As Forças Armadas do Brasil, compostas pelo Exército, Marinha e Aeronáutica, oficialmente não aceitam críticas que porventura sejam dirigidas contra elas pelo poder Legislativo. É o que fica claro com a nota emitida hoje (7) pelos comandantes das três Forças e pelo ministro da Defesa. “As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro” diz a nota que constitui, em si, um ataque a um Senado que, apesar de pouco fazer na defesa da democracia e da liberdade do povo brasileiro – como certamente as Forças Armadas enlameadas em golpes desde a origem também pouco fazem – foi por ele, mal ou bem, ou bem mal, eleito.
Para saber disso, não precisaríamos de nota alguma. Afinal, nesta mesma semana o Ministro general de Exército e presidente do Superior Tribunal Militar, Luis Carlos Gomes Mattos – o hábil transgressor do qual falei há algumas semanas – escreveu coluna na Folha de São Paulo na qual defende o julgamento de civis que “venham a incorrer no crime de ofensa às Forças Armadas” pela Justiça Militar da União (JMU). Diz que “o crime é de ofensa e não de crítica” e que “as Forças Armadas, como qualquer outra instituição, não estão livres de cometer erros e tomar decisões equivocadas. Quando isso ocorre, não pode ser imune a comentários contrários e críticas a essas ações. Esse é um comportamento normal, presente em qualquer nação democrática, e que está na mente dos nossos chefes militares. A crítica, que serve como alerta, que surge como uma proposta de correção de rumo, é, e sempre será, bem-vinda, desde que balizada pela verdade.”
Critico, portanto, distante de qualquer ofensa e balizado pela verdade, o ultraje da nota militar que diz que “as Forças Armadas do Brasil, ciosas de se constituírem fator essencial da estabilidade do País, pautam-se pela fiel observância da Lei e, acima de tudo, pelo equilíbrio, ponderação e comprometidas, desde o início da pandemia [de (sic)] Covid-19, em preservar e salvar vidas”. De fato, a nota afirma que as Forças Armadas estão “ciosas de se constituírem fator essencial da estabilidade do País”; percebemos que não são ciosas da estabilidade do País em si, mas ciosas de se constituírem em fator essencial para tanto. Como as Forças Armadas são destinadas, segundo a lei que dizem observar, “à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”, só se pode concluir que, estando ciosas por se constituírem em fator essencial da estabilidade do País, as Forças estão ciosas pelo ataque à Pátria, a precaridade dos poderes constitucionais, ou o ilícito e a desordem, únicas ocasiões em que, em observância à lei, as Forças Armadas poderiam se constituir em fator essencial da estabilidade do País.
Como é isso que diz a nota, e há evidente contradição em forças de defesa que desejem a guerra, ou as Forças Armadas se equivocam na lógica e na redação, ou são – e assumem-se – inimigas do País. Esperemos que a desorientação dos generais, que andam distantes de onde deveriam estar, seja textual e lógica, não moral; que dobrem as línguas, não o povo.
“A paz queremos com fervor,
A guerra só nos causa dor.”