As igrejas Assembleia de Deus, Batista e Universal do Reino de Deus (IURD) são as denominações com maior representatividade entre os deputados federais evangélicos empossados para a atual Legislatura (2023-2027), na Câmara dos Deputados. Elas reúnem 58% dos 93 parlamentares vinculados a igrejas evangélicas, segundo levantamento da Assembleia de Deus, Batista e IURD reúnem 58% dos 93 parlamentares evangélicos empossados na atual Legislatura, realizado a partir do monitoramento de candidaturas com identidade religiosa, do Instituto de Estudos da Religião (Iser).
Outras igrejas com unidades em vários estados, como a Presbiteriana, a Mundial do Poder de Deus e a Internacional da Graça de Deus, também conseguiram eleger deputados federais. Ao todo, 513 deputados federais tomaram posse na última quarta-feira (1).
A Assembleia de Deus, maior denominação do Brasil, é a igreja com mais representantes eleitos para a atual Legislatura. São 25 deputados federais assembleianos entre os 93 evangélicos. Mas há muitas ramificações. Entre os deputados, por exemplo, Sostenes Cavalcanti (PL-RJ), presidente da Frente Parlamentar Evangélica (FPE) é ligado à Assembleia de Deus Vitória em Cristo, do pastor Silas Malafaia, uma das lideranças evangélicas mais próximas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Já o vice-presidente da FPE, que reúne 132 deputados e 14 senadores – uma das principais forças políticas no Congresso Nacional, Cezinha de Madureira (PSD), frequenta a Assembleia de Deus Ministério de Madureira, liderada pelo bispo Manoel Ferreira, ex-deputado pelo PL de Pernambuco.
A FPE é diferente da bancada evangélica, um agrupamento informal de representantes, que priorizam os valores religiosos em seus posicionamentos. A Frente, por outro lado, tem signatários não necessariamente atrelados à fé evangélica, mas que orientam votos em grupo. Historicamente, a FPE se articula na defesa de pautas conservadoras, como o Estatuto do Nascituro, que pretende acabar com o aborto legal no Brasil.
Para além de frequentar uma determinada congregação, os parlamentares podem ser representantes políticos das denominações, defendendo interesses das igrejas às quais são ligados. É o caso de Cezinha Madureira, representante político da Assembleia de Deus Ministério de Madureira. À Pública, o parlamentar explicou que sua função é “auxiliar o líder nacional da igreja”, mas que “não possui cargo administrativo”. “Eu sou o representante da igreja, que hoje significa quase 40% da nação. Outros grupos, como os índios, também têm sua parcela de representação e seus representantes, correto?”, disse. Ele não detalhou que tipos de auxílios mobiliza para o bispo e para a Assembleia de Deus dentro do Congresso Nacional.
A também assembleiana Ministério do Belém, segunda maior denominação do Brasil, é liderada pelo pastor José Wellington da Costa, outro líder evangélico próximo de Bolsonaro. Os deputados federais Silas Câmara (PL-SP) e Paulo Freire da Costa (Republicanos-AM) fazem parte dessa congregação.
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“É importante lembrar que a articulação política das Assembleias vem de muito antes. A convenção geral das Assembleias de Deus (AD) tentou, inclusive, criar um partido político, o Partido Republicano Cristão (PRC), em 2016, mas não obteve o número necessário de assinaturas. Antes disso, a AD também ocupou fortemente o Partido Social Cristão (PSC), partido que elegeu nomes como Marco Feliciano e Pastor Everaldo”, aponta Magali Cunha, pesquisadora do Iser.
A Igreja Batista é a segunda em termos de representatividade entre os deputados federais empossados para a nova Legislatura. São 15 parlamentares. Os batistas tradicionais são representados pela Convenção Batista Brasileira (CBB), que reúne mais de 8 mil igrejas, mas há outras subdivisões, com liturgias distintas.
Entre os parlamentares evangélicos empossados, há dois ligados à Batista da Lagoinha, liderada pelo pastor André Valadão: André Janones (Avante-MG), que atuou fortemente na campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Nely Aquino (PODEMOS-MG). No mosaico evangélico na Câmara dos Deputados, a igreja Presbiteriana do Brasil tem três parlamentares eleitos. A denominação liderada pelo reverendo Roberto Brasileiro Silva, e que tem o ministro do STF André Mendonça entre seus membros mais ilustres, considerou criar uma comissão interna que orientaria pastores sobre “a contradição entre o marxismo e suas variantes”, no ano passado. O projeto foi rejeitado durante o Supremo Concílio, órgão máximo de deliberação da igreja.
Fundada pelo apóstolo Valdemiro Santiago, outra liderança evangélica bolsonarista, a megaigreja Mundial do Poder de Deus tem dois representantes eleitos para esta Legislatura. Já a Internacional da Graça de Deus, fundada pelo missionário e televangelista R.R Soares, garantiu a eleição de Franciane Bayer (Republicanos-RS) e seus dois filhos, David e Marcos Soares, ambos filiados ao União Brasil.
Novo perfil evangélico na Câmara dos Deputados
Se é verdade que o campo evangélico é um quebra-cabeças de denominações, crenças e liturgias, é fato também que a nova ala evangélica na Câmara dos Deputados é igualmente diversa, tanto em espectros partidários quanto em atuações políticas. De fato, os evangélicos nunca foram um bloco monolítico no poder. Os parlamentares divergem recorrentemente, inclusive em relação às pautas ditas morais, consideradas fator aglutinador do grupo.
“O decreto que flexibilizou as regras para compra e uso de armas e munições demonstra isso. Grande parte dos membros da FPE não apoiou a pauta armamentista, por considerá-la anti-cristã e anti-humana, por se contrapor à defesa da vida”, afirma a pesquisadora do Iser, Lívia Reis, em artigo publicado em parceria com outra pesquisadora do instituto, Ana Carolina Evangelista.
O bolsonarismo, contudo, foi um agrupador dessa ala historicamente fragmentada, segundo o pesquisador Rafael Rodrigues. “Desde 2018 aconteceu uma união de denominações que eram adversárias históricas, como a Universal e a Renascer, em torno da pessoa e do projeto do Bolsonaro”.
Na visão dele, o Bolsonarismo mudou profundamente a forma como os evangélicos se movimentam politicamente. “Passou a não ser sobre uma denominação específica, mas uma união na guerra contra a esquerda”. Esse pacto cristão conservador amplo permitiria, ainda, a união entre evangélicos e católicos na defesa de algumas pautas, como uma maior criminalização do aborto. Nesse campo, diz Rodrigues, alguns dos parlamentares mais atuantes são a deputada federal Chris Tonietto (PL-RJ), ligada ao grupo católico ultraconservador Centro Dom Bosco, e o deputado Eros Biondini (PL-MG), pertencente à Renovação Carismática da Igreja Católica.
A socióloga e pesquisadora Laryssa Owseany, uma das condutoras do levantamento do Iser, destaca ainda uma recorrência visível nas últimas eleições: “Os candidatos usam menos a denominação de ‘irmão’ ou ‘pastor’, ou mesmo os ‘bispos’ ligados à Universal, que preferem se candidatar sem evidenciar os cargos nas igrejas’.
Há ainda, segundo Rafael Rodrigues, deputados que, embora ligados a uma denominação específica, são adotados por um grupo de igrejas que compartilha valores e ideologias. O deputado federal mais votado da história de Minas Gerais, Nikolas Ferreira (PL-MG), é um exemplo dessa identificação denominacional fluida. O parlamentar bolsonarista frequenta a Comunidade Evangélica da Graça e Paz, mas foi abraçado por diferentes denominações e lideranças evangélicas, como André Valadão e o deputado federal Marco Feliciano (PL-SP). Nas redes sociais, Nikolas se define apenas como “cristão”. Ele está sendo investigado pelo Ministério Público por incitar atos criminosos no dia 8 de janeiro, em Brasília. Outro deputada evangélica empossada, Clarissa Tércio (PP-PE), também está sendo investigada por apoiar os atos de 8 de janeiro nas redes sociais.