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A imprensa não impõe presidentes

Grande mídia pode instalar agendas, gerar marcos e coibir imagem de políticas, mas não consegue mais modificar todos os sentidos comuns e barrar candidatos.
Grande mídia pode instalar agendas, gerar marcos e coibir imagem de políticas, mas não consegue mais modificar todos os sentidos comuns e barrar candidatos. Por Alfredo Serrano Mancilla | CELAG – Tradução de Pedro Marin para a Revista Opera

Sei que o título é bastante provocador. Mas, não por isso, deixa de ser verdade. Apesar de que, para dizer a verdade, para que fosse completamente exato faltou que dissesse que “nem sempre impõe presidente”.

Quem poderia negar o poder que a imprensa ostenta? Ninguém.

No entanto, sobrevalorizar seu poder seria tão errático quanto subestimá-lo.

Nas últimas pesquisas que fizemos no Centro Estratégico Latino-Americano de Geopolítica (CELAG), detectamos que em muitos países da América Latina a maior parte dos cidadãos não crê no que nos “contam” os grandes meios de comunicação. Por exemplo, na Argentina, em abril de 2019, a poucos meses da data das eleições presidenciais, somente 24% considerava que os meios informavam corretamente. Na Bolívia, também alguns meses antes das eleições de outubro de 2020, este valor era de 20% (o resto pensava que os meios faziam propaganda). No México, em junho desse mesmo ano, o conglomerado Televisa tinha um cômputo em seu favor de 29%. No Chile, também em 2020, a imagem positiva da imprensa não chegava a 30%. No Peru, em março de 2021, um dos canais mais importantes do país, o América TV, tinha um índice de credibilidade de 27%. E, para mencionar um último caso, deveríamos olhar à Colômbia: nem a revista Semana nem o canal Caracol ou o RCN conseguiam alcançar 30% de confiança no final do ano passado.

Em nenhum desses países a imprensa conseguiu impor “seu candidato”. Ou, dito de outro modo: não pôde impedir que a opção progressista ganhasse as eleições.

Por que isso ocorre, apesar do poder que têm e que exercem?

Em primeiro lugar, porque em muitas ocasiões se desconectaram do que de fato preocupa o povo no seu cotidiano. Caíram no mesmo erro que criticam na classe política: viver em sua própria bolha.

Em segundo lugar, porque geralmente acabam dirigindo-se exclusivamente a seu próprio público, ou seja, convencem os que já estão convencidos.

 Leia também – Dividindo a informação, informando a divisão: capitalismo e agências de notícia 

Em terceiro lugar, porque têm um manual obsoleto que não sabem como renovar. O melhor exemplo é a cantilena de que “se ganha a esquerda, o país virará uma Venezuela”. Essa mensagem não influi no dia-a-dia, a não ser entre aqueles que jamais votariam por tal alternativa ideológica. No CELAG fizemos essa pergunta em vários países, e os dados são eloquentes: a) para a Argentina, somente 28% estava de acordo com essa tese no caso de Alberto [Fernandez] e Cristina [Kirchner] ganharem. b) No Chile, 29%. c) Na Colômbia, com [Gustavo] Petro –  e se tratando seguramente da campanha mais dura nesse sentido – o valor estava abaixo dos 40% (ou seja, aqueles que nunca votariam em Petro).

Em quarto lugar, porque estamos em uma época de tanta oferta e consumo midiático que consultar a imprensa se converteu mais em um modo de entretenimento do que em uma via real para informar-se. Ademais, a imediatez e o efêmero se impõem sobre a veracidade.

Em quinto lugar, porque as redes sociais alargaram tanto as formas de informar e comunicar que reduziram a capacidade da imprensa tradicional de concentrar a atenção e a fidelidade das maiorias.

Nenhuma destas razões deveria nos levar à conclusão de que os grandes meios não são mais fortes o suficiente para gerar marcos, instalar agendas, coibir a imagem de uma política e para muito mais, mas isso não significa que consigam modificar todos os sentidos comuns e imaginários. Seria um enorme erro “presenteá-los” com uma importância maior que a que têm, porque isso implicaria dar como perdida uma batalha política que se pode ganhar, como tem sido demonstrado na América Latina nos últimos anos. E Petro é só o caso mais recente; seguramente não será o último.–≠

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