dominante para enfrentar os problemas ambientais contemporâneos. Seus defensores, incluindo membros da ONU, OCDE, governos nacionais, empresas e até ONGs, dizem que a sustentabilidade pode ser alcançada por meio de eficiência, tecnologia e ação ambiental liderada pelo mercado. O crescimento verde sugere que podemos, simultaneamente, “ter o bolo e comê-lo” – promover o crescimento da economia e proteger o planeta.

Mas quando se trata de enfrentar os problemas ambientais mais urgentes, como o colapso climático, a extinção de espécies ou o esgotamento de recursos, o crescimento verde pode enfraquecer, em vez de fortalecer, o progresso. Aqui estão cinco razões:

 

1 – O crescimento aumenta a eficiência

Em teoria, os avanços na eficiência ambiental podem ajudar a desacoplar o crescimento econômico do uso de recursos e da poluição. Porém, tais resultados permanecem elusivos no mundo real. Enquanto setores como construção, agricultura e transporte conseguiram gerar menos poluição e usar menos recursos por unidade de produção, essas melhorias vêm encontrando dificuldades para compensar a escala e a velocidade do crescimento econômico. Ao superar as melhorias na produção, o crescimento econômico levou a um aumento expressivo no uso de recursos, poluição e desperdício.

Na verdade, a eficiência pode até estar provocando mais consumo e poluição. Esse é um paradoxo observado pela primeira vez em 1865 pelo economista William Stanley Jevons, que percebeu que a introdução de uma máquina a vapor mais eficiente coincidia com mais consumo de carvão, não menos, à medida que novos lucros eram reinvestidos em produção extra, provocando a queda dos preços, o aumento da demanda, e assim por diante. Tais “efeitos rebote” existem em toda economia, de modo que a única solução real é diminuir o consumo. Na melhor das hipóteses, a eficiência é uma solução incompleta – na pior das hipóteses, ela ataca o próprio problema que tenta resolver.

2 – Tecnologia superestimada

Os proponentes do crescimento verde querem que acreditemos que uma tecnologia cada vez melhor é a solução. No entanto, não temos tanta certeza. Acordos e cenários ambientais internacionais assumem com confiança que tecnologias de larga escala serão implementadas para capturar e armazenar emissões de carbono, mas ainda é preciso testemunhar seu potencial, mesmo em pequena escala. A agricultura mecanizada está sendo promovida com base no aumento da eficiência e de rendimento, enquanto negligencia o fato de que a agricultura de baixa tecnologia é um meio mais produtivo de atender à demanda global de alimentos a um custo ambiental menor.

As emissões de carbono poderiam ser capturadas e armazenadas no subsolo?

Claramente, a tecnologia é crucial para reduzir a carga ambiental de produção e consumo, mas o crescimento verde exagera seu papel.

3 – Sem lucro, sem ação

Talvez o argumento mais convincente apresentado para o crescimento verde seja que a proteção do meio ambiente possa andar de mãos dadas com a obtenção de lucros. Entretanto, na realidade, muitas vezes há uma tensão entre esses objetivos. Muitas empresas têm aversão ao risco, por exemplo, e não querem ser pioneiras, seja na cobrança de sacolas plásticas, na proibição de copos plásticos ou na introdução de rótulos de carbono.

Então, você tem o fato de que algumas intervenções sustentáveis ​​simplesmente não são investimentos atraentes para o setor privado: há pouco lucro a ser feito na conservação de ecossistemas ou no financiamento de infraestrutura pública para veículos elétricos. Enquanto isso, os riscos ambientais, como o esgotamento de recursos naturais ou condições climáticas extremas, podem se tornar cada vez mais atraentes para parte do setor privado.

Se levamos a sério os limites ambientais, precisamos dizer adeus a certos setores: combustíveis fósseis, pecuária e fertilizantes. Se deixarmos isso para o mercado, ficaremos esperando muito, muito tempo.

4 – O consumo verde ainda é consumo

O consumo de produtos “verdes” oferece uma solução aparentemente de senso comum para os males ambientais do consumo excessivo, mas estamos céticos. A pressão por um consumo mais verde transferiu a responsabilidade de governos e empresas para pessoas comuns. Como disse um comentarista, fomos levados a lutar contra as questões ambientais como indivíduos, enquanto os verdadeiros culpados saem impunes.

De fato, o próprio ato de consumo verde ainda alimenta a extração e uso de recursos naturais, poluição e degradação ambiental. Coisas exigem mais coisas para produzir – isso é muitas vezes esquecido quando compramos copos reutilizáveis, eco-eletrodomésticos e roupas “sustentáveis”. Quaisquer impactos positivos do consumo verde também podem ser facilmente desfeitos por pessoas que sentem que têm uma licença moral para compensar em outro lugar. O consumo verde acaba se tornando um jogo de soma zero. Embora seja equivocado pensar que os consumidores não podem fazer a diferença, não devemos nos enganar pensando que a humanidade pode consumir seu caminho para sair dos problemas ambientais.

5 – O perigo da adivinhação

Um argumento central do crescimento verde é que os mercados são parte do problema e da solução. Os proponentes do crescimento verde argumentam que, enquanto acertarmos os números – um imposto sobre carbono, um subsídio para energia limpa ou uma etiqueta de preço na natureza – os mercados podem promover a sustentabilidade. Mas lidar com problemas ambientais por meio do mercado envolve muitas adivinhações sem resultados garantidos.

Ao contrário do carbono, os ecossistemas e a biodiversidade não são passíveis de valoração econômica e substituição nos mercados. Precificar danos ambientais nos mercados é como vender permissões para poluir e destruir nosso mundo natural. Embora os mecanismos de mercado possam orientar os negócios para um comportamento sustentável, apenas leis e regulamentações rigorosas podem ajudar a alinhar seu crescimento aos limites ambientais.

Para além do crescimento verde?

A eficiência sozinha é uma ferramenta contundente e as correções tecnológicas também não nos levarão para onde precisamos. Precisamos nos dirigir ao elefante na sala: o consumo. Como os cases de negócios de redução do consumo são pobres, os governos e as comunidades precisam assumir o controle.

Existem sinais promissores. O próximo grande relatório de avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) finalmente incluirá um capítulo sobre o combate ao consumo. No Reino Unido, o relatório do Comitê sobre Mudanças Climáticas sobre o saldo líquido até 2050 destaca a necessidade crítica de mudança na sociedade. Questionar nosso apetite por crescimento é o primeiro passo para um modelo mais inclusivo e efetivo de sustentabilidade.

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