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Eleições na Coreia do Sul: o partido da oposição triunfa e o presidente Yoon enfrenta desafios diplomáticos e internos

Vitória da oposição impõe desafios ao presidente Yoon, que tem mantido alinhamento estreito com EUA e Japão e enfrentado inflação crescente e greves
Pranjal Pandey
Lee Jae-myung, líder do Partido Democrático da Coreia, durante sua campanha presidencial em 2021. (Foto: 고려 / Wikicommons)

O partido de oposição liberal da Coreia do Sul garantiu uma ampla maioria nas eleições gerais do país, mantendo o controle do parlamento. O Partido Democrático (PD), liderado por Lee Jae-myung, conquistou 175 das 300 cadeiras da Assembleia Nacional. Essa eleição é amplamente interpretada como uma avaliação de meio de mandato do presidente Yoon Suk Yeol, que ainda tem três anos de mandato pela frente. Após os resultados, o líder de seu partido, Han Dong-hoon, deixou o cargo, e o primeiro-ministro Han Duck-soo apresentou sua renúncia.

O Sr. Yoon e seu Partido do Poder Popular (PPP) sofreram um revés significativo, lutando para avançar sua agenda em uma legislatura controlada pelo PD. Com a vitória do PD, o partido agora tem a capacidade de acelerar e avançar as iniciativas legislativas no parlamento. O PD e o PPP utilizam estrategicamente partidos satélites para otimizar seus votos dentro da estrutura eleitoral da Coreia do Sul, em que certas cadeiras são alocadas para partidos menores, cuja representação não corresponde proporcionalmente ao seu apoio geral.

Os partidos satélites são entidades políticas menores que se alinham a partidos políticos maiores e mais estabelecidos. Eles geralmente compartilham ideologias ou objetivos semelhantes e cooperam estrategicamente durante as eleições para maximizar sua participação coletiva na parcela de votos.

Após sua apertada derrota para o Sr. Yoon na eleição presidencial de 2022, Lee Jae-myung, do Partido Democrático, está se preparando para outra candidatura presidencial. Esta eleição marca quase dois anos desde que o presidente conservador Yoon Suk Yeol garantiu a vitória na corrida presidencial de 2022 por uma margem mínima de 0,73%, a mais estreita da história sul-coreana, prevalecendo sobre Lee.

Em nível nacional, a Coreia do Sul realiza dois tipos principais de eleições: eleições presidenciais, em que os cidadãos elegem diretamente o presidente para um único mandato de cinco anos, e eleições para a Assembleia Nacional, que determinam a composição do órgão legislativo composto por 300 membros. Esses membros têm um mandato de quatro anos. Entre eles, 254 são eleitos por meio de círculos eleitorais de assento único, enquanto os 46 membros restantes são selecionados por meio de um sistema de representação proporcional. No sistema de representação proporcional, os eleitores votam em partidos políticos em vez de candidatos individuais, e a proporção de votos que cada partido recebe determina a alocação de suas cadeiras na Assembleia Nacional.

Na eleição geral sul-coreana de 2024, três partidos políticos principais competiram por assentos na Assembleia Nacional. Com 175 cadeiras conquistadas, o Partido Democrático tornou-se o maior partido. O Partido do Poder Popular (PPP), no poder, garantiu 108 assentos, enquanto o Partido da Reconstrução da Coreia (PRC), liderado pelo ex-ministro da Justiça Cho Kuk, conquistou 12 assentos. Notavelmente, o PRC obteve suas cadeiras somente por meio de representação proporcional, sem apresentar candidatos para cargos distritais. O comparecimento geral dos eleitores foi de 67%, marcando o maior comparecimento em 32 anos. Aproximadamente 44 milhões de pessoas estavam aptas a votar na eleição para a Assembleia Nacional, realizada em 10 de abril de 2024.

Principais questões

O aumento do custo de vida e a inflação surgiram como as principais preocupações dos eleitores, principalmente a escalada dos preços de produtos essenciais, como vegetais. Durante a campanha eleitoral, a visita do presidente Yoon Suk-yeol a um supermercado despertou a atenção para a questão, concentrando-se no preço da cebolinha. Ao observar um pacote de cebolinha com preço de 875 won (US$ 0,65), ele comentou: “Já estive em muitos mercados e esse parece ser um preço razoável”. No entanto, relatos da imprensa sul-coreana afirmam que as cebolinhas normalmente são vendidas por três ou quatro vezes esse valor e a mídia local informou que a loja havia reduzido o preço do vegetal antes da visita de Yoon.

Em março de 2024, a taxa de inflação anual da Coreia do Sul era de 3,1%. Os principais fatores que contribuíram para essa tendência inflacionária foram o aumento dos preços dos alimentos frescos e da energia. Em março, os preços dos produtos agrícolas subiram mais de 20% em comparação com o mesmo mês do ano passado.

Outra grande preocupação durante a eleição foi a greve dos médicos. Todos os médicos estagiários e residentes e médicos em atividade estão se unindo contra a proposta de Yoon de aumentar em dois terços a cota anual de admissão em faculdades de medicina para mitigar a falta de médicos. Eles alegam que as universidades estão mal preparadas para lidar com um aumento tão substancial na entrada de estudantes, o que poderia comprometer os serviços médicos futuros.

Apesar da população sul-coreana estar envelhecendo rapidamente e de sua baixa proporção de médicos em relação à população em comparação com outras nações desenvolvidas, as tentativas de aumentar a capacidade das faculdades de medicina sempre encontraram resistência dos médicos e dos estudantes de medicina em exercício, resultando em obstáculos políticos significativos.

Em um primeiro momento, a proposta de Yoon recebeu o apoio do público. No entanto, a crescente pressão por um acordo surgiu como resultado das greves médicas em andamento, fazendo com que várias cirurgias fossem canceladas e o atendimento aos pacientes fosse prejudicado.

Implicações

A vitória do principal partido de oposição indica a continuidade das relações tensas entre o presidente Yoon e o corpo legislativo. Desde que assumiu o cargo, o presidente Yoon tem enfrentado uma oposição sistemática às suas políticas internas por parte da Assembleia Nacional, que é amplamente controlada pela oposição, com aproximadamente 60% dos assentos. Até janeiro de 2024, apenas 29,2% dos projetos de lei apresentados à Assembleia Nacional haviam sido transformados em lei, uma queda significativa em relação à taxa de aprovação de 61,4% observada no governo anterior.

Há meses, o presidente Yoon vem lutando com baixos índices de aprovação, o que impede seus esforços para cumprir suas promessas de cortes de impostos, desregulamentação e maior apoio às famílias na sociedade que envelhece mais rapidamente no mundo.

A política externa do governo Yoon tem se caracterizado por um alinhamento persistente com os Estados Unidos e o Japão, ao mesmo tempo em que distancia a Coreia do Sul da China. Desde que assumiu o cargo, Yoon vem interrompendo ativamente as relações diplomáticas relativamente equilibradas mantidas pelas administrações anteriores e prejudicando significativamente as relações entre a China e a Coreia do Sul.

O alinhamento de Yoon com os Estados Unidos também afetou negativamente os interesses do povo sul-coreano. Por exemplo, no âmbito econômico, a Coreia do Sul priorizou a conformidade com os controles de exportação de semicondutores dos EUA em relação à  China. Anteriormente, a Coreia do Sul desfrutava de uma estreita cooperação com a China, resultando em um superávit comercial significativo. No entanto, desde que entrou para a aliança “Chip 4”, proposta pelos EUA, a Coreia do Sul sofreu perdas consideráveis, enquanto enfrentava advertências dos EUA contra o preenchimento do vazio no mercado chinês. A política externa de Yoon prejudicou as relações entre a China e a Coreia do Sul, exacerbando as questões comerciais e econômicas e corroendo o apoio público a ele.

Ao se deparar com o descarte de águas residuais contaminadas por energia nuclear no oceano por parte do Japão, Yoon encenou um ato simbólico de comer frutos do mar, mas não tomou medidas substanciais em resposta aos protestos públicos generalizados.

No entanto, se prevê que a postura da política externa da Coreia do Sul, incluindo sua cooperação trilateral com os Estados Unidos e o Japão, permanecerá relativamente inalterada. É improvável que os resultados das eleições exerçam influência significativa nos assuntos internacionais, e o presidente mantém uma autonomia considerável para seguir sua agenda. Espera-se que Yoon mantenha uma postura mais assertiva em relação à Coreia do Norte. Sua abordagem em relação à Coreia do Norte contrasta fortemente com a da administração progressista anterior, enfatizando as negociações e o engajamento.

(*) Este artigo foi produzido pela Globetrotter. Pranjal Pandey, jornalista e editor localizado em Delhi, editou sete livros que cobrem uma série de questões disponíveis no LeftWord. Você pode explorar suas contribuições jornalísticas no NewsClick.in.

(*) Tradução de Raul Chiliani

Globetrotter O Globetrotter é um serviço independente de notícias e análises internacionais voltado aos povos do Sul Global.

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