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O que está por trás da campanha para banir o TikTok dos EUA?

Os aplicativos dos EUA coletam tantas ou mais informações do que o TikTok, e as utilizam para criar perfis de usuários a fim de direcionar anúncios
Chris Garaffa
TikTok, propriedade de empresa sediada na China, tem sido alvo de tentativa de banimento nos Estados Unidos. (Foto: Solen Feyissa / Flickr)

No dia 13 de março, a Câmara dos Deputados dos EUA aprovou o H.R. 7521. Esse projeto de lei, denominado “Protecting Americans from Foreign Adversary Controlled Applications Act” (Lei de Proteção aos Americanos contra Aplicações Controladas por Adversários Estrangeiros), mais conhecido como a banimento do TikTok, foi aprovado apenas oito dias após sua introdução na Câmara. Se o projeto de lei for aprovado no Senado, o presidente Joe Biden disse que o assinará.

O projeto de lei visa explicitamente a ByteDance, proprietária do popular aplicativo de mídia social TikTok, tanto em sua introdução quanto em seu texto. Se aprovada, a legislação forçaria a venda do aplicativo, já que ele é de propriedade da ByteDance, uma empresa com sede em Pequim. Ela também permitiria o bloqueio de aplicativos e sites com mais de 1 milhão de usuários ativos mensais se a empresa que cria o aplicativo estiver sediada em um dos quatro “países adversários estrangeiros” definidos pelas leis dos EUA: Coreia do Norte, China, Rússia e Irã. As lojas de aplicativos administradas por empresas como Apple e Google seriam impedidas de permitir que os usuários baixem o TikTok e outros aplicativos para usuários nos Estados Unidos.

Não se trata de uma vitória para a privacidade de dados

Alguns defensores da privacidade afirmam que esse projeto de lei é uma vitória para os direitos de privacidade, citando preocupações sobre a coleta de dados pelo TikTok. Embora algumas dessas preocupações possam vir de um lugar bem-intencionado, elas se encaixam em teorias racistas sobre a vigilância na China. Os aplicativos de mídia social norte-americanos coletam tantas ou mais informações do que o TikTok e as utilizam para criar perfis de usuários a fim de direcionar anúncios. Essas empresas também entregam voluntariamente informações às agências de vigilância e aplicação da lei dos EUA.

A App Store da Apple adicionou rótulos de privacidade aos seus aplicativos em 2020. O aplicativo do Facebook lista 17 categorias enormes de informações nas seções “Dados usados para rastreá-lo” e “Dados vinculados a você”, incluindo itens sensíveis e obscuros, informações confidenciais e outros dados.

Os dados usados para rastreamento incluem informações que podem ser compartilhadas diretamente com outras empresas, incluindo intermediários de dados, enquanto os dados vinculados a você incluem informações vinculadas à sua identidade no aplicativo. Em comparação, o TikTok lista 13 categorias de dados nessas seções e não inclui informações confidenciais, saúde e condicionamento físico ou outros dados. O X, antigo Twitter, também tem 17 itens nas duas seções, com muito mais itens listados diretamente como “Dados usados para rastrear você” do que o Facebook ou o TikTok. 

A privacidade dos dados não é a verdadeira preocupação daqueles que estão pressionando pela proibição do TikTok. Se fosse, eles estariam se concentrando no setor de coleta de dados de vários trilhões de dólares que busca monetizar cada visualização de vídeo, cada toque, cada GIF e cada mensagem que enviamos como usuários desses aplicativos. Se o governo dos EUA tivesse regulamentos reais de proteção de dados, todos os aplicativos – inclusive o TikTok – seriam obrigados a segui-los para fazer negócios no país.

O TikTok já está proibido nos dispositivos de trabalho de funcionários federais e de funcionários estaduais na maioria dos estados norte-americanos. Donald Trump também tentou forçar a venda do TikTok para empresas americanas em 2020, dando ao varejista Walmart e à empresa de software corporativo Oracle uma participação combinada de 20% na empresa. A Oracle, sediada em Austin, Texas, teve seu início em 1977, com a Agência Central de Inteligência (CIA) como seu primeiro cliente, e depende fortemente de contratos governamentais para seus negócios. O cofundador e multimilionário da Oracle, Larry Ellison, pediu “um banco de dados de segurança nacional combinado com biometria, impressões digitais, impressões de mãos, escaneamentos de íris ou o que for melhor…” que poderia ser “construído em poucos meses” em um artigo de opinião do New York Times meses após os ataques de 11 de setembro.

As verdadeiras razões por trás da proibição do TikTok

Os ataques ao TikTok devem ser analisados no contexto de empenho contínuo do governo dos EUA para impedir a ascensão da China no cenário global, como parte de seus esforços na nova Guerra Fria. As administrações de Obama, Trump e Biden identificaram e visaram ativamente o crescimento da influência econômica, política, tecnológica e diplomática da China como inaceitável para os interesses de dominação e controle global dos EUA. 

Os equipamentos de telecomunicações das empresas chinesas Huawei, ZTE, Hikvision, Dahua e Hytera foram proibidos pelo governo Biden em 2022, em uma continuação da iniciativa “The Clean Network” (A Rede Limpa, em tradução literal) do Departamento de Estado da era Trump no sentido de remover a tecnologia chinesa da infraestrutura dos EUA e dos países aliados em todos os níveis, desde os enormes equipamentos e cabos de rede que transportam o tráfego da Internet pelo país e pelo mundo até os aplicativos em nossos telefones. Os produtos 5G e de vigilância vendidos pela maioria dessas empresas não são usados por pessoas comuns, portanto, essas restrições não receberam tanta atenção quanto as proibições propostas para o TikTok.

A Lei de Ciência e CHIPS de 2022 também visou o setor de tecnologia da China, impedindo que qualquer empresa que tenha recebido alguns dos bilhões de dólares em subsídios e créditos fiscais financiados pela lei de vender chips de microprocessador que usem um processo menor que 28 nanômetros. Na fabricação de chips, um processo menor permite mais transistores em uma área física menor, o que pode levar a um melhor desempenho e eficiência energética. Isso é particularmente importante no desenvolvimento de chips que alimentam os sistemas de inteligência artificial, nos quais os Estados Unidos ficaram atrás da China.

No total, a lei oferece cerca de 280 bilhões dólares em concessões, benefícios fiscais, fundos de pesquisa e subsídios para impulsionar o desenvolvimento interno de microprocessadores e tecnologias relacionadas nos EUA. Em resposta, a China aumentou sua própria produção doméstica de microchips, e a Huawei anunciou em 2023 o processador Kirin 9000S para seus telefones, usando um processo de 7 nanômetros. A SMIC (Semiconductor Manufacturing International Corporation), uma empresa chinesa, está trabalhando em um processador de 2 nanômetros. 

O foco revigorado no TikTok também ocorre em um momento em que milhões de pessoas têm se mobilizado constantemente em defesa do povo palestino, após o dia 7 de outubro. O genocídio na Palestina está sendo transmitido ao vivo para o mundo ver no TikTok, e os jovens cada vez mais recebem notícias por meio de vídeos curtos na plataforma. Uma gravação de áudio recentemente vazada de Jonathan Greenblatt, CEO da organização sionista de direita Anti-Defamation League, mostra o mostra admitindo que: “Nós realmente temos um problema com o TikTok, um problema com a Geração Z”, em resposta à pesquisa de opinião de que os jovens nos Estados Unidos se opõem majoritariamente às ações de Israel.

Steven Mnuchin, que atuou como Secretário do Tesouro no governo Trump, anunciou suas intenções de comprar o TikTok e está formando uma equipe de investidores para juntar o dinheiro. Com um longo histórico no setor bancário, Mnuchin fundou a Liberty Strategic Investment em 2021. A empresa tem um escritório em Tel Aviv e, em janeiro, Mnuchin incentivou o investimento em Israel durante uma entrevista ao The Jerusalem Post, dizendo que “as oportunidades de tecnologia em Israel sempre foram um grande foco nosso”. 

As empresas de mídia social sediadas nos EUA já demonstraram sua disposição de censurar conteúdos pró-Palestina. Um relatório de dezembro da Human Rights Watch observa que “entre outubro e novembro de 2023, a Human Rights Watch documentou mais de 1.050 remoções e supressões de conteúdo [no] Instagram e Facebook que haviam sido postados por palestinos e seus apoiadores, inclusive sobre abusos de direitos humanos”. O Observatório Palestino para Violações de Direitos Digitais relata mais de 1.100 violações relacionadas à censura desde 7 de outubro. 

Deve-se observar também que o Vale do Silício representa uma grande força política em Washington. Juntamente com a regulamentação em relação à privacidade de dados, gigantes da tecnologia como Meta, Amazon, Google e Apple fizeram lobby ativo contra projetos de lei que promovem a concorrência no setor. De fato, a Meta – uma das principais concorrentes do TikTok – é uma das principais empresas a ter membros do Congresso como seus acionistas.

A proibição do TikTok é apenas uma vitória para o Vale do Silício e seus investidores

Proibir o TikTok, ou forçá-lo a ser vendido a uma empresa sediada nos Estados Unidos para continuar operando, teria um efeito inibidor sobre a capacidade das pessoas verem o que Israel está fazendo com os palestinos, com o apoio político, diplomático, militar e financeiro dos EUA. Essa proibição só seria benéfica para os gigantes da tecnologia dos EUA e seus investidores, e serviria como um trampolim para o crescente clima de confrontação que os Estados Unidos estão erguendo frente à China.

(*) Tradução de Raul Chiliani.

Liberation News o Liberation é o jornal do Party for Socialism and Liberation (PSL), dos Estados Unidos.

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