Na guerra, sempre se usaram drogas ou derivados. Muitos guerreiros entraram em combate drogados ou embriagados como forma de superar o medo e aumentar sua resistência ou energia no campo de batalha. Desde os hoplitas gregos até as forças especiais dos Estados Unidos, passando pelos vikings, a história militar está repleta de exemplos do uso de entorpecentes.
O álcool, um uso comum na batalha
O uso do álcool antes da batalha é, talvez, o elemento mais popular entre as civilizações – exceto no islamismo. Ele era usado principalmente para mitigar o medo e como estimulante. Os astecas, por exemplo, bebiam uma bebida chamada “pulque” ou “aguamiel”, uma bebida fermentada tradicional.
Os hoplitas – soldados de infantaria pesada da Grécia Antiga –, antes das batalhas, embriagavam-se com vinho, muitas vezes excessivamente, pois chegavam à luta totalmente bêbados.
Embora não fosse a única coisa que ingeriam, como atesta Homero na Ilíada, um antigo poema épico grego: os helenos também fumavam grandes quantidades de ópio, principalmente como analgésico para suportar a dor dos ferimentos.
Os exemplos se multiplicam ao longo da história. Na Guerra dos Cem Anos, antes da batalha de Agincourt, em 1415, os soldados franceses beberam sem moderação, sendo aniquilados pelos arqueiros ingleses. Durante as guerras napoleônicas, na batalha de Austerlitz, em 1805, as divisões de infantaria receberam uma dose tripla de conhaque com o objetivo de incitar as tropas ao combate.
O autor Lukasz Kamienski, em seu livro As drogas na guerra, documenta que, na segunda metade do século 19, os 36 mil homens do exército britânico consumiam cerca de dois milhões de litros de rum por ano. Além disso, no século 18, cada soldado britânico destacado às colônias americanas ingeria uma média de 87 litros de rum por ano.
Fica claro que o álcool tem sido utilizado ao longo de todas as épocas. Outro exemplo é o uso da vodca no exército russo, ou o testemunho de um soldado alemão na frente oriental durante a Segunda Guerra Mundial: “a vodca purga o cérebro e dilata as forças. Com isso, esqueço que tenho sete pedaços de estilhaços no corpo”.
As drogas na guerra ao longo da história
Assim como o álcool, o uso de narcóticos entre os guerreiros tem sido comum ao longo da história como uma forma de se preparar e superar o medo da batalha. Outro uso poderia ser o de suportar a dor dos ferimentos, como já foi comentado com o ópio na Grécia Antiga. Um caso muito conhecido é o dos vikings berserkers, que consumiam cogumelos alucinógenos – como o Amanita Muscaria – para entrar em um estado de euforia e frenesi, assim como os guerreiros zulus, que ingeriam plantas “mágicas”.
A seita islâmica dos assassinos nizaris, atualmente conhecida pela saga de videogames Assassin’s Creed, era grande consumidora de haxixe; daí o nome hashashins.
Durante a campanha do Egito, os soldados de Napoleão consumiram grandes quantidades dessa droga para tentar se distrair do calor, com péssimas consequências, pois, por estarem tão drogados, era mais difícil para eles se posicionarem em formação diante dos ataques da cavalaria mameluca.
O uso de calmantes para mitigar a dor em contextos bélicos tem sido uma constante, como já apontamos no caso do ópio. Outro exemplo é a morfina, que durante a Guerra da Secessão Americana foi distribuída em grandes quantidades como analgésico, o que resultou em uma epidemia massiva de dependência entre os veteranos.
Embora tenha sido no século 20 que o uso massivo de drogas pelos soldados passou a ocorrer, durante a Primeira Guerra Mundial houve um aumento brutal na demanda e no consumo de cocaína, tanto que boa parte de sua produção passou da região dos Andes para as Índias Orientais Holandesas.
A cocaína era consumida principalmente pelos ases de caça alemães. Também era administrada aos soldados australianos em Gallipoli e fornecida regularmente às tropas britânicas na forma de grageas. O objetivo era claro: aumentar o ânimo e a energia dos combatentes, já muito enfraquecidos pelo horror da batalha.
Durante a Guerra Fria, explorou-se o uso de drogas como arma de guerra. Um dos planos americanos previa lançar LSD sobre as tropas soviéticas para desorientá-las. Também surgiram ideias bastante descabidas, como a proposta dos Estados Unidos de bombardear com feromônios, com o objetivo de desencadear o descontrole sexual entre os soldados inimigos.
Lukasz Kamienski relata em seu livro que a primeira guerra verdadeiramente farmacológica foi a do Vietnã, na qual 60% dos soldados americanos fumavam maconha. Em 1973, 70% dos soldados consumiam algum tipo de droga, fosse maconha, dexedrina (anfetamina), heroína, morfina, ópio, sedativos ou alucinógenos. O exército americano chegou a implementar um programa de análise de urina em massa, chamado Operação Fluxo Dourado. Devido a esse consumo generalizado, o exército dos EUA começou a ser chamado de “exército viciado”.
Na década de 1990, a Frente Revolucionária Unida em Serra Leoa consumia grandes quantidades de drogas – maconha misturada com pólvora –, que eram administradas especialmente às crianças-soldados. Costumavam fazê-lo através de cortes na pele para que a substância agisse mais rapidamente.
Atualmente, os combatentes jihadistas são os grandes consumidores de drogas na guerra. Em novembro de 2008, o grupo Lashkar-e-Toiba da Caxemira enfrentou durante 60 horas as forças especiais indianas graças à cocaína, ao LSD e aos esteróides. Da mesma forma, o captagon ou fenetilina é a droga por excelência do Estado Islâmico. Inventada em 1961, ela age como as anfetaminas: atenua o medo, suprime a dor e é altamente viciante.
Mas os jihadistas não são os únicos: o exército americano fornece dextroanfetamina aos seus pilotos, embora de forma limitada e controlada. Além disso, há indícios de que a China descobriu um estimulante de última geração chamado night eagle com possíveis usos militares.
As drogas na Segunda Guerra Mundial
O século 20 representou um ponto de inflexão no que diz respeito ao uso massivo de drogas na guerra. Tanto os exércitos do Eixo quanto os Aliados impulsionaram o consumo de anfetamina e metanfetamina para combater o sono de seus soldados, bem como estimular sua coragem e reforçar sua resistência física.
Os nazistas foram pioneiros no uso da anfetamina ou speed para fins militares, criando para isso a pervitina, que aumentava a atenção, eliminava a necessidade de dormir e diminuía o medo. Em 1940, os alemães receberam mais de 35 milhões de comprimidos de pervitina. Essa droga foi particularmente usada por tanquistas e aviadores nas invasões da Polônia e da França.
O abuso da metanfetamina causou graves problemas de saúde, atitudes violentas e indisciplina entre os soldados, pelo que seu uso foi reduzido e destinado exclusivamente às tropas de elite. O próprio Hitler tornou-se viciado em drogas, segundo revelou seu médico, que desde 1943 lhe injetava diariamente um coquetel que incluía esteróides, opiáceos e dezenas de outras substâncias.
No entanto, não foram apenas os alemães que recorreram às drogas na Segunda Guerra Mundial: os exércitos britânico e americano também o fizeram. O consumo de speed foi massivo nas batalhas do Pacífico e da África. Os aviadores britânicos ingeriram grandes quantidades desta substância para enfrentar o cansaço das longas jornadas de voo no Atlântico.
Alguns autores afirmam que seu uso foi fundamental para a vitória sobre a aviação alemã na Batalha da Inglaterra em 1940. Na Batalha de El Alamein, na África, o general britânico Montgomery, pouco antes da ofensiva, mandou distribuir 100 mil comprimidos de benzedrina – anfetaminas – entre suas tropas, na esperança de que isso influenciasse uma vitória sobre Rommel.
Na operação Market Garden, realizada posteriormente na Holanda, os paraquedistas britânicos também recorreram à benzedrina para poderem superar as exigências dos combates. Estima-se que os britânicos consumiram um total de 72 milhões de comprimidos de anfetaminas durante a guerra.
Em 1942, as forças aéreas americanas adquiriram grandes quantidades de benzedrina, usada pelos pilotos de bombardeiros para suas longas missões na Alemanha e no Japão. Foi no ano seguinte que seu consumo passou para as tropas terrestres, especialmente no Pacífico, para combater o medo que lhes causavam os ataques suicidas dos japoneses. Segundo alguns autores, os americanos consumiram entre 250 mil e 500 mil comprimidos dessa droga.
No entanto, também se consumiam drogas no outro lado do Pacífico, pois muitos dos kamikazes japoneses estavam drogados com ópio e metanfetamina quando realizavam seus ataques suicidas. Neste caso, os japoneses recorriam ao philopon.
E a União Soviética? Foi a única potência que se absteve do uso massivo de estupefacientes. Os soldados soviéticos tomavam vodca, valeriana em infusões e, excepcionalmente, cocaína para combater a fadiga. Ainda assim, curiosamente, em 1939-1940, teve que enfrentar o país com maior consumo legal e medicinal de heroína per capita: a Finlândia.
O exército finlandês, em sua guerra contra a União Soviética, fez uso massivo de heroína, morfina e ópio, principalmente para combater o terrível frio do inverno, além da dor dos ferimentos e infecções. Em 1941, com a retomada da guerra, o exército finlandês distribuiu 250 milhões de comprimidos de heroína e morfina.
Além disso, como o governo finlandês era aliado do Terceiro Reich, a Finlândia adquiriu da Alemanha 850 mil comprimidos de pervitina para suas unidades especiais. Como curiosidade, segundo depoimentos de soldados finlandeses, era recomendável que apenas o esquiador líder das unidades de elite tomasse anfetamina, pois havia o risco de que os soldados iniciassem uma corrida para ver quem chegava primeiro.
Como podemos notar, as drogas e a guerra sempre estiveram ligadas ao longo da história. Apesar da grande documentação existente sobre o assunto, ainda hoje existe um leve tabu em relação à representação desse fato na cultura popular, talvez com a exceção da Guerra do Vietnã. Assim como as táticas e o armamento, as drogas sofreram uma evolução à medida que a guerra avançava, passando do consumo de ópio para o consumo massivo de comprimidos.
(*) Tradução de Raul Chiliani




































