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A nova ressurreição do L’Unità, o jornal de Gramsci

O L’Unità, jornal do Partido Comunista Italiano criado por Gramsci, foi sem dúvidas o jornal comunista com mais difusão do Ocidente.
O L’Unità, jornal do Partido Comunista Italiano criado por Gramsci, foi sem dúvidas o jornal comunista com mais difusão do Ocidente. Por Daniel Serra | El Salto – Tradução de Pedro Marin para a Revista Opera
Trabalhadores se formam e informam com o L’Unità.

Com este lema um tanto pretensioso – “L’Unità está de volta, Gramsci está de volta”– Piero Sansonetti, atual diretor do jornal Il Riformista, anunciou que em 16 de maio o L’Unità, jornal histórico do extinto Partido Comunista Italiano (PCI), retornaria às bancas de jornal italianas. No prazo máximo de um mês – as fontes não são totalmente claras –, os italianos poderão rever em suas bancas o que foi o órgão do Partido Comunista Italiano (1921-1991). No final do ano passado, Piero Sansonetti comprou o jornal, que estava em leilão, junto com um sócio napolitano; arrebatando-o por alguns milhares de euros da Fundação Gramsci, que até agora tinha feito o maior lance no leilão.

O jornal, que após a extinção do PCI se ligou aos sucessivos partidos que nasceram dos restos dos comunistas, fechou várias vezes ao longo da sua história, sofrendo o seu último revés em 2017, quando Mateo Renzi exercia o cargo de secretário do Partido Democrático (PD). A nova redação do jornal será composta inteiramente pela que até agora estava no Il Riformista, o que faz a ressurreição do L’Unità parecer mais uma mudança de nome do que qualquer outra coisa. Em entrevista em fevereiro passado, Sansonetti declarou que quer que o L’Unità volte a ser o noticiário do povo italiano progressista, assim como o órgão do PD; embora assegure que quer uma virada à esquerda deste último. Algo que parece um pouco estranho, tendo em vista que cedeu seu jornal anterior a Mateo Renzi.

O sobrevivente

O diário foi fundado há quase 100 anos por Antonio Gramsci. Ano que vem será seu centenário. Durante o período fascista, o L’Unità seguiu sendo editado, embora em tiragens muito pequenas, a partir da França, e não voltou à Itália até 1944, com a queda de Mussolini. Com o aumento da força do PCI, o L’Unità cresceu rapidamente, e já em 1945 foram abertas redações em Génova, Milão e Turim, às quais posteriormente se somou outra em Nápoles. Cesare Pavese ou Ítalo Calvino, entre muitas outras personalidades de renome, puseram seus nomes em algumas das páginas do jornal, que adquiriu cada vez mais prestígio na Itália e no resto da Europa. Durante grande parte de sua história, o jornal contou com suplementos dirigidos às mulheres, como o Noi Donne, ou aos filhos dos militantes, como o Pioneri.

Também em 1945 foi celebrada a primeira Festa de l’Unità, uma celebração pela qual passaram milhões de pessoas. À parte da festa nacional, as seções locais e regionais também faziam outras, de menor escala. Nos anos 70, o número de visitantes nestas festas rondava os quinze milhões, o que significava uma grande fonte de receitas para um jornal que, na maior parte dos momentos ao longo de sua história, esteve em apertos econômicos.

A difusão do jornal nesta época era sobretudo porta a porta, com trabalho militante; existia um prêmio para a pessoa que vendesse mais números. Por exemplo, em 1950 o prêmio foi um fim de semana na Bolonha, pago pelo partido. Quem vendesse mais de 5 mil números ganhava uma pequena coleção de obras marxistas. Nos anos 50, a tiragem chegou a ser de cerca de 400 mil exemplares, subindo a quase 1 milhão em datas de destaque, como o 1 de maio ou o 25 de abril, aniversário da Libertação da Itália.

O L’Unità era, sem dúvidas, o órgão de um partido comunista com mais difusão no Ocidente. Suas vendas alcançavam em difusão as do Corriere della Sera. Era um jornal pouco ortodoxo, em termos de sua ideologia comunista, e por isso foi muito criticado pelo Cominform, a o Gabinete de Informação dos Partidos Comunistas e Operários orientado por Moscou. Essa discrepância é detalhada na biografia “Pedía la Luna”, de Pietro Ingrao, diretor do L’Unità entre 47 e 57, no qual recorda uma reunião ocorrida em 1950.

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Apesar de ter tido uma queda na tiragem, para 250 mil cópias, e outros problemas financeiros, o jornal nos anos 70 seguiu competindo com o resto dos jornais da Itália. No entanto, nos anos 80 se buscou uma maior “independência” ao jornal, dando-lhe um caráter menos partidário para tentar alcançar um público mais amplo.

Com o desaparecimento do PCI no Congresso de Rimini, em 1991, o jornal passou às mãos do novo Partido Democrático de Esquerda (Partito Democratico della Sinistra); depois ao Democratas de Esquerda (Democratici di Sinistra) e por último ao Partido Democrático. Em todo esse processo ocorreu uma série de mudanças que afetaram a forma como o jornal se relacionava com o partido.

O que fica claro nesta “volta” é que não volta Gramsci, nem volta o L’Unità. O PCI, com todos seus problemas e particularidades, era um partido comunista que buscava o socialismo à sua maneira, fosse ela mais ou menos correta, e o L’Unità não era uma forma de lucrar. Era um meio para que os e as militantes e simpatizantes soubessem do que ocorria no país e nas seções locais do partido, para que estivessem em dia com os debates que ocorriam na organização; e, além disso, era uma forma de mostrar o partido como um ator legítimo na política italiana. Voltará uma coisa que tem o mesmo nome, mas o L’Unità não é só um nome. Seja como for, veremos como acabará esta aventura num momento no qual o jornalismo impresso está em queda livre.

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