Quando o empresário singapuriano Patrick Soh viajou pela primeira vez a Pyongyang em 2008 para iniciar a instalação do primeiro restaurante fast food da República Popular Democrática da Coreia, ele se deu conta de uma realidade: os habitantes locais não tinham ideia do que era um hambúrguer ao estilo ocidental e não sabiam prepará-lo. Foi preciso que Soh os ensinasse desde o início: começando com os pães, depois com a carne empanada, finalizando com alface, queijo e maionese. A chegada dessa receita tão conhecida dos consumidores norte-americanos é um retrato simbólico das mudanças políticas no país de Kim Jong-un.
A experiência inédita para o empresário e para os norte-coreanos marcou a fundação da primeira filial da Samtaesong – “Três grandes estrelas”, em coreano –, restaurante inaugurado em abril de 2009, e fez de Soh um pioneiro na obtenção de uma licença para abrir uma lanchonete estrangeira em Pyongyang. O singapuriano que introduziu o hambúrguer na Coreia do Norte também opera a franquia asiática do minúsculo restaurante Waffletown USA, com sede em Virginia Beach, nos EUA.
Localizada na Bukit Timah Road, em Singapura, a franquia do Waffletown de que Soh é dono foi a lanchonete escolhida a dedo pelos próprios norte-coreanos para levar os petiscos tipicamente ocidentais até o “país mais fechado do mundo”. O empresário afirmou à Vice News que o governo de Kim Jong-il enviou uma delegação especialmente para Singapura para conhecer a comida das grandes cadeias de fast food.
Após experimentarem os lanches de redes mais populares como McDonald’s e KFC, a delegação preferiu o Waffletown. “Temos um frango frito muito bom. E também o waffle é algo diferente. Então, para a Coreia do Norte, o ex-líder, o pai, queria criar algo para os cidadãos, especialmente para fins familiares. É por isso que eles levaram o Waffletown para lá”, justificou Soh à Vice News.
O convite para abrir como joint-venture seu restaurante em Pyongyang foi direcionado também a outros dois empresários singapurianos, Quek Chek Lan e Timothy Tan. Quek já mantinha um relacionamento de mais de 30 anos com as autoridades norte-coreanas por meio de sua empresa, Aetna Group, que trabalha com o comércio de aço e minerais. Embora não fossem do ramo de fast food, foram atraídos pela ideia de investir em uma lanchonete na Coreia do Norte e contaram com a expertise de Soh para essa empreitada. “Não havia nada parecido lá naquela época. Era provavelmente o único país do mundo que não tinha fast food”, frisou Tan.
“Três grandes estrelas” de Pyongyang
O histórico restaurante na capital norte-coreana ganhou o nome de Samtaesong, ou “Três grandes estrelas”, supostamente em referência ao chefe de Estado à época, Kim Jong-il, seu pai, Kim Il-sung e sua mãe, Kim Jong-suk. O nome foi escolhido em coreano porque, até então, não era permitido que estabelecimentos comerciais tivessem sinalizações em inglês. Por outro aspecto, todo o processo de instalação da unidade foi, para Soh, surpreendentemente fácil, já que tudo foi fornecido pelo Estado. “A empresa não precisou comprar o terreno nem contratar trabalhadores. Tudo isso foi cedido”, reiterou.
De novidade inesperada, a Samtaesong se tornou uma sensação na Coreia do Norte e na mídia internacional, que chegou até a declarar que o restaurante tinha o melhor frango frito do país. Prova desse sucesso é a transformação do restaurante em uma rede com, ao todo, mais de 30 pontos de venda por toda Pyongyang. Segundo Soh, a Samtaesong conta com cinco grandes restaurantes e mais de 20 lojas de comida para viagem espalhadas pela cidade, ocupando localizações estratégicas perto de universidades, embaixadas estrangeiras e estações de metrô. Assim, a lanchonete virou um ponto de encontro, em especial, entre os estudantes, diplomatas e profissionais locais. “Não são somente os residentes locais que gostam da comida. Até os estrangeiros gostam”, confirmou o empresário à AFP.
Uma das possíveis explicações para tal popularidade pode estar no cardápio. A maior atração da Samtaesong são os hambúrgueres, ou “carne picada com pão”, como são chamados na Coreia do Norte. Logo no início do funcionamento da lanchonete em 2009, já eram vendidas cerca de 300 “carnes picadas com pão” por dia, de acordo com Soh. Outros pratos mais básicos integram o menu, como batatas fritas, waffles belgas, cachorro-quente e frango frito – este último particularmente popular por ser cozido no local e servido crocante. Em outro ponto de venda, as opções são mais sofisticadas, com uma ampla seleção de cafés, smoothies e até um prato com salsicha, ovo e queijo.
A rede de restaurantes também se adaptou às especificidades da gastronomia local. Ao contrário do Waffletown de Singapura, a Samtaesong serve cerveja – da famosa marca Taedonggang. Produzida pela Companhia Cervejeira Taedonggang desde 2002, a bebida apelidada de “Orgulho de Pyongyang” é resultado de um acordo entre o governo Kim Jong-il e a cervejaria britânica Usher, que transferiu a planta inteira de uma fábrica desativada de Trowbridge, na Inglaterra, para a capital norte-coreana. Além da cerveja tradicional, outra peculiaridade da Samtaesong é que os hambúrgueres são servidos com kimchi em vez de salada de repolho, e há uma maior variedade de vegetais para atender ao paladar da população local.
Na Samtaesong, o pagamento é aceito somente em euros ou dólares americanos. O preço de cada hambúrguer é de 1,90 euros, enquanto do frango frito é de três dólares. Já um combo de hambúrguer, batata frita e bebida custa cinco dólares, de acordo com o guia de viagens Koryo Tours. Os preços do cardápio permaneceram constantes nos últimos 10 anos. “Os preços não mudam porque tudo é muito barato lá. Que inflação?”, comentou Soh para o South China Morning Post.
De toda forma, Soh não é diretamente remunerado por seu trabalho quando está na Coreia do Norte, pois, segundo ele, “eles não têm permissão para dar dinheiro”. Como recompensa, ele recebe presentes – desde kimchi a vinho coreano –, ganha hospedagens nos melhores hotéis e é recepcionado com grandes jantares sempre que chega a Pyongyang. Perguntado pelo South China Morning Post sobre por que passa tanto tempo no país, o empresário alegou ter admiração pelo povo norte-coreano. “Suas vidas são difíceis, e eles não têm ninguém em quem confiar, mas construíram hotéis que são arranha-céus e um sistema de trem moderno sem se gabar deles”, disse ao jornal.
Retratos de uma nação em mudança
A admiração e o respeito que cultivou pelos norte-coreanos fez com que Soh – que costuma viajar para a para a Coreia do Norte três ou quatro vezes por ano – se tornasse um observador da vida cotidiana do país e de sua realidade social e política. Para a Yahoo News, ele destacou que a taxa de criminalidade de Pyongyang parecia ser “quase zero” e que a maioria dos moradores que ele conheceu eram educados, voltados para a família e “muito leais” ao próprio país. Também ressaltou que, como moradia, saúde e educação são fornecidas pelo Estado, os norte-coreanos pareciam “não ter pressões nem tensões” e “ser um povo muito feliz”.
Como visitante e investidor, o empresário não pôde deixar de constatar as mudanças no comportamento e nos hábitos dos norte-coreanos. “Muitos norte-coreanos também possuem telefones, tablets, laptops e usam e-mail regularmente. Antes, eu não tinha permissão para trazer meu celular, mas agora todos posam para uma selfie comigo”, destacou para o South China Morning Post. Ele atribui essa transformação à ascensão de Kim Jong-un à liderança do país em 2011, que, segundo ele, tem tornado o país mais aberto a parcerias com atores externos. O próprio Kim já fez uma visita à Samtaesong para comer seus hambúrgueres. “Eles queriam ajuda para atualizar sua fábrica de cerveja. Então, ajudei a trazer especialistas e investidores estrangeiros, e ficaram felizes em trabalhar com eles”, complementou Soh.
Entre os esforços de modernização levados a cabo por Kim Jong-un, Soh relatou que os norte-coreanos estão se tornando “mais empreendedores”. Ele mencionou, por exemplo, vendedores de alimentos que possuem seus próprios negócios, uma concessão representativa do que significaram as reformas implementadas desde a grave crise econômica da década de 1990. De acordo com a professora de Estudos do Japão Moderno na Universidade de Leiden, Katarzyna Cwiertka, houve uma explosão do “espírito empreendedor” no país, em particular após as “Medidas de Estimulação de Mercado” anunciadas pelas autoridades norte-coreanas em março de 2003. O número de pessoas envolvidas na fabricação de produtos artesanais, no comércio em mercados e outros negócios de pequena escala aumentou drasticamente. Segundo a pesquisadora, o governo não só deu a pequenas empresas comerciais e industriais permissão tácita para operar, mas soube lucrar com tais atividades.
As reformas também impactam no relacionamento da economia centralmente planificada com os investidores estrangeiros. O empresário Geoffrey See criou o grupo sem fins lucrativos Choson Exchange, voltado para ensinar técnicas de negócios a jovens norte-coreanos. Com sede também em Singapura, o Choson Exchange leva profissionais voluntários até a Coreia do Norte para oferecer oficinas e treinar os habitantes locais sobre marketing, política econômica e desenvolvimento do setor financeiro. Em contrapartida, norte-coreanos são enviados a Singapura para participarem de seminários sobre práticas empresariais. Mais de dois mil norte-coreanos já foram treinados pelo grupo desde a sua fundação em 2009, e a iniciativa já virou até um estudo de caso da Harvard Business School.
See é outro empresário que enxerga mudanças internas na condução da economia norte-coreana. Segundo ele, novas empresas estatais estão sendo criadas, porém são entregues a determinados indivíduos para administrá-las. “Eles são nomeados gerentes e têm uma boa autonomia para tomar decisões. Muitos deles desejam aprender mais sobre técnicas e ideias de negócios”, afirmou.
De Singapura para a Coreia
Esse ambiente econômico renovado desperta cada vez mais o interesse de companhias estrangeiras – sobretudo asiáticas – em investirem na Coreia do Norte. Nesse contexto, é sintomático que algumas das maiores demonstrações de disposição para negócios partam de empresários de Singapura.
Centro financeiro mundial, a pequena cidade-estado insular mantém vínculos comerciais com a Coreia do Norte há décadas. Como exemplo, em setembro de 2018, uma missão de negócios promovida pelo ex-acadêmico Michael Heng surpreendentemente atraiu mais de 20 grandes empresas singapurianas entusiasmadas com possíveis oportunidades no país. Empresas chinesas e vietnamitas também entraram em contato com Heng visando “aprender as regras de investimento na Coreia do Norte e decolar a partir de lá”. Para Chris Chua, gerente de uma empresa familiar de fabricação de roupas interessado na missão comercial, a Coreia do Norte é um “paraíso de negócios” com “oportunidades ilimitadas”. Chua disse ao jornal TODAY que passou a querer conhecer Pyongyang graças à cúpula Trump-Kim, realizada em junho de 2018.
De fato, Singapura foi palco da primeira cúpula entre um presidente norte-americano e um líder norte-coreano. O encontro aguçou o apetite da comunidade empresarial singapuriana na Coreia do Norte, obrigada a lidar com outras formas de barreira comercial, como as sanções econômicas impostas contra os norte-coreanos. “Trabalhamos com o setor de infraestrutura. Então, se a ONU decidir suspender as sanções comerciais e à medida que o país se desenvolve, definitivamente é aí que nossos produtos serão necessários”, enfatizou o empresário Andrew Sew.
Entretanto, não há o menor sinal de arrefecimento das sanções internacionais mais severas, o que afeta diretamente os laços econômicos entre singapurianos e norte-coreanos. O Ministério do Comércio e Indústria (MTI) de Singapura chegou a anunciar a revisão de suas legislações para adequá-las às resoluções do Conselho de Segurança da ONU e reiterou que os indivíduos e entidades envolvidos em missões comerciais na Coreia do Norte devem se ajustar a esses regulamentos.
Entre os impactados pelas sanções, está a Samtaesong, já que enfrentou a falta de ingredientes importados do exterior. “A última coisa que ouvi foi que o restaurante de fast food enfrentou alguns problemas para conseguir suprimentos, como maionese. Porém, os negócios ainda estão em andamento”, informou Patrick Soh. Em 2017, o empresário teve que interromper sua viagem anual à Coreia do Norte por conta da crise gerada pela pressão internacional após testes de mísseis nucleares. Em abril do ano seguinte, Soh relatou que o DBS Bank fechou abruptamente duas de suas contas bancárias, o que ele suspeita ser devido às suas relações com o país asiático, mesmo sem nunca ter conduzido qualquer “negócio ilegal”.
Outro setor prejudicado são as chamadas “lojas de Singapura” em Pyongyang, estabelecimentos comerciais que vendem de tudo – desde vodka ucraniana a marcas chinesas falsificadas. De acordo com o jornalista Eric Talmadge, da Associated Press, essas lojas de departamento são especializadas no comércio de artigos de luxo, atendendo principalmente a empresários chineses e membros do corpo diplomático. Conhecidas como Potonggang Ryugyong Shop e Bugsae Shop, esses pontos de venda são ligados ao OCN Group de Singapura – até pouco tempo, o grupo tinha seu logo impresso nas sacolas de plástico da Bugsae Shop.
São lojas bem-localizadas em Pyongyang, estão sempre abertas à visitação e distribuem até cartões de fidelidade a clientes regulares. As compras podem ser feitas em dólares, euros e iuanes. Por meio da Potonggang Ryugyong Shop e Bugsae Shop, chegam à Coreia do Norte eletrodomésticos, utensílios domésticos, jóias, roupas, cosméticos, perfumes, produtos de higiene, lanches, refrigerantes, vinhos e outras bebidas alcoólicas – tudo trazido de países como Japão, Malásia e China. Essas importações consistem em uma flagrante violação às resoluções do Conselho de Segurança da ONU, o que obriga as lojas a fazerem estoques dessas mercadorias.
Singapura não é o único país habituado a burlar as sanções internacionais para resguardar relações econômicas com a Coreia do Norte. Aliada geopolítica histórica dos norte-coreanos, a China permanece como uma parceira comercial crucial. Os chineses compartilham uma conexão ferroviária e voos quase diários entre Pequim e Pyongyang, por meio dos quais é feito o transporte de uma ampla variedade de mercadorias, incluindo parte dos produtos que ocupam as prateleiras das “lojas de Singapura”. Além da integração com os chineses, há a presença de companhias de outros países, como a Orascom do Egito, que ajudou a estruturar o sistema de telefonia móvel norte-coreano, e a HB Oil da Mongólia, que adquiriu 20% de participação em uma refinaria na zona econômica especial de Rason.
Sabor da Coreia do Norte mundo afora
Se a chegada de uma lanchonete fast food ocidental à Coreia do Norte configura uma novidade pouco conhecida, tão curiosos quanto são os restaurantes norte-coreanos instalados em outros países e operados pelo governo de Pyongyang. Eles compõem uma rede que, em seu auge, contou com mais de 100 pontos de venda na China, Sudeste Asiático, Rússia e Leste Europeu, de acordo com o professor de Economia da Universidade Nacional de Seul, Kim Byung-yeon. Pelo menos três desses estabelecimentos continuaram funcionando em Phnom Penh, capital do Camboja, oferecendo iguarias da culinária norte-coreana, como ginseng e vinho de mirtilo.
O objetivo desses restaurantes é gerar receita para a Coreia do Norte, driblando o bloqueio econômico. De acordo com uma reportagem da jornalista Sheridan Prasso para a Bloomberg, todos os três restaurantes em Phnom Penh apresentavam garçonetes usando crachás nas cores vermelho e azul da bandeira norte-coreana e, além de servirem as refeições, cantam, tocam e dançam. Segundo a apuração da Bloomberg, os três estabelecimentos contavam com funcionários tanto norte-coreanos como cambojanos.
Localizado no bairro da capital cambojana que concentra as embaixadas estrangeiras, o Pyongyang Traditional Restaurant servia pratos típicos da Coreia do Norte, como bibimbap e macarrão de trigo sarraceno, e disponibilizava à venda revistas e produtos norte-coreanos. Já o segundo restaurante, o Pyongyang Unhasu, fica no noroeste de Phnom Penh e tinha no cardápio cerveja e vinho feitos com mirtilos da floresta do Monte Paektu. Por fim, o Pyongyang Arirang, terceiro restaurante, fica em uma rua movimentada na esquina de vários ministérios governamentais.
Contudo, o acirramento do cerco ao governo norte-coreano tem dificultado continuamente que a receita desses restaurantes retorne a Pyongyang. As resoluções da ONU ordenam a suspensão das transferências de dinheiro de bancos chineses para a Coreia do Norte e ameaçam fechar contas acusadas de apoiar o governo, asfixiando suas fontes de recursos. “As sanções da ONU exigem que os países congelem bens e recursos que apoiam os programas de armas”, explicou à Bloomberg o funcionário dos Departamentos de Estado e do Tesouro dos EUA, Anthony Ruggiero. Elas também determinaram a repatriação dos norte-coreanos que trabalham no exterior até dezembro de 2019.
O próprio funcionamento dessa rede de restaurantes já consiste em uma violação das sanções do Conselho de Segurança da ONU. A Resolução 2375 de setembro de 2017 proibiu “a operação de todas as joint-ventures ou entidades cooperativas, novas e existentes, com entidades ou indivíduos da República Popular Democrática da Coreia, agindo para ou em nome da RPDC”.
Como consequência dessa pressão externa, em janeiro de 2020, o Camboja apresentou à ONU um relatório comunicando o fechamento de empresas e contas bancárias norte-coreanas e a deportação de todos os trabalhadores. Entre os alvos das sanções, o documento listou 115 trabalhadores, 12 empresas e oito restaurantes, incluindo os três mapeados pela reportagem da Bloomberg. “O Camboja sempre aderiu à sua posição firme de apoiar a não-proliferação de armas de destruição em massa para a eliminação completa dessas armas”, diz a introdução do relatório.
Em troca das sanções, um McDonald’s para Kim
O levantamento rápido das sanções internacionais esteve entre os principais assuntos na mesa de negociações dos encontros entre Kim Jong-un e Donald Trump. Da parte dos norte-americanos, insistiu-se na posição de que Kim abandonasse primeiro seu arsenal nuclear para que depois, em troca, houvesse um relaxamento das sanções.
Em meio a impasses e desconfianças de cada lado, uma informação inusitada foi divulgada pela mídia norte-americana durante os preparativos para a cúpula Trump-Kim em Singapura. Um relatório da CIA, divulgado pela NBC News, concluiu que talvez a Coreia do Norte não estivesse disposta a se desnuclearizar, mas que poderia fazer concessões. Uma delas, na avaliação de três oficiais da inteligência dos EUA, seria considerar abrir uma franquia de fast food ocidental em Pyongyang como uma demonstração de boa vontade.
Segundo o The Times, um conselheiro próximo do presidente sul-coreano, Moon Jae-in, reproduziu a mesma história veiculada pela CIA, sugerindo que funcionários do governo norte-coreano com que teve contato viam a possibilidade de investimentos empresariais norte-americanos como um importante fiador da segurança de seu Estado. Como exemplo, o conselheiro citou a abertura de um Trump Hotel ou uma filial do McDonald’s em Pyongyang.
Essa não seria a primeira vez que uma cadeia de fast food norte-americana teria servido de objeto de discussões diplomáticas. A chamada “diplomacia do hambúrguer” fez sua aparição com a abertura do primeiro McDonald’s na União Soviética em 1990, quando cerca de 30 mil pessoas fizeram fila nas ruas de Moscou no dia da inauguração. A chegada da marca que é símbolo do American way of life à capital russa foi resultado de anos de lobby do dono da franquia canadense do McDonald’s, George Cohon, sobre as autoridades soviéticas.
Os oficiais da inteligência norte-americana parecem ter tentado replicar a estratégia nas negociações com a Coreia do Norte e, embora o relatório da CIA não especifique qual rede de lanchonetes seria convidada, é conhecida a preferência de Trump pelo McDonald’s. Antes de chegar à presidência, durante um comício de campanha em Atlanta em junho de 2016, Trump chegou a declarar ter vontade de conversar com Kim Jong-un sobre hambúrgueres e batatas fritas. “Devíamos comer um hambúrguer em uma mesa de conferência e fazer negócios melhores com a China e outros países”, disse Trump na ocasião.
O que o ex-presidente norte-americano talvez não soubesse à época é que o gosto do tradicional fast food dos EUA já havia aportado em Pyongyang pelas mãos dos singapurianos – ironicamente, burlando as sanções impostas por Washington. Apesar das barreiras políticas, culturais e econômicas enfrentadas pela sua lanchonete Samtaesong, o empresário Patrick Soh continua trabalhando com seus parceiros de negócios norte-coreanos, que ele considera “amigos”, para atrair mais investimentos estrangeiros para o país asiático: “Sou um lutador, gosto de desafios. A Coreia do Norte é um lugar que as pessoas podem procurar para negócios de risco. Quero ver as pessoas melhorando e tendo uma vida melhor”.