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EUA querem uma mudança de regime no Líbano, não o fim do massacre israelense

Em meio aos bombardeios israelenses, Washington tem tentado impor novas eleições no Líbano, com o fim de isolar o Hezbollah como força política no país
Joyce Chediac
Um tanque israelense em operação durante a Guerra no Líbano em 2006. (Foto: IDF / Wikimedia Commons)

A diplomacia de vaivém dos EUA no Líbano não tem como fim resolver a situação no país, nem fazer com que Israel pare os bombardeios, o que o Líbano precisa com urgência. Na realidade, o objetivo dos EUA é usar o bombardeio em massa de Israel sobre as áreas civis do Líbano como instrumento de pressão para provocar uma mudança de regime no país.

Washington está tentando impor eleições presidenciais com o apoio militar israelense e para instalar um presidente-cliente dos EUA no Líbano. Washington e seu proxy, Israel, buscam restringir o poder do Hezbollah, a resistência libanesa, que é forte tanto no governo quanto no terreno, para destruí-lo, se possível, e, se isso não funcionar, fomentar uma guerra civil no Líbano.

No dia 22 de outubro, o porta-voz do Departamento de Estado, Vedant Patel, explicou que “o objetivo dos EUA é fazer com que o governo e o Líbano deixem de estar sob controle do Hezbollah”.

As autoridades do governo libanês explicaram ao enviado oficial dos EUA, Amos Hochstein, que, para realizar eleições, seria necessário reconvocar o parlamento. Eles pediram a Hochstein a garantia de que Israel não bombardeasse um Parlamento reunido, já que o Hezbollah, com seus aliados xiitas e cristãos, tem 68 dos 128 assentos no Parlamento. O enviado norte-americano não ofereceu tal garantia.

O Exército libanês nunca defendeu a soberania do Líbano

Os EUA querem instalar como presidente seu homem, o chefe do Exército libanês, Joseph Aoun. Isso ocorre porque os EUA controlam o Exército libanês. Eles apoiam, armam e treinam mais de 32 mil soldados libaneses. Durante anos, os EUA operaram até mesmo uma unidade de comando ligada ao Exército, dirigida pelas forças de Operações Especiais dos EUA e sob o codinome Lion Hunter.

Washington fornece ao Exército libanês armas que estão três gerações atrasadas, muitas delas obsoletas. Isso para garantir que ele nunca possa estabelecer um confronto significativo contra Israel, a quem o Pentágono fornece os melhores e mais recentes spywares e armamentos. O exército libanês sequer tem permissão dos EUA para revidar quando é atacado por Israel.

O Exército libanês foi criado como uma força para combater rebeliões internas, não para defender o Líbano. De fato, ele nunca defendeu a soberania libanesa de ameaças externas. Atualmente, o Exército libanês se retirou do sul, onde ocorrem os combates, para o norte do Líbano. Ele está se afastando e deixando para os combatentes do Hezbollah a tarefa de enfrentar os bombardeios israelenses e a invasão terrestre.

Civis como alvos em massa

A necessidade mais imediata no Líbano não é a realização de novas eleições, mas sim que Israel pare com os bombardeios. Desde 23 de setembro, Israel tem bombardeado e destruído indiscriminadamente vilarejos inteiros no sul e bombardeado repetidamente o sul de Beirute e o Vale do Beqaa. Os bombardeios mataram e feriram milhares de pessoas e fizeram com que mais de um milhão de pessoas, um quinto da população do país, se tornassem refugiados, sem ter para onde ir.

Israel destruiu seis prédios em um bairro densamente povoado de Beirute para assassinar um homem, o secretário-geral do Hezbollah, Hassan Nasrallah, e continua bombardeando casas na região. O exército israelense teve como alvo deliberado jornalistas e profissionais da área de saúde, voltando a bombardear a região para atingir os socorristas. Ele bombardeia hospitais, alegando que são alvos militares.

Suas explosões de pagers e walkie-talkies aterrorizaram a população civil, já que centenas de administradores, equipes médicas, crianças em suas casas, transeuntes em mercados e outras pessoas perderam os olhos e as mãos nos ataques.

O conflito não começou em outubro

As potências ocidentais e sua imprensa corporativa atribuem ao Hezbollah a culpa pelo início da agressão porque, em 8 de outubro de 2023, o grupo começou a disparar foguetes contra alvos militares em Israel em solidariedade à luta palestina em Gaza. Eles convenientemente esquecem que o Ocidente vem atacando o Líbano desde 1916, quando dividiu a Ásia Ocidental em colônias. Toda vez que o povo libanês se levantou para fazer valer seu direito à independência e à autodeterminação, as potências estrangeiras enviaram tropas ou proxies armados para impedi-lo.

A interferência direta dos EUA começou em 1958, quando enviaram os fuzileiros navais para impedir a derrubada de um governo pró-Ocidente instalado no país.

Israel, o proxy do Pentágono, bombardeia civis palestinos e libaneses no Líbano à vontade há décadas, especialmente as cidades, os vilarejos e os campos de refugiados palestinos no sul. Israel invadiu o Líbano seis vezes. Sua invasão em 1982 matou 20 mil pessoas, sitiou Beirute por dois meses e depois ocupou o sul do Líbano por 18 anos.

Somente entre 1968 e 1973, Israel realizou 2 mil incursões ao Líbano, entrando à vontade, assassinando pessoas que desaprovava, detonando carros-bomba e cartas-bomba e destruindo propriedades. O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, fazia parte de um esquadrão de terror que, em 1968, incendiou toda a frota de aeronaves civis no aeroporto de Beirute.

Tudo isso ocorreu antes mesmo da existência do Hezbollah ou do Hamas. Na verdade, o Hezbollah foi formado para combater os bombardeios israelenses e a ocupação do sul do Líbano. Desde então, libertou o Líbano de Israel duas vezes, em 2000 e 2006. Sua capacidade de dissuasão manteve o sul do Líbano livre de bombardeios israelenses de 2006 até o ano passado. Essa foi a primeira vez que o Líbano foi atingido. O grupo é visto no mundo árabe como “o movimento de resistência árabe mais importante e eficaz na história da resistência árabe a Israel”, de acordo com As’ad Abukhalil, analista político libanês.

As condições de Israel e do Hezbollah para um cessar-fogo

Apesar de enfraquecido pelos ataques israelenses, o Hezbollah continua a atingir alvos militares em Israel, enquanto resiste a uma investida israelense no front. O grupo diz que vai parar quando Israel pôr fim à sua guerra contra Gaza. As condições de Israel para o cessar-fogo no Líbano, por sua vez, são permitir que Israel opere dentro do território libanês à vontade e liberdade de movimento para a força aérea de Israel no espaço aéreo do Líbano. Isso é exatamente o que Israel fez nas décadas antes da existência do Hezbollah.

Fomentando a guerra civil

Enquanto isso, em 9 de outubro, o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu fez um ultimato ao Líbano. “O país pode ter paz, mas somente se o povo se levantar contra o Hezbollah”, disse. Trata-se de uma tentativa de fomentar uma guerra civil no país. O ultimato foi feito após um aviso do ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant , em junho, de que Israel poderia infligir “danos massivos” ao Líbano e mandá-lo “de volta à Idade da Pedra”. Para enfatizar essas ameaças, Israel bombardeou Aitou, uma pequena vila cristã no norte do país, porque ela havia aceitado e abrigado refugiados xiitas que fugiam dos bombardeios no sul.

Há fascistas declarados no Líbano que certamente gostariam de ver um governo pró-Israel no país. Há também uma elite corrupta na folha de pagamento da Arábia Saudita, dos Emirados Árabes Unidos e dos EUA que está constantemente falando mal do Hezbollah e tentando instigar divisões sectárias entre os 18 grupos religiosos do Líbano. Mas será que Israel conseguirá instigar uma guerra civil?

Muitos fatores mitigam essa possibilidade.

Não estamos na década de 1980. As pessoas sabem que Israel desempenhou um papel negativo enorme na guerra civil de 1975-90, e que está abertamente tentando instigar outra. Nenhuma família libanesa deixou de ser afetada por essa guerra, que se arrastou por 15 anos, resultando em 150 mil mortes de libaneses e enorme sofrimento.

No Líbano, neste momento, há muita solidariedade. A selvageria e a depravação do ataque israelense a Gaza uniu o povo libanês como árabes, e os motivou a apoiarem as ações do Hezbollah em solidariedade a Gaza. Tal solidariedade não está apenas nas comunidades xiitas, onde o Hezbollah está sediado e que representa cerca de 30% da população, mas também entre cristãos, sunitas e drusos – todos os setores religiosos. Eles abriram seus corações e seus lares para os refugiados que se deslocam para o norte devido ao bombardeio israelense. Eles consideram que todo o país está sendo atacado por Israel, e respeitam os homens que o defendem.

O Hezbollah é sancionado pelos Estados Unidos e seus combatentes são rotulados de forma sorrateira na mídia norte-americana como “proxies do Irã”. Essa imprensa não menciona que os combatentes estão defendendo suas cidades natais, nas quais seus ancestrais viveram por milênios e onde alguns tiveram que reconstruir suas casas até dez vezes ao longo dos anos, devido aos ataques israelenses.

Hoje, esses combatentes contam com o apoio de muitas pessoas em todas as comunidades libanesas, que sabem que, em toda a história do Líbano, os combatentes da resistência foram os únicos que repeliram os ataques israelenses e defenderam o país. O povo do Líbano está esperando que eles façam Israel recuar mais uma vez e torcendo pelo seu sucesso.

(*) Tradução de Raul Chiliani

Liberation News o Liberation é o jornal do Party for Socialism and Liberation (PSL), dos Estados Unidos.

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