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Assata Shakur: um símbolo de resistência vitoriosa

Assata Shakur segue representando um chamado à resistência: contra o racismo, o imperialismo e todas as formas de opressão

John Parker
Assata Shakur em abril de 1981. (Foto: Trenton Times / Wikimedia Commons)
Assata Shakur em abril de 1981. (Foto: Trenton Times / Wikimedia Commons)

Não surpreende que Assata Shakur não seja um dos nomes mais conhecidos da história dos Estados Unidos — embora devesse ser.

Isso é o esperado quando se trata de heróis negros. Por isso, precisamos garantir que essa mulher negra e sua relevância para o nosso movimento permaneçam visíveis.

Como Assata disse em uma carta aberta ao nosso movimento:

“Como a maioria das pessoas pobres e oprimidas nos Estados Unidos, não tenho voz. Os negros, os pobres nos EUA, não têm liberdade real de fala, liberdade real de expressão e muito pouca liberdade de imprensa. A imprensa negra e a mídia progressista desempenharam historicamente um papel essencial na luta por justiça social. Precisamos continuar e expandir essa tradição. Precisamos criar meios de comunicação que ajudem a educar nosso povo e nossas crianças — e não a destruir suas mentes.”

As décadas de 1960 e 1970 testemunharam frequentes armações e assassinatos de líderes negros nos movimentos de libertação pelo FBI, especialmente contra o Partido dos Panteras Negras, como no assassinato de Fred Hampton em Chicago, em 1969.

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Sendo integrante dos Panteras Negras e do Exército de Libertação Negra — constantemente ameaçados pela polícia — o que aconteceu com Assata em 2 de maio de 1973 era apenas questão de tempo.

Zayd Malik Shakur, Sundiata Acoli e Assata foram parados por patrulheiros rodoviários na New Jersey Turnpike, supostamente por causa de uma “luz traseira defeituosa”.

Assata foi ordenada a levantar as mãos e, em seguida, baleada no peito e nas costas. Ao defendê-la, Zayd foi morto. Um dos policiais, Werner Foester, também morreu, e Assata foi condenada à prisão perpétua, acusada de homicídio e tentativa de homicídio — mesmo depois de laudos médicos comprovarem que ela fora baleada com as mãos erguidas.

Em 1979, porém, seus companheiros a ajudaram a fugir da prisão. E em 1984, soube-se que ela havia recebido asilo do povo cubano. O presidente Fidel Castro, em nome de Cuba, tinha um histórico de defesa do direito à autodefesa e à autodeterminação do povo africano em Angola, além de manter solidariedade contínua com líderes da libertação negra nos Estados Unidos.

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Assata pôde viver sua vida, honrada pelo povo cubano, permanecendo na ilha como educadora.

Quando a notícia do asilo veio a público, a polícia de Nova Jersey ficou tão indignada que chegou a pedir ao Papa João Paulo II, em visita a Cuba, que ajudasse em sua extradição para os EUA. Ao saber disso, Assata escreveu uma carta ao Papa para apresentar o outro lado da história:

“A brutalidade policial é uma ocorrência diária em nossas comunidades. A polícia tem praticamente uma licença para matar — e mata: crianças, avós, qualquer pessoa que considerem inimiga. Atiram primeiro e perguntam depois. Dentro das cadeias e prisões, há tanta brutalidade quanto havia nas plantações escravistas. Um número cada vez maior de prisioneiros é encontrado morto por enforcamento em suas celas.

Os Estados Unidos estão se tornando uma terra cada vez mais hostil para negros e outros povos racializados. O racismo corre solto e a xenofobia cresce. Isso é especialmente evidente na política interna. Os políticos tentam culpar os negros e outros povos de cor pelos problemas sociais. Há ataques a praticamente todos os programas de ação afirmativa criados para corrigir os efeitos acumulados de séculos de escravidão e discriminação. Além disso, o governo parece decidido a eliminar os programas sociais que prestam assistência aos pobres, resultando em uma situação em que milhões não têm acesso a cuidados básicos de saúde, moradia digna ou educação de qualidade.”

Sim, a história se repete — e a administração Trump deixa isso claro. Também é evidente que o avanço rumo ao fascismo e ao genocídio não começou com Trump.

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A Penitenciária de Clinton foi onde Assata cumpria sua pena de prisão perpétua. Embora não tenha sido batizada em homenagem a Bill Clinton, o nome cai bem. Seu governo ajudou a manter presos políticos atrás das grades e os transformou em alvos de assassinato, ao mesmo tempo em que se juntou ao clube de democratas que abriram caminho para republicanos como Trump. O tempo de Assata na prisão também incluiu tortura, abuso e confinamento solitário.

Em 1979, a administração de Jimmy Carter criou uma recompensa contra Assata. Bill Clinton a elevou para 1 milhão de dólares. E em 2013, foi o governo de Barack Obama que dobrou o valor: o FBI declarou Assata a primeira mulher incluída na lista de Terroristas Mais Procurados, oferecendo 2 milhões de dólares por sua “captura” — na prática, mais um convite ao “capturar e matar”. Mas ela resistiu — e venceu!

Assata tem sido, e continua sendo, uma inspiração em nossa luta contra o genocídio — de Los Angeles a Chicago, de Gaza à Palestina. Em sua autobiografia, publicada em 1988, ela nos ensina a necessidade da autodefesa e da autodeterminação. Escreve sobre o que é essencial para construir uma classe trabalhadora unida, inspirando especialmente povos oprimidos e racializados com seu estudo e apreço por Ho Chi Minh, Kim Il Sung, Che Guevara, Fidel Castro e Huey Newton, aprofundando sua compreensão do marxismo-leninismo.

Em 1996, em Cuba, Assata Shakur afirmou:

“A libertação dos povos oprimidos nos Estados Unidos não tem a ver com subir uma escada rumo ao sucesso, nem em tentar ser como Rockefeller, DuPont ou Ford — porque isso apenas perpetuaria a opressão e a exploração dos povos oprimidos nos Estados Unidos, e em particular dos afro-americanos nascidos e criados neste país.

O socialismo é parte integrante da construção da justiça social neste planeta. A condição do meu povo, a minha história, estava profundamente ligada à de outros povos oprimidos. E comecei a perceber que o mesmo pé que estava no pescoço do povo vietnamita estava no pescoço de todos os oprimidos. […] E então compreendi que o imperialismo precisa acabar. É um veneno que mata povos no mundo inteiro. As prioridades deste planeta precisam ser completamente transformadas. […] Esse é o meu compromisso político fundamental neste momento.”

E Assata, que sabia da influência de Cuba sobre o Papa, encerrou sua carta dizendo:

“Neste dia, aniversário de Martin Luther King Jr., lembro-me de todos que deram suas vidas pela liberdade. A maioria das pessoas deste planeta ainda não é livre. Peço apenas que continuem a trabalhar e a orar pelo fim da opressão e da repressão política.

Acredito sinceramente que todas as pessoas desta Terra merecem justiça: social, política e econômica. Creio que essa é a única forma de alcançarmos a paz e a prosperidade no mundo. Espero que desfrute de sua visita a Cuba. Este não é um país rico em bens materiais, mas é um país rico em bens humanos, espirituais e morais.”

Struggle-La Lucha

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