Quando eu fundei a Revista Opera, o fiz por um motivo simples: por ter percebido, na flor da juventude, que a maior parte do que se chama por jornalismo tem pouco a ver com a verdade. Quis e aprendi a ser jornalista vendo, lendo e principalmente ouvindo um jornalismo estéril, ruim, às vezes mentiroso e geralmente inábil. Foi assim, escutando as reclamações de meu pai a cada vez que um repórter ou apresentador falava uma besteira, que me formei; aprendi a amar a verdade como oposição ao ódio à mentira, e me ergui à tarefa pela crença de que poderia fazer um trabalho melhor, e por perceber que meu ódio poderia frutificar em infinitos veículos.
Mas ele não poderia frutificar contra o Wikileaks. A quantidade e a qualidade do material publicado pelo site constituem um Index Librorum Prohibitorum, atualizado correntemente, do poder global. E a publicação de tais arquivos – retirados diretamente das correspondências de autoridades de todo mundo, inclusive de grandes companhias – têm e tiveram efeitos práticos. Não se trata somente do lendário vídeo “Assassinato Colateral”, que expunha soldados norte-americanos assassinando friamente civis e jornalistas no Iraque. Nas eleições presidenciais norte-americanas de 2016, soubemos por exemplo do complô formado pelo Partido Democrata com Hillary Clinton para impedir o avanço da candidatura de Bernie sanders. Naquele mesmo ano, enquanto se derrubava Dilma Rousseff, foi também por emails vazados pelo Wikileaks, publicados cinco anos antes, que pudemos confirmar algumas relações de Temer com os norte-americanos. E foi durante a polêmica quanto ao lançamento do filme “A Entrevista” que pudemos descobrir que a Sony, gigante distribuidora do mercado de cinema, mantinha estreitos laços com o poder, e servia como uma caixa de propaganda contra a Palestina, a Rússia, o Estado Islâmico, etc.
O Wikileaks é, literalmente, uma enciclopédia de vazamentos. A cada fato político novo, se pode recorrer a seu arquivo gigantesco para conferir, com clareza, a posição dos atores envolvidos, em mensagens que não foram pensadas para serem declarações públicas. E é assim que se mostram hipócritas: não só por mentirem ao público, e terem tais mentiras expostas, mas por quererem julgar aqueles que expuseram suas mentiras criminosas enquanto são perdoados pelos seus próprios crimes, comprovados.
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Ontem seu fundador, Julian Assange, foi arrastado da embaixada do Ecuador em Londres, onde se encontrava exilado, para ser extraditado e julgado nos EUA. Não é só possível, como também provável, que seja também arrastado da vida. Mas daqui a mil anos será ainda figura relevante, lembrado nos livros de História como um herói, um defensor da verdade injustiçado, como fora Galileu, enquanto seus capatazes serão no melhor dos casos figuras antiquadas e odientas e, no pior, esquecidas. O traidor Lenín Moreno, presidente do Equador que autorizou a captura de Assange, não será sequer um grão de sal no longo cozido da História.
Assange, como na ampulheta que é símbolo de seu site, é uma gota de verdade do velho mundo, que terá lugar garantido no novo. Seus inimigos poderão viver, em carne, alguns anos mais – mas na História morrerão. Esta é a diferença entre os que morrem pela verdade e os que matam pela mentira. E aqueles jornalistas e veículos estéreis, ruins, às vezes mentirosos e geralmente inábeis que não defenderem a honra de Assange, apesar de tanto falarem sobre a verdade, estarão no barco destes últimos.