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El Salvador: Bukele ganhou de novo

As últimas eleições em El Salvador mostram uma tendência política clara a médio prazo: Bukele e autoritarismo por algum tempo.
As últimas eleições em El Salvador mostram uma tendência política clara a médio prazo: Bukele e autoritarismo por algum tempo. Por Nery Chaves García | CELAG – Tradução de Rebeca Ávila para a Revista Opera
(Foto: US Embassy Guatemala)

As eleições de 28 de fevereiro de 2021 em El Salvador entrarão para a história. O partido fundado por Nayib Bukele, Nuevas Ideas (NI), venceu com ampla maioria em sua primeira disputa eleitoral, com a possibilidade de liderar o país sem oposição alguma na Assembleia Legislativa e no Executivo [1]. A estratégia que tornou isso possível: centrar a campanha eleitoral em Nayib Bukele, a figura do presidente que se autodenomina como um “messias”, o líder do desenvolvimento e da paz do povo salvadorenho. Assim, mais de um milhão de eleitores e eleitoras decidiram entregar o controle de dois poderes da República à Bukele, um fenômeno sem precedentes na vida democrática de El Salvador.

Nuevas Ideas, a principal força política em El Salvador

Na madrugada de 1 de março, a tendência já era irrevogável: o NI conseguiu uma ampla maioria na Assembleia Legislativa e se consolida como a principal força política em El Salvador. Mais de um milhão de eleitores e eleitoras optaram pelo NI e deslocaram os partidos políticos que governavam desde o fim da Guerra Civil: o esquerdista Frente Farabundo Martí para la Liberación Nacional (FMLN) e a Alianza Republicana Nacionalista (ARENA). A mensagem é contundente, já que o NI contará com 56 dos 84 deputados, fração superior à maioria simples (43). Se esses dados forem confirmados, Bukele controlará dois terços do Congresso. 

A tabela 1 detalha os resultados eleitorais, com 83,67% das atas processadas das Juntas Receptoras de Votos (JRV) e com os votos válidos de 51% do eleitorado, equivalente a cerca de 2.748.398 votos emitidos. Esses dados confirmam – mais uma vez – o declínio eleitoral do bipartidismo e a abrupta queda do FMLN como opção política. Os resultados eleitorais do dia 28 de fevereiro são o pior registro eleitoral do FMLN desde que o partido participou de uma disputa eleitoral (em 1994, quando conseguiu 21 deputados após 12 anos de guerra civil). No fim da noite das eleições, Yancy Urbina – uma das deputadas mais conhecidas do FMLN – declarou que a derrota os leva a “desenvolver um período de reflexão nos próximos meses”. Na madrugada de segunda-feira, 1 de março, o secretário-geral do FMLN, Oscar Ortíz, anunciou reformas dentro do partido e declarou: “o eleitorado decidiu concentrar o poder em uma só pessoa e nós vamos respeitar essa decisão”. O retrocesso para a esquerda é profundo: de 23 assentos conquistados em 2018, passarão a três em 2021.

Para o ARENA, o panorama também não é animador. O partido passou de 37 a 14 deputados, perdendo 23 assentos no total. A mensagem do eleitorado para o bipartidarismo que governou El Salvador nas últimas décadas é direta.

Com esses resultados, Nayib Bukele conseguiu o que promoveu desde seu primeiro dia no governo: controlar a Assembleia Legislativa sem qualquer oposição. Através de uma campanha eleitoral que o destacava como mandatário, sob o slogan “Vote em deputados que apoiam os projetos do presidente” e discursos de ódio contra o FMLN e o ARENA, catapultou o Nuevas Ideas diante de um eleitorado desgastado pelas promessas do bipartidarismo que governou a curta história democrática de El Salvador. 

De modo geral, Bukele ganhou de novo. Um caudilhismo que alarma porque, em quase dois anos de governo, o Executivo impulsionou uma profunda alteridade em relação ao que considera como oposição – desde os partidos políticos até meios de comunicação e jornalistas – e uma perseguição política ao Legislativo. A partir de 1 de maio, o plenário controlará e elegerá os cinco magistrados do Supremo Tribunal de Justiça, o Procurador-Geral da República, o Procurador dos Direitos Humanos; também são os deputados e deputadas que poderão aprovar reformas à Constituição Política promovida por Félix Ulloa, vice-presidente da República. Nem o assassinato de simpatizantes do FMLN, nem as denúncias de corrupção, abuso de poder e violações ao Código Eleitoral impediram o eleitorado de optar pelo NI como a principal – e, na prática, a única – força política no Congresso salvadorenho.

Essa tendência se estende às prefeituras. Com 85,6% das mesas contabilizadas, o NI venceu seu principal opositor no município de San Salvador, o ARENA. 285.133 pessoas escolheram Mario Durán, do NI, contra 116.000 que votaram em Ernesto Muyshondt, do ARENA. O NI também venceu nas 14 prefeituras que são capitais departamentais

Fraude, irregularidades e violações ao Código Eleitoral

Embora as pesquisas já atribuíssem uma vitória contundente ao NI desde novembro de 2020, Bukele denunciou uma fraude eleitoral pouco antes das eleições. Essa retórica vai de acordo com a que se instalou durante o seu primeiro período de mandato: o bloqueio das propostas de mudança do FMLN e do ARENA. Assim, no dias das eleições, Bukele postou a hashtag #VotoMasivoMataFraude nas suas redes sociais e deu instruções às pessoas simpatizantes do NI sobre a revisão do material eleitoral e a defesa do voto.

Além de promover uma campanha eleitoral que custou o dobro em relação às dos outros partidos, Bukele utilizou os recursos do Executivo para proselitismo: inaugurou obras de infraestrutura durante o período de silêncio eleitoral e, no próprio dia das eleições, convocou uma conferência de imprensa que nomeou de “operação remate” contra os partidos tradicionais. Esses atos levaram o Tribunal Supremo Eleitoral a abrir um processo para sancioná-lo e proibir a difusão das mensagens presidenciais nos meios de comunicação, por violar o artigo 175 do Código Eleitoral.

Mesmo assim, pouco depois do fechamento dos centros de votação, Bukele publicou um vídeo com fogos artificiais e celebrou a vitória do NI. Desde então, não se referiu às próprias denúncias de fraude, nem às irregularidades registradas pelo Tribunal Superior Eleitoral, a saber: cerca de 40% dos centros de votação abriram com duas horas de atraso, pessoas das Juntas Receptoras de Voto não foram capacitadas para utilizar o equipamento eletrônico e distintos fiscais de mesas do NI e do GANA sequer receberam as certificações.

No dia 1 de maio, tomam posse a nova Assembleia Legislativa, as Câmaras Municipais e o Parlamento Centro-americano – que também segue a tendência eleitoral a favor do NI – e, com isso, inicia-se um momento histórico chave para El Salvador e a região latino-americana. A possibilidade de governar sem oposição é um fenômeno sem precedentes desde as ditaduras na região. Assim, El Salvador será governada por Bukele em um sistema político que oferece poucos contrapesos para as e os opositores das medidas autoritárias do presidente millennial. Bukele ganhou de novo. 

[1] – O Nuevas Ideas não pôde participar das eleições presidenciais de 2019, pelo que Bukele se aliou à Gran Alianza por la Unidad Nacional (GANA) e chegou ao Executivo. 

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