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Quem é quem na crise do Níger?

No Níger, as potências ocidentais preferem usar representantes regionais para suas intervenções em nome da “democracia” em vez de travar uma guerra direta
Walter Smolarek
Antony Blinken, e LLoyd Austin, em reunião com o ex-presidente nigerino Mohamed Bazoum e outros chefes de Estados africanos. (Foto: Chad J. McNeeley / Departamento de Defesa dos EUA)

A derrubada militar do governo no Níger foi respondida com ameaças de uma invasão orquestrada pelo imperialismo que poderia desencadear uma guerra em toda a região. A situação está evoluindo rapidamente, e a cada dia que passa há uma intensificação da luta. Todas as pessoas que se opõem ao militarismo dos EUA e apoiam a independência dos povos da África devem prestar muita atenção a essa frente crítica de luta. Esses seis atores chave desempenharão um papel central no resultado dos eventos dramáticos que estão se desenrolando.

O novo governo nigerino

Em 26 de julho, os militares do Níger depuseram o governo pró-ocidental de Mohamed Bazoum. Esse esforço foi liderado pelo comandante da Guarda Presidencial, general Abdourahmane Tchiani. O golpe de Tchiani foi apoiado pela maior parte dos militares, que agora governam o país por meio do Conselho Nacional para a Salvaguarda da Pátria, formando um gabinete provisório em 10 de agosto. O Conselho ainda está nos primeiros dias de articulação de seu programa político e econômico, mas declarou que seu objetivo é acabar com a dominação neocolonial que o Níger vem sofrendo há décadas sob a França e os Estados Unidos. Essa declaração foi recebida com amplo apoio popular. A expressão mais massiva disso ocorreu em 6 de agosto, quando aproximadamente 30 mil pessoas lotaram um estádio para um ato em repúdio às ameaças de intervenção estrangeira. Também houve protestos combativos na embaixada francesa.

O governo nigerino deposto

Sob o governo de Bazoum, o Níger tornou-se um dos últimos redutos remanescentes da influência militar e política ocidental. Uma aliança militar liderada pela França vem supostamente travando uma guerra contra grupos armados de fanáticos religiosos na região – que estão mais fortes do que nunca – há quase dez anos. Mas à medida que o povo da África Ocidental se levanta contra essa campanha militar e a relação neocolonial que ela pretende proteger, há cada vez menos países dispostos a receber tropas ocidentais. O Comando Africano do Departamento de Defesa dos EUA mantém uma enorme instalação de drones na Base Aérea 201 do Níger, perto da cidade de Agadez. O estabelecimento dessa base foi o maior projeto de construção já realizado pela Força Aérea dos EUA. O Pentágono tem cerca de 1.100 soldados alocados no Níger, e a França tem aproximadamente 1.500. Bazoum está atualmente em prisão domiciliar e enfrenta acusações de alta traição por conspirar com potências estrangeiras para minar a soberania de seu país.

CEDEAO

A Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental foi formada em 1975 e atualmente tem 15 estados-membros. Ela sempre funcionou como uma ferramenta para as potências ocidentais coordenarem as políticas de seus regimes-clientes leais na região. A CEDEAO mantém uma “força de prontidão” militar composta por tropas de diferentes estados-membros. Os estados da CEDEAO já suspenderam a participação do Níger na organização e impuseram sanções econômicas contra o país, mas agora ameaçam dar um passo além e realizar uma invasão. As potências imperialistas ocidentais preferem usar representantes regionais como a CEDEAO para realizar intervenções em nome da “democracia” em vez de correr o risco de travar uma guerra direta. Em uma cúpula realizada em 6 de agosto, a CEDEAO concordou em ativar sua força de prontidão, mas ainda não se comprometeu com detalhes específicos para uma intervenção militar.

Governos do Mali, Burkina Faso e Guiné

Uma onda de golpes nos últimos anos estabeleceu um bloco de governos que reivindicaram a soberania de suas nações e buscaram uma política externa e de segurança independente. Em 2021, o coronel Assimi Goïta assumiu o poder no Mali. O coronel Mamady Doumbouya seguiu o exemplo na Guiné no final daquele ano e, em setembro passado, o capitão Ibrahim Traoré tornou-se o presidente interino de Burkina Faso. Eles expressaram sua oposição à fracassada campanha de contrainsurgência liderada pela França e buscaram alianças com outros parceiros, inclusive a Rússia, para proteger seus países. Mali e Burkina Faso declararam que uma invasão do Níger pela CEDEAO seria considerada uma declaração de guerra contra seus países, e a Guiné também é aliada do novo governo do Níger. Esses novos governos – juntamente com o novo governo do Níger – contam com a participação de funcionários civis e militares que ocupavam posições de destaque na elite tradicional, mas que, ao mesmo tempo, estão expressando posições a favor da independência. A partir dessa situação contraditória, várias correntes e trajetórias políticas diferentes podem surgir à medida que os novos governos lidam com a realidade da busca pelo desenvolvimento nacional em um contexto econômico dominado por bancos e corporações ocidentais.

Movimentos populares da África Ocidental

A África Ocidental tem uma longa tradição de movimentos de massa que lutam pela independência e pelo socialismo. As organizações de esquerda observaram as possibilidades políticas que se abriram como resultado dessa onda regional de sentimento anticolonial e o perigo extremo que uma intervenção da CEDEAO apoiada pelo imperialismo representaria. O Movimento Socialista de Gana apontou que ” os verdadeiros beneficiários de um ataque da CEDEAO ao Níger são as forças imperialistas ocidentais. A França está lutando para manter gerações de pilhagem e opressão cruéis que os africanos ocidentais rejeitaram. Sem o urânio nigerino, os custos de eletricidade da França aumentarão significativamente, mergulhando o país em uma crise ainda maior.” A rede regional West African People’s Organization [Organização dos Povos da África Ocidental] exigiu que “a soberania do povo nigerino, em todas as situações, deve ser respeitada, pois somente ele está em posição de decidir a direção futura de seu país, e mais ninguém”. E o Partido Comunista do Benin declarou que “os povos africanos e os da nossa sub-região estão engajados em uma luta até a morte contra as potências imperialistas e, em particular, contra o FrançAfrique [sistema de dominação regional pela França]. Todos aqueles que se opuserem a essa marcha inexorável serão relegados à lata de lixo da história.”

Os governos da França e dos EUA

As potências imperialistas dominantes na região, a França e os Estados Unidos, estão profundamente preocupadas com o fato de seu domínio sobre a África Ocidental estar cedendo em um momento em que todo o continente se tornou uma área prioritária para a nova “grande competição de poder” da Guerra Fria contra a Rússia e a China. A pilhagem dos recursos do Níger é especialmente crucial para a França, que depende muito do urânio do país. Para os Estados Unidos, o Níger é um posto militar importante, pois o Pentágono busca expandir o seu Comando Africano. Eles querem restaurar o antigo governo no Níger, mas têm medo de se envolver diretamente em combates mortais e em uma ocupação potencialmente longa e custosa. Por isso, querem que seus fantoches regionais travem a luta por eles. A ministra das Relações Exteriores, Catherine Colonna, disse que a França “apoia com firmeza e determinação os esforços da CEDEAO para derrotar essa tentativa de golpe”. Há também indicações de que o bem-estar do ex-presidente Bazoum poderia ser o pretexto para uma invasão que seria anunciada ao público como uma missão de resgate. O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, disse em 10 de agosto: “Assim como a CEDEAO, os Estados Unidos responsabilizarão o Conselho para a Salvaguarda da Pátria pela segurança e proteção do presidente Bazoum, de sua família e dos membros do governo detidos”.

Liberation News o Liberation é o jornal do Party for Socialism and Liberation (PSL), dos Estados Unidos.

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