Pesquisar
,

Biden e Cuba: das promessas ao silêncio

Passados mais de cinco meses de governo Biden, prevalecem o silêncio e o imobilismo diante das medidas adotadas por Trump contra Cuba.

Passados mais de cinco meses de governo Biden, prevalecem o silêncio e o imobilismo diante das medidas adotadas por Trump contra Cuba. Por Silvina Romano | CELAG – Tradução de Nara Castro para a Revista Opera
(Foto: Clara Sanchiz)

Na última quarta (23), a Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) votou pela vigésima nona vez sobre o embargo econômico contra Cuba. Nos últimos 29 anos, cerca de 187 países votaram a favor do fim do bloqueio. Historicamente, os Estados Unidos e o Estado de Israel, entre outros (o Brasil aderiu em 2019), opõem-se ao término desta medida da Guerra Fria.

Durante a campanha para a presidência e após a posse de Joseph Biden, gerou-se, dentro e fora dos Estados Unidos, uma importante expectativa quanto à mudança de política em relação a Cuba, incluindo a possibilidade de um retorno às políticas de distensão da era Obama. No entanto, passados mais de cinco meses de governo, prevalecem o silêncio e o imobilismo diante das medidas adotadas por Trump: em abril, a secretária de imprensa da Casa Branca, Jen Psaky, afirmou que Cuba não é uma das prioridades do governo de Biden; um mês depois, durante a reunião do Conselho das Américas, o secretário de Estado Antony Blinken reiterou que os EUA “condenam o abuso aos direitos humanos na ilha e que os Estados Unidos defenderão a liberdade dos cubanos”.

Vozes contra as sanções e o bloqueio dos Estados Unidos a Cuba

Nos últimos meses, multiplicaram-se as vozes contra as sanções impostas por Trump, assim como os apelos pelo fim do bloqueio econômico.

No México, a Comissão Permanente do Congresso fez um apelo ao governo federal para “reforçar a negociação diplomática para que a Organização das Nações Unidas (ONU) aprove, em sua sessão do dia 23, a resolução para encerrar o bloqueio econômico imposto a Cuba há quase seis décadas”.

Em maio, no contexto crítico gerado pela pandemia e as mais de 240 sanções impostas por Trump além do bloqueio, a ONG OXFAM pediu ao presidente Biden para “agir quanto antes para normalizar as relações com Cuba” e pôr fim ao embargo.

Vários think tanks dos EUA (geralmente alinhados com o establishment), como o Conselho para a Democracia nas Américas (CDA), o Escritório de Washington para a América Latina (WOLA) e o Grupo de Estudos de Cuba (CSG) também pedem para que a questão de Cuba seja priorizada, sugerindo ao menos um retorno às políticas de Obama.

Dentro do governo dos EUA, a pressão também tem aumentado: no início de março, os representantes da Câmara Bobby L. Rush (democrata, Illinois), Steve Cohen (democrata, Tennessee), Barbara Lee (democrata, Califórnia) e Gwen Moore (democrata, Wisconsin) lideraram um grupo de 75 democratas membros do Congresso, solicitando a Biden ações imediatas para reverter a política de Trump em relação a Cuba. A carta sugere a retomada das medidas iniciadas pelo governo Obama e o fim do embargo econômico à ilha, que já dura sessenta anos. Além disso, exigem que Cuba seja retirada da lista dos Estados terroristas em que foi incluída por decisão do governo anterior, sem qualquer justificativa.

Quais são os motivos que podem estar impedindo uma mudança nas relações com Cuba?

O lobby anticastrista continua a ter grande peso, embora Trump não esteja mais na presidência. O senador democrata Bob Menéndez (New Jersey), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, continua sendo um dos líderes linha-dura contra Cuba, junto ao senador Marco Rubio, um dos que apoiaram as sanções de Trump contra a ilha.

A essa ala anticastrista juntam-se Rick Scott e Ted Cruz, que pressionam para impedir que Biden elimine Cuba da lista dos Estados terroristas. Eles afirmam se opor a qualquer mudança nas diretrizes a respeito da ilha.

Por enquanto, a política eleitoral interna parece continuar tendo peso, como aconteceu com o governo Trump no caso da Flórida. Esse estado geralmente define as eleições e Cuba continua a ser um tema que gera polarização. Os democratas estão na defensiva, ainda mais considerando que em novembro perderam duas cadeiras no sul da Flórida, região com população proveniente de países caribenhos e centro-americanos.

As oportunidades

O governo Biden ainda está em tempo de reverter as medidas de Trump e até propor a retirada do bloqueio. O terreno é muito mais fértil do que durante a gestão anterior e vários setores da sociedade civil, do Governo e do setor privado pressionam para uma “normalização” das relações com a ilha.

Os governos da América Latina e do Caribe, por sua vez, também devem estar atentos ao novo cenário, que abre a possibilidade de maiores alianças, com mais peso e impacto, dentro e fora dos Estados Unidos, para pressionar a favor da retirada das sanções e do fim do bloqueio.

Essa oportunidade será aproveitada ou o governo dos Estados Unidos escolherá fingir indiferença? O que fará a comunidade internacional? Aumentará a pressão para acabar com as medidas da Guerra Fria? Não seria esse contexto de pandemia o momento certo para reconhecer a tradição de solidariedade de Cuba com os povos e encerrar o bloqueio de uma vez por todas?

Continue lendo

A ativista Greta Thunberg em Estocolmo, em 2024. (Foto: Kushal Das / Wikimedia Commons)
De queridinha da mídia a persona non grata: a jornada de Greta Thunberg
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, durante o Fórum Econômico Mundial em Davos, em 23 de janeiro de 2014. (Foto: Jolanda Flubacher / World Economic Forum)
Grande coincidência: julgamento de Netanyahu é adiado após Israel bombardear Síria
Rio de Janeiro (RJ), 06/07/2025 - Foto oficial do BRICS com seus membros. Da esquerda para direita: Sergei Lavrov (Rússia), Khaled bin Mohamed Al Nahyan (Emirados), Prabowo Subianto (Indonésia) Cyril Ramaphosa (África do Sul) Luiz Inácio Lula da Silva (Brasil) Narendra Modi (Índia) Li Qiang (China) Abiy Ahmed (Etiópia) Mostafa Madbouly (Egito) Abbas Araghchi (Irã) (Foto: Joédson Alves/Agência Brasil)
BRICS na encruzilhada: a cúpula que expôs seu poder (e divisões)

Leia também

São Paulo (SP), 11/09/2024 - 27ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo no Anhembi. (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)
Ser pobre e leitor no Brasil: um manual prático para o livro barato
Brasília (DF), 12/02/2025 - O ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, durante cerimônia que celebra um ano do programa Nova Indústria Brasil e do lançamento da Missão 6: Tecnologias de Interesse para a Soberania e Defesa Nacionais, no Palácio do Planalto. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
O bestiário de José Múcio
O CEO da SpaceX, Elon Musk, durante reunião sobre exploração especial com oficiais da Força Aérea do Canadá, em 2019. (Foto: Defense Visual Information Distribution Service)
Fascista, futurista ou vigarista? As origens de Elon Musk
Três crianças empregadas como coolies em regime de escravidão moderna em Hong Kong, no final dos anos 1880. (Foto: Lai Afong / Wikimedia Commons)
Ratzel e o embrião da geopolítica: a “verdadeira China” e o futuro do mundo
Robert F. Williams recebe uma cópia do Livro Vermelho autografada por Mao Zedong, em 1 de outubro de 1966. (Foto: Meng Zhaorui / People's Literature Publishing House)
Ao centenário de Robert F. Williams, o negro armado
trump
O Brasil no labirinto de Trump
O presidente dos EUA, Donald Trump, com o ex-Conselheiro de Segurança Nacional e Secretário de Estado Henry Kissinger, em maio de 2017. (Foto: White House / Shealah Craighead)
Donald Trump e a inversão da estratégia de Kissinger
pera-5
O fantástico mundo de Jessé Souza: notas sobre uma caricatura do marxismo
Uma mulher rema no lago Erhai, na cidade de Dali, província de Yunnan, China, em novembro de 2004. (Foto: Greg / Flickr)
O lago Erhai: uma história da transformação ecológica da China
palestina_al_aqsa
Guerra e religião: a influência das profecias judaicas e islâmicas no conflito Israel-Palestina