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Robert F. Williams e sua Luger

A história de um homem que em uma cidade de 12 mil pessoas, onde, estimam os jornais da época, 7,5 mil pertenciam à KKK, respondeu à altura: com armas.

A história de um homem que em uma cidade de 12 mil pessoas, onde, estimam os jornais da época, 7,5 mil pertenciam à KKK, respondeu à altura: com armas. Por Pedro Marin | Revista Opera
Robert F. Williams e sua esposa, Mabel Williams, posam com armas. Robert, ironicamente, segura uma Luger – pistola queridinha dos nazistas durante a Segunda Guerra.

Muito se conhece sobre a resistência negra ao racismo americano nos anos 60 e 70. Muitos são os que conhecem Malcolm X, Martin Luther King e os Panteras Negras. Uma figura importantíssima, no entanto, foi deixada de lado: Robert F. Williams.

Robert nasceu em Monroe, no estado da Carolina do Norte, em 1925. Em 1944, entra pros Marines, a divisão de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos, por prometerem dar educação gratuita para os alistados – promessa não cumprida para Robert. Alguns anos depois, tornaria-se um herói da resistência, inspirando figuras como Huey P. Newton, co-fundador dos Panteras Negras.

“Eu voltei pro Sul quando saí do serviço [militar], e as pessoas começaram a fazer manifestações. E uma irmã negra estava sentada num banquinho, tentando comprar um sanduíche e eles [os brancos] apagavam cigarros nos pescoços dos negros, nas costas e batiam neles com correntes na cidade onde eu morava [Monroe]. E em determinado momento os brancos apareceram e bateram em 18 mulheres, no meio da rua. Mas nós nos levantamos e fizemos algo”, conta Robert.

“Quando ele voltou pra Monroe, ele virou o Presidente da NAACP (National Association for the Advancement of Colored People), e a Corte Suprema tinha proibido a segregação em escolas públicas, então começamos a nos organizar na comunidade, unindo as pessoas” conta Mabel Williams, esposa e companheira de luta de Robert.

A NAACP mantinha na época uma luta não-violenta em Monroe contra a segregação, que era respondida à bala pela Ku Klux Klan. A perseguição aos negros por parte da polícia e a Ku Klux Klan forçou Robert Williams a revisar suas táticas, e no fim dos anos 50 ele cria a Guarda Negra Armada (Black Armed Guard), com cerca de 60 homens determinados a defender a comunidade negra de Monroe de ataques racistas.

Robert, de pé, no meio, com alguns combatentes da Black Armed Guard.
Robert, de pé, no meio, com alguns combatentes da Black Armed Guard.

A imprensa da época estimava que a seção de Monroe da Ku Klux Klan tivesse cerca de 7.500 membros, enquanto a cidade tinha apenas 12 mil habitantes. No verão de 1957 rondavam rumores de que a KKK planejava um ataque à residência de Albert Perry, físico negro e vice-presidente da NAACP. Robert Williams e seus homens fizeram uma barricada e protegeram a casa, e a ameaça se confirmou: a Guarda Negra Armada trocou tiros com membros da KKK, que correram, com seus carros, covardemente.

Em 1958, Robert ficou conhecido por defender David Simpson, de 7 anos, e James Hanover Thompson, de 9, no caso que ficou conhecido como “Kissing Case.” As duas crianças foram presas por darem um beijo na bochecha de outra criança – essa branca – durante um jogo. Eles foram acusados de molestarem a criança, e sentenciados a ficar em um reformatório até completarem 21 anos. A acusação causou revolta internacional, e depois de três meses de detenção, David e James foram perdoados pelo governador da Carolina do Norte.

Em 1959, Robert Williams debateu sobre a não-violência com Marthin Luther King, durante a convenção da NAACP. Depois do debate, sua presidência em Monroe foi suspendida por 6 meses, pela discordância de Williams com a liderança nacional. Em 1961 uma grande campanha dos “Freedom Riders” começa em Monroe, contra a segregação em viagens de ônibus interestaduais. Piquetes foram erguidos pela cidade, e protestos aconteciam em quase todos os bairros.

Durante as manifestações, um casal branco dirigiu-se até um dos guetos negro da cidade, tentando evitar os protestos na região central. Intimidados pela massa furiosa, foram levados à casa de Robert Williams. Robert disse que podiam ir embora, mas acabou percebendo que não era seguro. Eles foram levados a uma outra casa, até que os ânimos se acalmassem. Por isso, Robert Williams foi acusado de ter sequestrado o casal. O FBI distribuiu cartazes à procura do “sequestrador armado”, assinados pelo Diretor do FBI, J. Edgar Hoover – o mesmo que em alguns anos declararia que o Partido dos Panteras Negras era “a maior ameaça à segurança nacional” dos Estados Unidos.

Presidente Mao autografa "O Livro Vermelho" de Robert.
Presidente Mao autografa “O Livro Vermelho” de Robert.

Perseguido pelo FBI, Robert se exila em Cuba, de onde escreve seu livro “Negros com armas” e trabalha em sua estação de rádio, a Radio Free Dixie, e em seu jornal, The Crusader. Em 1965 sai de Cuba e vai pra China, onde encontra-se com o Presidente Mao Tsé-Tung.

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