Ao discursar em frente ao aeroporto Afonso Pena, em Curitiba, na última quarta-feira (28), onde desembarcava para participar em evento em Ponta Grossa, o presidenciável Jair Bolsonaro proclamou: “Lula transformou o Brasil em galinheiro, agora colhe os ovos.”
O que salta aos olhos neste caso não é o gosto de Bolsonaro pela pirotecnia, como lhe é comum, mas o fato de, nesta conjuntura, ter sido até moderado. No dia anterior o também pré-candidato e governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, respondia a uma pergunta sobre os disparos contra ônibus da caravana de Lula pelo Sul com a seguinte frase: “O PT colheu o que plantou” (imaginem só quantos sobrinhos do Sr. governador não teriam seus corpos cravejados pela PM se o princípio se aplicasse a ele!). Depois de algum coordenador de sua campanha ter lhe aconselhado, saiu dizendo que “toda violência deve ser condenada.”
Augusto Nunes, o “moderador respeitável” da TV Cultura, revela um caráter muito mais incendiário em sua coluna da Veja: “Depois de descobrir que chuva de ovo não transforma ninguém em mártir político, o PT resolveu providenciar um formidável berreiro em torno dos tiros disparados contra dois ônibus da procissão dos pecadores sem remorso que vem zanzando pelo sul do Brasil.”
No editorial “Na Idade da Pedra”, a Folha de São Paulo até ensaia uma condenação do atentado contra a caravana, em um ou dois parágrafos em que considera o ato como o “ponto culminante de uma escalada de radicalismo.” Trata-se somente de uma excusa preparatória para os próximos parágrafos, como às dos homens que na mesa do jantar preparam disparates com “me desculpe o palavreado, mas…” Nos trechos seguintes de seu editorial a Folha de São Paulo diz que considera “normal, em qualquer democracia, que setores residuais do eleitorado se alinhem a polos do espectro ideológico”, para depois atribuir às fake news o crescimento da radicalização, por fim identificando o PT aos “frequentes e deploráveis atos de vandalismo promovidos pelo MST e seus congêneres”, chegando a tratar do “surto de violência anarcoesquerdista dos ‘black blocks’ nos grandes centros.” Quer dizer, para a Folha a “idade da pedra” é a colheita – amarga, é claro, porque nós editorialistas somos todos muito preocupados com a democracia – do PT. No fim, dizem também que o PT “colheu o que plantou.”
Já que tratamos das colheitas, quão fértil é a imaginação daqueles que esperavam que sobre os balaços que atingiram a caravana os reacionários fossem retroceder! Por outro lado quanta fibra e vitalidade faltam aos que sugeriam que a caravana fosse interrompida, em seu penúltimo dia, pelos perigos que se apresentavam.
Desde 2015, quando as movimentações reacionárias tomavam forma de uma maneira mais consistente, são amplos os setores de esquerda que insistem em analisar e formular estratégias de forma completamente atrasada. Quando realmente se impressionam com o avanço do inimigo, se escandalizam, como fogueteiros. Como disse o ex-guerrilheiro Avelino Capitani sobre o golpe de 1964: “Ninguém estava preparado para lutar porque ninguém pensava seriamente em lutar.”
Há de fato uma relação entre o que se lavra e o que retira. Mas, nesse caso, não se trata de “colher o que plantou.” É precisamente o contrário: Plantou fraqueza, colheu força. Ou como Maquiavel dizia, semearam delicadezas, colheram armas. Por uma colheita mais doce no futuro, é hora de semear amargura.